«Os entes psíquicos chamados nação têm cada um, no mistério espiritual da sua constituição, um segredo de virtualidade que se furta à análise teórica do sociólogo como à síntese prática do político». In Fernando Pessoa.
«Portugal possui em abundância todos os mitos da Europa. O continente europeu está doente! Os acontecimentos graves que estão para vir talvez permitam à Europa adquirir consciência do seu destino europeu… A Europa vai inelutavelmente e de um modo brutal, tomar consciência dos seus mitos como de um ‘continente de salvação’». In Gilbert Durand.
«O que diferencia um tronco flutuante de uma barca feita da mesma madeira é que esta última tem remos e pode vogar contra a corrente». In Sri Ram.
Cegada nas ruínas do Carmo, Lima de Freitas, 1986
Cortesia de esquilo
A Nova Idade Média e o Declínio do Ocidente
«A nosso ver, a vida humana está plenamente integrada na Natureza, que tem o seu lado visível e a sua face oculta, sendo multi-dimensional. O microcosmo humano reflecte o macrocosmo da grande Natureza. E, nesta, da mesma forma que o mundo físico é regido por leis imutáveis, também a ‘Noosfera’, a «Terra Mental», segundo a definição de Telhard Chardin, deverá estar subordinada a leis naturais. A constatação da existência ‘per se’ de dimensões parafísicas do planeta é fundamental para se percepcionar com razoabilidade as leis rítmicas que regem a história da humanidade.
Aqui deparamos com o mistério da dimensão Tempo:
- Seremos nós que percorremos o caminho do Tempo, ou somos percorridos pelo próprio Tempo que, tal como Kronos da religião grega, come os seus próprios filhos?
Um velho enigma para os filósofos.
Não dizemos nós que o Tempo está acelerado?
É claro que aqui evocamos uma das questões fundamentais com que se debatem os filósofos e cientistas da actualidade:
- a mente é uma emanação da matéria (teoria darwinista, positivista, nominalista), ou existe per se e independentemente da matéria física(concepção platónica)?
Nós consideramos que o mundo mental existe ‘per se’ e que as forma mentais, das mais simples às mais complexas, têm vida própria (e um tempo de vida, como tudo o que é manifestado) incluindo, nestas últimas, as ideologias. As formas mentais são parte integrante da Natureza e adquirem vida, ou morrem para a história, enquadradas no ritmo cósmico que rege todo o Universo.
Máscaro de Ousilhão, 2001
Cortesia de esquilo
Por exemplo, de sete em sete anos acontece um rejuvenescimento de parte das células do nosso corpo. Nós não o pensamos, este processo é para nós inconsciente, mas alguém ou algo teve de o pensar e de lhe dar vida.
Sempre fomos educados no mais puro nominalismo, ou seja, no conceito de que as ‘ideias’ mais não são do que uma extrapolação da vida sensível. O mundo físico, palco da história, é o ‘real’. Assim, regressar ao coração do pensamento platónico, à visão do mundo da mentalidade arcaica, exige um esforço de distanciamento, uma ascese ‘filo-sophica’ que debatendo-se inicialmente com escolhos e adversidades de monta, logo vai despertando no filósofo uma visão cada vez mais bela e esplêndida dos mecanismos que regem a Natureza. A ‘Alegoria da Caverna’ torna-se legível através de um estado de consciência que percepciona a harmonia oculta que rege todo o cosmos.
Da mesma forma que o dia sucede à noite, e a noite sucede ao dia, a expiração sucede à inspiração, e a inspiração sucede à expiração, também os dias civilizatórios se sucedem às noites civilizatórias na história da humanidade. Estas últimas são as idades médias, ou seja, períodos intermédios entre duas civilizações. Estas noites civilizatórias são absolutamente necessárias ao fluir da vida humana, como o é a inspiração de oxigénio.
Uma civilização é consequência de uma cultura que incorporou a sua forma mental específica, o seu arquétipo. Quando este perde a força, ou seja, quando chegou ao fim do seu tempo vital (quando chegou a hora de se retirar da dimensão tempo), essa civilização vai agonizando até se tornar um cadáver. Entra-se numa nova idade média, numa noite civilizatória. E, se no dia civilizatório já estava presente, no alvorecer, o ponto de trevas que se foi alargando ao longo do tempo, agora, nas trevas da noite, logo desde o seu início, um ponto de luz se vai criando, ou seja, começam-se a colocar na terra as sementes de uma nova cultura que, pelo ritmo natural do cosmos, darão os seus frutos numa nova Primavera civilizacional.
‘O Encoberto’, Lima de Freitas, 1987
Cortesia de esquilo
A história da humanidade é essencialmente uma sucessão de arquétipos e mitos que se vão manifestando ao longo do tempo, com vista ao aperfeiçoamento espiritual do homem, à grande finalidade meta-histórica.
Esta dinâmica criada pela sequência da manifestação dos arquétipos históricos, com os necessários períodos intermédios (idades médias) entre duas civilizações, faz com que este percurso seja efectuado por ciclos e não de forma linear, ou seja, está perfeitamente enquadrado na espiral do tempo.
Se perguntassem a um romano da era de Augusto como seria o mundo ao fim de mil anos, ele diria que o poder e a glória do Império Romano ainda seriam maiores nessa época. E se perguntassem a um homem do tempo das catedrais como seria o mundo no ano 2000, ele projectaria o seu tempo histórico e diria que seria um mundo ainda com maiores catedrais. Por isso, se hoje projectarmos, de forma linear, o nosso tempo histórico, também nos equivocaremos. Segundo a visão hermética e platónica, os grandes acontecimentos históricos reflectem uma actividade pré-existente no mundo mental; dito de outra forma, a ‘ideia’' precede o ‘acto’, como a cultura deve preceder a política. Por essa razão, o estudo da história só pode ser competentemente realizado por um intelecto intuitivo que consiga ‘penetrar’ no ‘mundo das ideias’.
Assim se entende que, já em 1933, Nicolás Berdiaeff tenha escrito um livro intitulado “Uma Nova Idade Média - Reflexões sobre os destinos da Rússia e da Europa”, relacionando a nova Idade Média com “a queda do princípio legítimo do poder e do princípio jurídico das monarquias e das democracias e a sua substituição pelo princípio da força, da energia vital, das uniões e dos grupos sociais espontâneos”». In Paulo Loução, A Alma Secreta de Portugal, Ésquilo Edições & Multimédia, 2004, ISBN 972-8605-15-3.
Cortesia de Ésquilo/JDACT