(1265-1321)
Florença, Itália
Quadro de Sandro Botticelli
Cortesia de wikipedia
«Uma obra que deveria figurar na ‘estante’ de qualquer estudante. E não apenas por ser a famosa “Comédia” de Dante, a que os pósteros acrescentaram, por seus méritos, “A Divina”. A tradução, feita por José Pedro Xavier Pinheiro (1822-1882), Brasil, enobrece a língua portuguesa e, em particular, as letras pátrias.
Dedicando-lhe o ‘Paraíso’ escrevia Dante a Cangrande della Scala:
- “O sentido desta obra não é simples; ao contrário ela é «polisensa», pois outro é o sentido literal, outro aquele das coisas significadas”.
Declarava Dante com essas palavras que a “Divina Comédia” é um poema alegórico.
Não somente no poema há alegorias particulares, mas o poema, na sua inteireza, tem uma significação, ou melhor, várias significações alegóricas. Muitas foram as interpretações que da “Divina Comédia” se fizeram sob esse ponto de vista. Alguns comentadores puseram em maior evidência o seu sentido moral e teológico; outros consideram o poema dantesco como uma obra de inspiração política e ligada intimamente às vicissitudes pessoais do poeta. Não são, porém, as intenções alegóricas que consagram a imortalidade da “Comédia” dantesca, à qual os pósteros atribuíram a qualificação de divina. A “Divina Comédia” é, principalmente, uma formidável obra de fantasia e de representação poética, talvez um dos pontos limites que a inteligência humana pode alcançar. O poema dantesco é apresentado na tradução em tercetos rimados como no texto original, como inicialmente citado (José P. Xavier Pinheiro). Esta tradução constitui uma obra digna de admiração. Fiel, bastante clara, consegue reproduzir grande parte da força poética do maravilhoso poema italiano». In Fonte ‘orelha’ da edição digitalizada.
Dante, no Exílio
Anónimo.
Archivo Iconográfico S. A., Itália.
Cortesia de Corbis Image Collections
Inferno
Canto I
Dante, perdido numa selva escura, erra nela toda a noite. Saindo ao amanhecer, começa a subir por uma colina, quando lhe atravessam a passagem uma pantera, um leão e uma loba, que o repelem para a selva. Aparece-lhe então a imagem de Virgílio, que o reanima e se oferece a tirá-lo de lá, fazendo-o passar pelo Inferno e pelo Purgatório. Beatriz, depois, o guiará ao Paraíso. Dante o segue.
Da nossa vida, em meio da jornada,
Achei-me numa selva tenebrosa,
Tendo perdido a verdadeira estrada.
Dizer qual era a cousa tão penosa,
Desta brava espessura a asperidade,
Que a memória a relembra inda cuidosa.
Na morte há pouco mais de acerbidade;
Mas para o bem narrar lá deparado
De outras cousas que vi, direi verdade.
Contar não posso como tinha entrado;
Tanto o sono os sentidos me tornara,
Quando hei o bom caminho abandonado.
Depois que a uma colina me cercara,
Onde ia o vale escuro terminando,
Que pavor tão profundo me causara.
Beatriz
Cortesia de seguindopassoshistoria
Ao alto olhei, e já, de luz banhando,
Vi-lhe estar às espaldas o planeta,
Que, certo, em toda parte vai guiando.
Então o assombro um tanto se aquieta,
Que do peito no lago perdurava,
Naquela noite atribulada, inquieta.
E como quem o anélito esgotava
Sobre as ondas, já salvo, inda medroso
Olha o mar perigoso em que lutava.
O meu ânimo assim, que treme ansioso,
Volveu-se a remirar vencido o espaço
Que homem vivo jamais passou ditoso.
Tendo já repousado o corpo lasso,
Segui pela deserta falda avante;
Mais baixo sendo o pé firme no passo.
Eis da subida quase ao mesmo instante
Assoma ágil e rápida pantera
Tendo a pele por malhas cambiante.
Não se afastava de ante mim a fera;
E em modo tal meu caminhar tolhia,
Que atrás por vezes eu tornar quisera (19)»
Continua
In Dante Alighieri, A Divina Comédia, Atena Editora, 1955, Tradução de José Pedro Xavier Pinheiro (1812-1882), Digitalização de eBooks Brasil por Helder Rocha, 2003.
Cortesia de eBooks Brasil/JDACT