Cortesia de liboriocosta
«Por outro lado, em Lisboa, onde, para embarcar, os judeus tinham vindo de todo o reino, os Estaus da Ribeira apresentavam o aspecto de um acampamento antigo. Albergadas em barracas as famílias, 20 mil judeus esperavam as naus de embarque, contando hora a hora o prazo de redenção. Esse prazo correu, sem virem as naus; por isso foram todos convertidos à força, porque os teimosos ficavam cativos. Este baptismo forçado, causa de tantas desgraças posteriores, revela a política dúbia e falsa de um governo que não tinha a coragem purista do castelhano, depois de ter perdido o bom-senso e a humanidade dos tempos anteriores. Desumanos, os actos eram ao mesmo tempo cobardes, pois o cronista diz com franqueza que se procedia assim com os judeus por serem párias, sem rei nem terra, não se podendo já fazer outro tanto aos mouros, com medo das represálias dos soberanos maometanos.
Cortesia de teatrovivarte
De tal modo se originou a crise que teve na era de 1506 o seu primeiro episódio trágico. As fomes dos anos precedentes, a peste que lavrara no Outono anterior e vitimava, já na Primavera, mais de 100 pessoas por dia, enchiam de aflição o povo da capital, que buscava uma causa e tamanhas desgraças. D. Manuel tinha fugido da peste, para Évora. O castigo tremendo, que a cólera divina impunha sem piedade, não podia ter outro motivo senão a criminosa protecção concedida aos judeus. Baptizados, mas não convertidos, eram uma viva e impune blasfémia; e todos os seus actos religiosos outros tantos sacrilégios. Deus estava, decerto, ofendido; e por isso castigava sem dó. E o pobre do povo sofria tamanhas misérias por causa desses malditos que insultavam Deus dentro do seu templo sagrado, fingindo orar e comungando!
Eram só estas acusações vagas e místicas? Não eram. O baptismo forçado dos judeus tornara mais grave ainda o problema económico da sua existência.
Cortesia de carimbodaterra
Depois que tiveram nome cristão, diz Damião de Góis, puderam tratar em muitas coisas que pelo direito canónico expressamente lhes eram defesas, das quais uma era não arrendarem os bens das igrejas nem nenhumas novidades, do que se seguia não haver naquele tempo tantas vezes carestia de mantimentos como houve depois de eles começarem a tratar nisso, fazendo alevantar o preço das novidades da terra». In História de Portugal, Oliveira Martins, Europa-América edição nº 140823/5304, adquirido em Janeiro de 1993.
Cortesia de Europa-América/JDACT