sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Isabel d’Aragão e Rainha Santa. Anonymous. «De Espanha até Coimbra foi a excelsa Rainha delirantemente aclamada por todo o povo que acorria á sua passagem»

Cortesia de wikipedia

De acordo com o original.

«Muito se tem escrito ácerca da vida da excelsa e virtuosissima D. Isabel d'Aragão, Esposa d'el-rei D. Dinís; mas impunha-se ha muito a publicação dum folheto, como este, que sendo conciso na sua descrição não deixasse de relatar os factos que mais  distinguiram Aquela que a cidade de Coimbra escolheu para sua Augusta Padroeira e Protectora. O que o autor deste folheto teve em vista foi facultar aos fieis, com grande economia de preço, um livrinho de leitura facil e corrente, ao alcance de todos, onde a historia sagrada da Rainha Santa possa deixar bem arreigada no espirito dos crentes a obra sublime, verdadeiramente maravilhosa, que lhe concedeu logar na côrte celestial. As notas que colhemos foram, principalmente, extraídas do monumental trabalho de investigação historica do Ex.o Sr. Dr. Antonio Garcia Ribeiro Vasconcelos, na sua tão apreciada obra D. Isabel d' Aragão. A fama de santidade da Rainha Santa Isabel estende-se por todo Portugal e por muitas terras de Hespanha. Em Coimbra, porém, é tão grande que em parte alguma do nosso país se realizam festas tão pomposas em honra dum santo, como nesta cidade, onde concorrem para mais de 50:000 pessoas por essa ocasião. É nos momentos de luta pela adversidade da vida que os conimbricenses, principalmente, recorrem á protecção da Rainha Santa na sua fervorosa suplica, e se nem sempre logram alcançar a satisfação das suas preces, é já poderoso linitivo para a sua dôr a lembrança de que Ela nunca desamparou os infelizes com a sua divina graça. Isabel d'Aragão tendo sido um grande exemplo de virtudes, deu tambem uma prova bem frisante do seu amor a Coimbra, determinando em seu testamento que o seu corpo sagrado repousasse no mosteiro de Santa Clara desta cidade, onde Ela esteve clausurada e donde foi trasladado o seu corpo para o novo mosteiro do mesmo nome. É, pois, pouco quanto façam os conimbricenses em honra da memoria sagrada da Sua excelsa Padroeira.

Nascimento da Rainha Santa. Da côrte de Aragão ao Trono de Portugal
A Rainha Santa Isabel, que Coimbra se ufana de ter como desvelada Protectora e valiosa Padroeira, nasceu na cidade de Saragoça (Espanha), no ano de 1271. Filha do Principe real D. Pedro de Aragão e de sua esposa D. Constança, o seu nascimento foi desde logo iluminado pela graça divina, pois que seu avô, El-rei D. Jaime, que até aí vivia em grande discordia com D. Pedro de Aragão, imediatamente se congraçou com este, passando ambos a viver na mais doce harmonia. Assim demonstrou Deus aos homens que esta menina estava reservada a ser na terra a medianeira da paz, o Anjo predestinado a estabelecer a harmonia e a concordia entre os desavindos, facto que mais tarde, quando Rainha de Portugal, se verificou nas diversas desavenças entre seu esposo El-rei D. Dinís e seu filho D. Afonso IV.
A Rainha Santa Isabel foi, como já dissemos, aureolada desde o seu nascimento pela graça do Senhor. As suas preciosas virtudes bem cedo se revelaram, crescendo nela com a idade a fama que tanto a impôs á consideração de todas as côrtes da Europa, facto que despertou em bastantes principes o desejo de possuirem como esposa tão excelsa senhora. Foi á côrte de Portugal, felizmente, que coube a suprema ventura de ser a preferida entre todas as outras, merecendo El-rei D. Dinís a gloria de ter como consorte um tesouro de tantas virtudes e de tão preciosos encantos.
O casamento de D. Dinís com D. Isabel celebrou-se por procuração na antiga cidade de Barcelona, tendo lugar este acto no dia 11 de Fevereiro de 1282 e contando a futura Rainha de Portugal apenas 11 anos de idade. Êste auspicioso enlace constituiu um motivo de grande regosijo para todos os portugueses, antevendo estes os enormes beneficios deste casamento, o qual foi muito festejado e aclamado em todo o país com demonstrações de grande alegria e verdadeira satisfação. A saída de D. Isabel para Portugal causou a seus pais grandes tristesas, custando-lhes imenso essa separação pelas profundas saudades que D. Isabel deixava em todos os corações que muito a estremeciam.
De Espanha até Coimbra foi a excelsa Rainha delirantemente aclamada por todo o povo que acorria á sua passagem, salientando-se mais essas carinhosas manifestações na antiga vila de Trancoso, onde, no dia 24 de Junho de 1282, no templo de S. Bartolomeu, se celebraram com toda a pompa as bençãos nupciais. Em Coimbra, onde a esse tempo residia a côrte juntamente com a principal nobresa do reino, as manifestações de contentamento e alegria pela chegada dos régios nubentes, atingiram o mais delirante entusiasmo, conquistando logo a Rainha D. Isabel a simpatia e o amor dum povo que, mais tarde, havia de herdar o seu mais precioso tesouro, o sagrado corpo que todos hoje veneramos, e que esta cidade conserva com a mais desvelada e respeitosa devoção. As manifestações de regosijo com que a cidade recebeu os régios consortes foram, pois, verdadeiramente grandiosas, vestindo a cidade as suas melhores galas para bem lhes significar o contentamento de que se achava possuida por motivo daquele enlace, cujos efeitos tanto se evidenciaram na vida da nação portuguesa, e de que Coimbra comparticipou em larga escala pelos benéficos actos de caridade que a Santa Rainha espalhou por toda a parte.
Foi nesta cidade, principalmente, que D. Isabel de Aragão manifestou mais claramente a pureza da sua alma. Os actos de caridade que praticou, os socorros por ela prestados á indigencia, aos órfãos, ás viúvas e ás donzelas abandonadas, foram os primeiros lavores que lhe teceram a sua coroa de gloria; a fundação de asilos, de albergues e de hospitais, que a sua magnificencia sustentou e onde se recolhia uma legião de infelizes, originou, sem duvida, a fama de santidade que bem cedo a distinguiu e que, mais tarde, a 25 de Maio de 1625, dia da Santíssima Trindade, a Igreja confirmou, englobando-a no numero dos eleitos do Senhor». In Anonymous, Isabel d’Aragão e Rainha Santa, 2011, ISO 8859-1, Project Gutenberg Ebook, produzido por Pedro Saborano, Coimbra, Gráfica Conimbricense, Lda, 1921.


Cortesia de PGutenberg/Gráfica Conimbricense/JDACT