sexta-feira, 20 de maio de 2011

Damião de Góis e os Mercadores de Danzig: «A cidade de Danzig, grande centro exportador de produtos florestais e de trigo, desempenhava papel de relevo no quadro dessas relações e mantinha abundante correspondência, quer directamente com Lisboa, quer com a feitoria portuguesa de Antuérpia»

Cortesia de quetzal

Em 1529 partiu Damião de Góis para a Polónia, em missão oficial ordenada por D. João III. Qual era fosse, não o sabemos ao certo. Mas algumas hipóteses podemos aventurar. O conhecimento mais exacto da viagem de Damião de Góis ao nordeste da Europa é-nos dado pelos testemunhos do próprio cronista, principalmente na Crónica de D. Manuel e nas declarações feitas aos inquisidores.
A missão parece ter sido dupla:
  • uma, a Danzig;
  • a outra, à corte do rei da Polónia, Sigismundo I.
A primeira devia estar intimamente relacionada com as ligações comerciais entre portugueses e hanseáticos. Em 1528, estes últimos tinham obtido, de D. João III, a confirmação geral dos seus privilégios em Lisboa, podendo livremente importar madeira de construção naval e muitas outras mercadorias. A cidade de Danzig, grande centro exportador de produtos florestais e de trigo, desempenhava papel de relevo no quadro dessas relações e mantinha abundante correspondência, quer directamente com Lisboa, quer com a feitoria portuguesa de Antuérpia. Por outro lado, era através de Danzig que se fazia a expedição das especiarias e outros géneros para os mercados da Polónia, da Hungria e da Rússia.

Cortesia de quetzal 
Sabemos gue, por volta de 1528, o tráfico destas mercadorias deparava com dificuldades, devido ao estado de guerra em que então se achava envolvida a Polónia. Ora, as garantias concedidas pelo rei de Portugal aos Hanseáticos exigiam, como contra-partida, uma facilitação no tráfico das especiarias. Talvez encarregado de pôr termo a um tal estado de coisas, ou então de negociar a compra de quantidades grandes de cereais ou de madeira para construção naval, Damião de Góis deslocou-se ao empório oriental da Hansa e entrou em contacto com a alta burguesia da cidade.
Depois de ter ido a Vilna, regressou a Danzig, «a tomar conclusam nas cousas que naquellas partes ainda tinha que fazer».
Mais fracas são as conjecturas que podemos apresentar sobre a segunda missão de Damião de Góis, que o levou junto da corte do rei Sigismundo I, então em Vilna. Talvez pretendesse negociar uma aliança entre as coroas portuguesas e polaca. Na verdade, e nomeadamente aquando da sua estada em Cracóvia, capital do reino, foi ventilado o casamento do infante D. Luis; irmão de D. João III, com a princesa Edviges, filha única do soberano da Polónia, assunto que Damião de Góis referiu ao rei, em cartas que lhe escreveu de Antuérpia, depois do seu regresso.

Cortesia de quetzal 
Vejamos, qual o caminho percorrido nesta primeira viagem às partes orientais. Damião de Góis seguiu de barco de Antuérpía para Danzig, provavelmente a bordo de um dos numerosos navios mercantes que anualmente faziam esse percurso.
O caminho para Vilna, que ele nos dá a entender ter sido terrestre, fê-lo, por certo, seguindo a estrada comercial que ligava Danzig a Kônigsberg, via Elbing, Braunsberg e Ragnit e, depois, ao longo do curso do Niemen, até Vilna. Regressou, sem dúvida, pela mesma rota, atingindo de novo Danzig. Desta cidade desceu o Vístula até Thorn, seguindo depois directo para Cracóvia, via Lódz, ou fazendo desvio por Ponznan (Posen), onde sabemos ter estado. Terá Damião de Góis regressado a Antuérpia por via terrestre? Ou terá reembarcado em Danzig ou noutro qualquer porto da costa báltica? Não o sabemos. Mas, em fins de 1529, vemo-lo já nos Países Baixos, o que mostra a rapidez com que foi feito todo o percurso». In Portugal Quinhentista, Ensaios, A. H. Oliveira Marques, Quetzal Editores, Referências, Lisboa, 1987.

Cortesiae Quetzal Editores/JDACT