quarta-feira, 6 de setembro de 2023

Carlota Joaquina. O Pecado Espanhol. Marsilio Cassotti. «… a infanta parecia comportar-se dessa maneira propositadamente e com o objectivo de chamar a atenção, uma vez que quando havia gente diante dela estava sempre mais inquieta do que quando estava só»

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Os caprichos de uma Infanta (1785-1790)

«(…) Se ao tédio que possivelmente provocava a Carlota uma manifestação artística que não entendia nem gostava se adicionar o facto de, desde a chegada a Queluz, ter sido obrigada a assistir a longas cerimónias protocolares, das quais seguramente lhe escaparia o sentido, uma vez que ainda não dominava o idioma, é compreensível que se mostrasse irritável, ao ponto de um dia, enquanto estava a comer com o infante João, ter atirado à camareira que o servia um pedaço de comida com tão desajeitada pontaria que uma parte foi parar à cara do marido. Contudo, ao ouvir a queixa do infante, Carlota desculpou-se dizendo-lhe que não queria acertar nele mas na outra que estava ali.

João observaria mais tarde que a infanta parecia comportar-se dessa maneira propositadamente e com o objectivo de chamar a atenção, uma vez que quando havia gente diante dela estava sempre mais inquieta do que quando estava só.

Uma vez a condessa de Lumiares disse-lhe que os sapatos que estava a usar estavam velhos e que deveria calçar uns mais novos, e a infanta acabou por lhe responder com muito maus modos. Sintomaticamente, pouco depois a sua mãe queixar-se-ia à dama irlandesa da falta de asseio dos aposentos e dos vestidos da sua filha.

Mas o pessoal de serviço não seria o único a sofrer com os caprichos da infanta. Quando adquiriu confiança com a própria família real, Carlota parece ter antipatizado com a infanta Maria Ana, a irmã solteira da rainha, a quem a partir de um certo momento começou â responder mal. cansada de ouvir palavras antipáticas da pequena espanhola, a velha tia acabou por se queixar à rainha. Para a castigar, Dona Maria acabou por proibi-la de montar o burro, que era o que ela mais gostava.

Embora tenha sido advertida de que na última semana de Setembro (de 1785) teria de revalidar diante da corte portuguesa os exames que tinha realizado em Espanha, Carlota acompanhou a família real durante as três primeiras semanas desse mês em vários passeios. No dia 4 esteve em Sintra, almoçando na quinta do conde de Cantanhede; na quinta-feira seguinte em Caxias, para ver a vindima, e no dia 18 no convento da Estrela, do qual regressou às nove da noite.

Na véspera dos exames, Michelini queixou-se numa carta à mãe de Carlota dizendo que esta estava muito atrasada nos estudos musicais, em particular na [sic] chave, e que acabaria por atribuir a culpa desse facto às excursões que obrigavam a menina a estar quase sempre fora. Segundo a criada italiana, o pior era que Carlota tinha de se levantar e sair muito cedo e que depois voltava sempre tão tarde que o padre Filipe não podia dar-lhe as aulas.

Contudo, a partir do dia 20 de Setembro, a Gazeta de Lisboa foi informando entusiasticamente os seus leitores ao longo de uma semana sobre o resultado das provas públicas às quais a infanta se submeteu na presença da rainha, da família real e dos fidalgos de serviço da corte». In Marsilio Cassotti, Carlota Joaquina, O Pecado Espanhol, tradução de João Boléo, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2009, ISBN 978-989-626-170-2.

Cortesia EdosLivros/JDACT

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