Sancho II de Portugal. Um Conspecto Historiográfico
Com a devida vénia ao Doutor José Varandas
Fr. António Brandão (1632). Quarta parte da Monarchia Lusitana que conthem a Historia do reyno de Portugal, desde o tempo delRey D. Sancho I, até o reynado delRey D. Affonso III. Lisboa, ed. por Pedro Crasbeek, 1632
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Torna-se
numa questão fundamental e incontornável na abordagem ao estudo deste reinado
pela historiografia portuguesa posterior a este autor. Quer seguindo-lhe linearmente
as interpretações, quer intervindo criticamente sobre as suas afirmações menos
consistentes, ninguém mais se eximiu, ao falar deste reinado, a colocar a
questão da menoridade de dom Sancho. A maioria dos autores que precederam
Alexandre Herculano mostram-se incertos quanto à idade com que Sancho II herda
a coroa, embora na generalidade atribuam ao novo monarca a idade de vinte e
três anos. Herculano reconsidera a data precisa do nascimento do príncipe,
afirmando que nunca poderia ter antecedido os meses finais do ano de 1209 e que
certamente as datas dos documentos teriam sido mal lidas, pois considera
erradas as leituras de fr. António Brandão, em especial a contida no instrumento
de doacção de dona Estevaínha Soares ao mosteiro de Tarouca, onde teria sido lida
a data de 1241, em vez da era de 1251 (1213), lida por Viterbo.
Alexandre Herculano considera
verosímil este casamento para o final de 1208 ou princípio de 1209, indicando
que o nome da rainha dona Urraca passa a figurar ao lado do marido e do sogro,
pelo menos a partir de Fevereiro de 1209. Recorda, na sua nota XIV, uma
passagem de Flores, onde se refere que uma das causas directas que provocaram o
conflito entre Sancho I e o bispo do Porto, Martinho Rodrigues, teria sido a
maneira como o prelado portuense teria tratado os noivos ao entrarem naquela cidade.
A utilização crítica de diversos documentos permite precisar melhor a idade do rei.
Considera determinante o facto de na famosa composição com as tias se dizer que
o príncipe ainda não tinha atingido os catorze anos de idade; ou as expressões
papais contidas na bula Grandi non
immerito que se referem ao infante como tendo herdado a coroa
paterna na idade da puerícia.
Posteriormente, a publicação
sistemática da documentação de Sancho I vem balizar com precisão a data daquele
casamento, confirmando a opinião de Herculano. O primeiro documento onde dona Urraca
figura como mulher de Afonso II é de Fevereiro de 1209. Como o último
instrumento régio, sem aparecer referência à rainha é de Novembro de 1228, o
casamento terá ocorrido entre aquelas duas datas. A menoridade de Sancho serve
de pretexto a Alexandre Herculano para acrescentar uma nova dimensão às tensões
existentes entre os partidários do modelo centralizador e os seus opositores. A
clarividência de Afonso II ao prever o seu desaparecimento precoce, já que era
provável que tivesse consciência de que a morte se aproximava, também admitia
que todo o seu labor em prol do fortalecimento do poder régio poderia ser posto
em causa pela transmissão do poder para as mãos de uma criança.
Os testamentos do rei definem
claramente que o príncipe herdeiro, caso seja menor, deve ser aconselhado pelos
seus validos, homens de confiança e a regência confiada a dona Urraca. No
último testamento, posterior à morte da rainha, determina que essa regência passe
aos ricos-homens que exerciam os mais altos cargos do estado que passarão a
reger os destinos do reino em nome do príncipe. Diz Herculano sobre a
menoridade do rei que: os historiadores desprezaram ou controverteram um
facto bem simples e que, todavia, é como o elo e origem da cadeia de acontecimentos
que prepararam a queda do infeliz príncipe.
Os
defeitos de leitura sobre a data de nascimento do herdeiro do trono terão levado
a um fatal erro de interpretação sobre as capacidades do novo rei, pois era considerado
adulto e responsável pelos seus actos. Mas não o era. Para Herculano, Sancho
II, não era ainda adulto quando herda o trono, e esse facto será impossível de dissociar
da imagem de mau governante que a história lhe dará. À imagem de um rei
infantil, ainda impreparado para a governação liga-se o estado em que Portugal
se encontra. O rei morrera excomungado e os seus antigos privados assumiam-se
plenos de autoridade como regentes do reino, mantendo a pressão sobre sectores
do clero e da nobreza terra-tenente que durante todo o reinado anterior se tinham
oposto ao crescimento da autoridade régia. A maioria das questões estava por resolver.
O reino estava interdito, o rei por sepultar em campo santo, as justiças do
reino impedidas de funcionar». In José Varandas, Bonus Rex ou Rex Inutilis,
As Periferias e o Centro. Redes de poder no reinado de Sancho II (1223-1248),Ude
Lisboa, FdeLetras, DdeHistória, Tese de Doutoramento em História, História
Medieval, 2003, Wikipedia.
Cortesia de Ude Lisboa/ FdeLetras/ DdeHistória/JDACT
JDACT, José Varandas, História, Cultura e Conhecimento, Universidade,