segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

Lucrécia Borgia. Jean Plaidy. «Ela sabia que era bonita e que ninguém podia deixar de perceber isso, por causa dos seus cabelos amarelos e dos seus olhos claros, de um tom azul-acinzentado»

Cortesia de wikipedia e jdact

A Piazza Pizzo di Merlo

«(…) Afinal de contas, estavam casados, e as visitas de Roderigo eram muito infrequentes. Aquilo era de se esperar, é claro, muito embora tivesse sido estabelecida a regra de que Giorgio deveria apenas compartilhar dos aposentos públicos da casa dela. Será que Roderigo poderia culpá-la? Ela achava que não. Mas se houvesse uma dúvida de que o filho fosse dele, ele poderia sentir-se menos inclinado a fazer por ele o que planeava fazer pelos outros. Quando uma mulher segurava um filho nos braços, um filho nascido há poucas horas, como poderia evitar que por um curto momento aquele filho lhe parecesse mais precioso do que qualquer outra coisa sobre a Terra? César sempre estaria em primeiro lugar nas suas afeições; mas naquele momento em que ela jazia exausta na cama, o pequenino recém-chegado, o seu Goffredo, por ser o mais frágil de sua ninhada, tinha, decidiu ela, de ter as mesmas oportunidades que os irmãos. Ele parecia exactamente com os outros quando nasceram; na verdade, poderia ser a pequena Lucrécia que estava nos seus braços agora, um bebezinho de quatro horas de idade; e não havia dúvida de quem era o pai. Goffredo podia ser filho de Roderigo. Com um amante e um marido vivendo sob o seu tecto, até mesmo Vannozza não podia ter certeza. Mas deveria fazer tudo ao seu alcance para deixar o cardeal certo de que era ele o pai da criança. Ele agora estava se dirigindo para a cama em que ela se encontrava. As amas recuaram, em temerosa reverência, enquanto ele se aproximava.

Vannozza, minha cara! A voz dele parecia terna como sempre, mas ele raramente demonstrava raiva, e ela não conseguiu entender quais eram os sentimentos dele para com a criança. Desta vez foi um menino, meu senhor. Ele se parece muito com Lucrécia..., e acho que verei sua Eminência nesta criança todos os dias. Uma rechonchuda mão branca, brilhando de jóias, tocou a face da criança. Era um gesto carinhoso, paternal, e o ânimo de Vannozza voltou. Ela agarrou o filho e estendeu-o para o cardeal, que o tomou das suas mãos; ela viu a fisionomia dele abrandar-se numa expressão de orgulho e alegria. Não era de admirar, pensou ela então, que muita gente gostasse de Roderigo; seu amor pelas mulheres e pelas crianças fazia com que elas ficassem ansiosas por agradá-lo e servi-lo. Ele andou de um lado para o outro com a criança, e nos seus olhos havia um olhar distante, como se estivesse vendo o futuro. Claro que aquilo significava que ele fazia planos para o menino recém-nascido. Ele não desconfiava. Devia ter-se comparado com Giorgio e se perguntado como uma mulher poderia pensar no pequeno funcionário apostólico, quando devia compará-lo com o encantador e poderoso cardeal.

Roderigo colocou o menino de novo nos braços dela e ficou por uns instantes sorrindo benignamente para ela. Então, com ironia, disse: e Giorgio? Está contente? Houve um período na vida de Lucrécia do qual ela iria lembrar-se até ao dia da sua morte. Ela estava com apenas quatro anos de idade, mas a recordação era tão vívida que ficou marcada na sua mente. Em primeiro lugar, fora o começo da mudança. Antes daquela época, ela levara a vida da ala infantil, segura no amor de sua mãe, aguardando ansiosa as visitas do tio Roderigo, deliciando-se com a batalha dos irmãos pelo seu afecto. Tinha sido um pequeno mundo feliz aquele em que Lucrécia vivera. Todos os dias, ela tomava a sua posição na loggia e ficava observando o mundo cheio de cores passar, mas tudo o que acontecia fora da casa de sua mãe lhe parecia apenas quadros para o seu deleite ocioso; havia uma irrealidade com relação a tudo o que acontecia do outro lado da loggia, e Lucrécia estava segura no seu aconchegante mundo de amor e admiração.

Ela sabia que era bonita e que ninguém podia deixar de perceber isso, por causa dos seus cabelos amarelos e dos seus olhos claros, de um tom azul-acinzentado; as pestanas e as sobrancelhas eram escuras e tinham sido herdadas dos ancestrais espanhóis, segundo diziam; e aquela combinação, em parte por ser muito rara, era muito atraente. Ela possuía os traços cativantes de uma pessoa que era apenas uma parte italiana, e também uma parte espanhola. Os irmãos também tinham aquele charme». In Jean Plaidy, Lucrécia Borgia, Edição Record, 1996, ISBN 978-850-104-410-5.

 

Cortesia de ERecord/JDACT

 

JDACT, Jean Plaidy, Itália, Literatura,