terça-feira, 19 de abril de 2011

Daniel Innerarity: O Futuro e os seus Inimigos. «Vamos vivendo à custa do futuro, numa completa irresponsabilidade em relação a ele. A lógica do just in time e do curto prazo manifesta-se em fenómenos muito variados, por exemplo, no sensacionalismo que antepõe o espectacular e o catastrófico apoio ao desenvolvimento...»

jdact

«...procura contribuir para uma nova teoria do tempo social num dos seus aspectos mais relevantes, como se relaciona a sociedade com o seu futuro, como é ele previsto, decidido e configurado, extraindo dessa perspectiva uma série de lições que possam ajudar-nos a renovar o nosso modo de entender e executar a política. A crítica do uso que as sociedades fazem do tempo futuro é uma chave para a elaboração de uma teoria crítica da sociedade. Hoje qualquer teoria da sociedade tem de ser uma teoria do tempo e especialmente do uso que nós fazemos do futuro. De facto, a crise da política está intimamente ligada à crise do futuro, à sua crescente ilegibilidade. Se não errarmos ao criar processos que nos libertem da tirania do curto prazo e nos abram um horizonte mais ambicioso, o da longue durée, a transformação de que as sociedades democráticas necessitam será o resultado imediato dessa abertura para fazer do futuro o seu mais interessante espaço de acção.Era essa a tarefa que Max Weber atribuía à política:
  • gerir o futuro e responsabilizar-se por ele.
Para isso, são necessários modos de pensar que se abram ao longo prazo e que o façam racionalmente, para lá de simples projecções ou de cenários inverosímeis.

jdact 
Em última análise, o nosso actual desafìo não é senão o de estruturar novamente o tempo na era da globalização. A principal tarefa da política democrática consiste em estabelecer a mediação entre a herança do passado, as prioridades do presente e os desafios do futuro.
Não é por acaso que a crise da democracia ocorre num período em que se tornou mais discutível a sua capacidade para efectuar essa mediação. O tempo passa diante dos nossos olhos sem referências estruturantes, e nós ocupamo-lo com um cínico oportunismo ou com uma instalação depressiva, compensando a nossa ineficácía com a agitação superfìcial e substituindo a esperança pela inútil evocação do completamente outro.
As sociedades actuais têm de realizar um trabalho sobre o tempo em virtude do qual, se quiserem essegurar a sua sobrevivência e o seu bem-estar, são obrigadas a incluir cada vez mais futuro nos seus cálculos. Mas há poucos delineamentos desse futuro. O futuro tem maus advogados no presente e padece de fraqueza crónica. O problema das nossas democracias reside em o antagonismo político estar absorvido pelo presente.

Cortesia delacomunidadelpais
Vamos vivendo à custa do futuro, numa completa irresponsabilidade em relação a ele. A lógica do just in time e do curto prazo manifesta-se em fenómenos muito variados:
  • na hegemonia da lógica dos mercados financeiros, que se impõe acima de outras dimensões da economia;
  • na pressão exercida pelo tempo dos meios de comunicação, perante a qual o sistema político mostra uma preocupante vulnerabilidade;
  • no sensacionalismo que antepõe o espectacular e o catastrófico, por exemplo, ao apoio ao desenvolvimento;
  • na concepção instantaneísta da democrada, que se manifesta na influência exercida nas decisões políticas pelos prazos eleitorais...
A lógica do urgente desestrutura a nossa relação com o tempo, sempre subordinado ao momento presente». In Daniel Innerarity 2009, O Futuro e os seus Inimigos, Teorema, ISBN 978-972-695-960-1.

Cortesia de Teorema/JDACT