sexta-feira, 21 de outubro de 2011

A Bela Poesia. António Nobre. Só: «Que linda menina que assoma na rua! Que linda, a andar! Em extase, o povo comenta «que é a Lua, que vem a andar...»

Cortesia de tertuliabibliofila 

Os Sinos
Os sinos tocam a noivado,
no ar lavado!
Os sinos tocam, no ar lavado,
a noivado!

Que linda menina que assoma na rua!
Que linda, a andar!
Em extase, o povo comenta «que é a Lua,
que vem a andar...»

Também, algum dia, o povo na rua,
quando eu casar,
ao ver minha noiva, dirá «que é a Lua
que vai casar...»

E o sino toca a baptizado
um outro fado!
E o sino toca um outro fado,
a baptizado!

E banham o anjinho na água de neve,
para lavar,
e banham o anjinho na água de neve,
para o sujar.

Ó boa madrinha, que enxugas de leve,
tem dó desses gritos! Compreende esses ais:
antes o enxugues a Velha! Antes Deus to leve!
Não sofre mais...

Os sinos dobram por anjinho,
lá no Minho!
Os sinos dobram, lá no Minho!
Por anjinho!

Que asseada que vai prá cova!
Olhai! Olhai!
Sapatinhos de sola nova,
olhai! Olhai!

Ó ricos sapatos de solinha nova,
bailai! Bailai!
Nas eiras que rodam debaixo da cova...
Bailai! Bailai!

(...)

Que pena me fazem os amortalhados,
vestidos de preto, deitados de costas...
E de olhos fechados! E de olhos fechados!
E de mãos postas!

E os sinos dobram a defuntos,
dlim! Dlão! Dlim! Dlom!
E os sinos dobram, todos juntos,
dlom! Dlim! Dlim! Dlom!
António Nobre, in «Só», o livro mais triste que há em Portugal!

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