sexta-feira, 17 de junho de 2022

Os Conquistadores de Lisboa. Domingos Amaral 3. «Órfã de pai e mãe, Zaida era uma desconhecida em Córdova, pois estivera prisioneira dos cristãos mais de duas décadas. O sangue real que lhe corria nas veias…»

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A Intriga de Compostela 1140-1142. Arcos de Valdevez, Março de 1141

«(…) Apesar deste alvoroço em Arcos de Valdevez, não chegara o momento certo de a intriga de Compostela tomar conta de Chamoa. A lealdade apaixonada de uma mulher só se quebra se ela se sentir traída, o que ainda não era o caso. Pouco depois, para evitar mencionar o que conversara com o imperador de Leão, Chamoa proclamou que devíamos saber por onde andavam a princesa Zaida e o almocreve Mem, pois Afonso VII iria atacar Córdova em breve e certamente que a vida dos seus queridos amigos poderia correr perigo. Mais uma vez, meus queridos filhos e netos, em Arcos de Valdevez, a minha cunhada adiou a desconfortável revelação da intriga de Compostela e nada me disse, preferindo desviar-nos a atenção para o Sul, para o mundo muçulmano, que andava, também ele, em violento turbilhão.

Silves, Junho de 1141

Naquela tarde de Junho, o almocreve Mem pediu para ser recebido pela princesa Zaida, que agora vivia no palácio de Silves e ia desposar Ibn Qasi, o sufi que reinava no Al-Gharb.

Amiga a casar, tempo de abalar.

Desde que a Primavera nascera e milhares de flores tinham transformado Silves num caleidoscópio maravilhoso de cores, tornara-se evidente para Mem que aquele príncipe sufi cuja barba era apenas uma fina linha junto ao queixo e que usava sempre sandálias para se sentir leve, estava possuído por uma fortíssima paixão por Zaida. Lisonjeada, a princesa entregara-se, sentindo que finalmente tinha a seu lado um amável e poderoso chefe.

Princesa sem dono, procura um trono.

Enquanto existira uma ínfima hipótese de convencer Afonso Henriques a casar-se com ela, Zaida tudo tentara para o seduzir, admitindo mesmo converter-se ao cristianismo. Mas, depois de rejeitada e mal se vira longe, forçara o coração a substituir o príncipe de Portugal por Ibn Qasi, o candidato alternativo disponível.

Mulher com talento, engrandece com o casamento.

Órfã de pai e mãe, Zaida era uma desconhecida em Córdova, pois estivera prisioneira dos cristãos mais de duas décadas. O sangue real que lhe corria nas veias, era neta do último califa cordovês, Hixam III, de nada servia no presente à bonita e voluptuosa princesa, se ela não tivesse a protecção de um marido, a riqueza de uma família nobre da Andaluzia onde se amparar. O generoso corpo, os longos cabelos negros, a fina inteligência e a sua imensa cultura nada obteriam sem o poder de alguém que os potenciasse.

Esposa de emir, poderá progredir.

Contudo e para Mem, a união amorosa entre Zaida e Ibn Qasi representava o fim de uma amizade que incluíra as brincadeiras tórridas na cama. O bonito e loiro almocreve sempre soubera que, no dia em que ela encontrasse um marido à altura das suas vastas ambições, ele teria de se afastar. Zaida era uma Benu Ummeya, uma das derradeiras descendentes da família dos antigos califas de Córdova, e aspirava ao regresso ao trono andaluz. E agora Ibn Qasi podia carregá-la até lá». In Domingos Amaral, Assim Nasceu Portugal, Os Conquistadores de Lisboa, A Intriga de Compostela, Oficina do Livro, Casa das Letras, 2017, ISBN 978-989-741-713-9.

 

Cortesia de CdasLetras/JDACT

 

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