Os caprichos de uma Infanta (1785-1790)
«(…) Entretanto, a princesa do
Brasil começou a tomar banhos do Tejo, para ver se desse modo fortalecia a sua
saúde e conseguia dar um descendente ao seu marido. Já tinha feito 40 anos e
eram muitos os que pensavam que isso já não aconteceria.
Mas o tema da doença da princesa
foi rapidamente substituído por outro que preocupava quase todas as cortes europeias,
o chamado assunto do colar, uma vulgar intriga cortês que se tinha
transformado num autêntico caso político em França, quando Maria Antonieta aceitou
um valiosíssimo colar de diamantes de uns joelheiros sem escrúpulos.
Com o veemente desejo de provar a
sua inocência, indo contra o parecer dos ministros do seu marido, a rainha
exigiu que os responsáveis fossem julgados publicamente pelo Parlamento de
Paris, apenas para se deparar com uma desagradável surpresa, uma vez que a mais
prestigiosa das instituições judiciais do reino absolveu a pessoa que ela
considerava culpada. Depois de anos a ser criticada por ser frívola, a sua
reputação política ficou destruída.
No seio da família real
portuguesa, informada dos acontecimentos através do seu embaixador em
Versalhes, ninguém conseguiu prever quais podiam ser as graves consequências
deste processo, o qual constituía uma bofetada na monarquia absoluta na cara da
rainha.
Naquele momento, a morte de Pedro
fez com que os Bragança se recolhessem na intimidade, o que por sua vez
provocou uma intensificação da relação que dona Maria tinha com a sua pequena
nora. Carlota ia conquistando assim o coração da sua soberana, ao ponto de esta
querer sempre que ela a acompanhasse nas suas saídas. Será conveniente recordar
que das três filhas que tinha tido dona Maria, duas tinham morrido quando eram
pequenas, tendo uma delas a mesma idade que Carlota tinha naquele momento. E a
terceira tinha sido obrigada a ir para Espanha para se casar com o infante
Gabriel. De maneira que a infanta espanhola acabou por se transformar numa espécie
de substituta das duas meninas, numa idade em que podia perfeitamente ser sua
neta.
Foram,
por exemplo, juntas à Casa Pia, instituição fundada em 1780 a pedido da rainha,
e onde durante a sua primeira visita a infanta se mostrou muito interessada
pelos instrumentos matemáticos, segundo dízia a Gazeta de Lisboa.
Foram também juntas tomar banhos nas Caldas, coisa que normalmente a soberana
fazia a partir de princípios de Junho». In Marsilio Cassotti, Carlota Joaquina,
O Pecado Espanhol, tradução de João Boléo, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2009,
ISBN 978-989-626-170-2.
Cultura e Conhecimento, História, JDACT, Literatura, Marsilio Cassotti, Narrativa,