domingo, 29 de abril de 2012

História. Política Exterior. O drama de Inês de Castro. «João das Regras, nos seus famosos discursos das Cortes de Coimbra, revelou que Afonso IV, três anos antes da morte de Inês, portanto, em 1351, escreveu ao arcebispo de Braga, que se encontrava então na corte do papa, para que convencesse o sumo pontífice a não conceder as dispensas necessárias para o casamento de Pedro com D. Inês»


Cortesia de costapinheiro

Política exterior. O drama de Inês de Castro
«Dois episódios guerreiros marcam o reinado de Afonso IV. A eles se deve o cognome de “o Bravo” que o monarca mereceu da posteridade.
O primeiro é o da guerra com Castela (1336-1338). As causas ligam-se à política de casamentos, forma então muito usada entre as monarquias peninsulares de fazer alianças e blocos políticos. Uma filha de Afonso IV estava casada com o rei de Castela e foi por ele abandonada e tratada vexatoriamente. Por outro lado, o rei de Portugal ajustou o casamento do príncipe herdeiro Pedro, com a filha de um grande de Espanha, que era um dos chefes dos nobres feudais que se opunham ao rei. Este não permitiu que a filha do inimigo viesse para Portugal. Tudo isto se insere no quadro mais vasto das lutas pelo equilíbrio político peninsular, que preenche o século XIV. A guerra, além das costumadas devastações de fronteira e de uma incursão castelhana que foi até junto do Porto e ali foi contida pelas tropas portuguesas, incluiu grandes operações navais, que terminaram com a destruição da frota portuguesa junto do cabo de S. Vicente, no Algarve. Já na guerra do rei Dinis contra Castela, e mais tarde nas de Fernando, houve combates navais de certa envergadura e a devastação dos portos espanhóis pelos navios portugueses, o que talvez reflicta concorrências comerciais. A paz veio a ser negociada por intervenção do papa e não trouxe vantagens significativas a nenhuma das partes.
Em 1340, um exército do rei de Marrocos passou à Península e, junto com as forças do rei de Granada, iniciou uma invasão por terras cristãs. O rei de Castela pediu o auxílio do de Portugal e os dois exércitos travaram com o invasor uma batalha nas margens do rio Salado e obtiveram uma grande vitória. Foi esta a última ameaça grave de reconquista sarracena. A batalha foi descrita por um escritor português desconhecido, que parece ter estado presente nela; esse texto é considerado um dos pontos mais altos atingido pela prosa medieval portuguesa.
É no reinado de Afonso IV que se situa o episódio da morte de Inês de Castro. O facto, apesar da sua secundária importância política, teve uma repercussão emocional tão duradoura e tão profunda que justifica a referência especial, mesmo numa exposição elementar, como a que este livro constitui.
Inês de Castro fazia parte de uma família muito poderosa de fidalgos galegos e descendis, por via bastarda, do rei Sancho IV de Cartela. Havia também uma qualquer ligação com a família Albuquerque. Afonso Sanches, o bastardo do rei Dinis que Afonso IV odiou de morte e por causa do qual o País mergulhou numa guerra civil, casou com a dona do castelo de Albuquerque. A esta dona chamava-se Inês de Castro “mãe”, porque foi ela quem a criou.
Em 1350, estalou em Castela uma revolta dos grandes senhores contra o rei Pedro I. O chefe da revolta era precisamente João Afonso de Albuquerque, filho de Afonso Sanches e, portanto, uma espécie de irmão adoptivo de Inês de Castro. Este usou certamente a sua influência sobre Inês para envolver o infante Pedro, que com ela vivia maritalmente, nas guerras civis castelhanas.
João das Regras, nos seus famosos discursos das Cortes de Coimbra, revelou que Afonso IV, três anos antes da morte de Inês, portanto, em 1351, escreveu ao arcebispo de Braga, que se encontrava então na corte do papa, para que convencesse o sumo pontífice a não conceder as dispensas necessárias para o casamento de Pedro com D. Inês. Ora nessa carta há uma alusão directa às manobras de João Afonso de Albuquerque:
  • ‘...alguns que são parentes do infante em 2º grau do parentesco, ao de presente cometem não lícita coisa com ela’.
“Coisa não lícita” significa coisa proibida; “cometer com” quer dizer propor através de. 
E o parentesco em 2º grau era então considerado o existente entre João Afonso de Albuquerque e o infante Pedro, que eram filhos de irmãos.
Um outro indício da importância decisiva que Inês de Castro tinha em toda essa intriga política é o casamento do rei de Castela, em 1354, com a irmã dela, Joana de Castro. Talvez contasse, desse modo, desarmar uma eventual intervenção portuguesa, chamando os Castros para o seu partido. No mesmo dia do casamento, o rei repudiou a consone, por ter recebido a notícia de que Albuquerque organizara uma nova liga de nobres contra ele, da qual faziam parte dois irmãos bastardos do próprio rei, um deles era Henrique de Trastâmara, que mais tarde assumiu a chefia da rebelião e matou Pedro, “o Cru”, sucedendo-lhe no trono. O repúdio de Joana de Castro agravou a situação. Os irmãos dela utilizaram o território português para hostilizar Pedro, “o Cru”. Nesse mesmo ano de 1354, João Afonso de Albuquerque insistiu no plano de uma aliança portuguesa com os rebeldes:
  • mandou a Portugal um irmão de Inês de Castro propor ao infante Pedro que reclamasse para si a coroa da Castela, visto ser neto do rei Sancho IV (a mãe de Pedro, rainha D. Beatriz, era filha de Sancho IV). Pedro estava disposto a aceitar e só a terminante proibição de Afonso IV evitou o nosso envolvimento na guerra civil castelhana.
Foi para o impedir que Afonso IV decidiu a morte de D. Inês de Castro, que foi degolada em 7 de Janeiro de 1355, nos paços de Sana Clara, em Coimbra, numa ocasião em que o infante estava ausente. Este não acatou a justiça mandada fazer pelo rei e declarou-se em revolta». In José Hermano Saraiva, História Concisa de Portugal, Publicações Europa América, 1995.

continua
Cortesia de Europa América/JDACT