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A
rainha do povo
«(…) Numa questão de meses o
governo caía, Cabral era desterrado para Espanha e a rainha era obrigada a
nomear novo executivo, que confiou ao duque de Palmela. O novo chefe do governo
mandou desmantelar as juntas governativas de cariz popular e burguês, que haviam
sido formadas um pouco por todo o país. Mas Cabral, a partir do seu exílio,
planeava um golpe de Estado, em conluio com Sua Majestade, e não muito depois,
o poder régio dava posse ao marechal Saldanha, com promessas de abolir os tão
odiados novos impostos. Tendo provado já o doce sabor da liberdade e do
exercício do poder local, as classes mais baixas não aceitaram a dissolução das
suas juntas, e a revolta, que, para além de Maria da Fonte passou também a chamar-se Revolução do Minho, estendia-se já a toda a nação. Era a Guerra
da Patuleia que se iniciava, travada entre as forcas governamentais e as da
autoproclamada Junta do Supremo Governo Provisório do Reino, que fazia frente
ao poder régio. Às tropas do poder régio aliaram-se, em certas ocasiões, os homens
do Partido Legitimista, que, aproveitando a instabilidade que varria Portugal,
procuravam trazer de volta e devolver ao trono Miguel I, o rei deposto.
O conflito prolongou-se por oito
meses, com avanços e recuos de ambas as partes, sagrando-se a rainha vencedora,
por intervenção das tropas estrangeiras, cujo apoio solicitou. Pelo caminho
perderam-se muitas vidas, o povo conquistou alguns direitos, várias vilas
ascenderam a cidades, e os políticos alcançaram e perderam postos, numa dança
interminável. É neste contexto que se desenrola a história de Maria da Fonte,
símbolo do poder do povo, que hoje é cantada em hinos e canções e homenageada
em estátuas pelo país fora. Exaltada ou vilipendiada pelos autores (como por
Feliciano Castilho e pelo padre Casimiro Vieira, respectivamente), certo é que
todos convergem num ponto: Maria da Fonte foi uma mulher que deu voz à voz
do povo, incendiando-lhe os peitos contra os desmandos das autoridades
cabralistas. Ao seu grito se juntaram de imediato outras mulheres, alguns
padres descontentes com a laicização do Estado e com a extinção das ordens
religiosas, e, mais tarde, os homens, quando elas, enfim, regressaram aos seus
lares.
Contemporâneos, romancistas e
historiadores foram-lhe atribuindo várias identidades, quer baseando-se em
fontes fidedignas, quer por questões políticas ou por mero romantismo. Desde a
Maria da Fonte do Vido, de Camilo Casteio Branco, à taberneira Maria Luiza
Balaio, a Joaquina Carneiro, Josefa Caetana, Joana Maria Esteves, Maria Mota,
ou à doceira de Calvos, vários foram os rostos que se concederam à heroína do
povo. A par da Balaio, a que mais consenso gera é Maria Angelina. E é
esta a minha Maria da Fonte! Aquela que, a meu ver, e de acordo com o resultado
da minha pesquisa, em si encerra todas as outras. A minha protagonista é feita
de um entretecer de factos históricos e romanceados, ora reais, ora imaginados.
Assim, a Maria da Fonte que aqui retrato é uma jovem lavradeira, rebelde e
respondona, que foi servir para a casa de uma família burguesa minhota. Foi lá
que conheceu um jovem da Alta Burguesia, Túlio Vila Rosa, por quem se
apaixonou. Quando o patrão, amigo desse jovem, tomou conhecimento do facto, despediu-a
e Maria voltou para a sua vida no campo, na Póvoa de Lanhoso, sua terra natal.
Por esta altura, já as políticas
do Administrador do Concelho geravam grande descontentamento. E foi em resposta
a esta situação que, quatro anos mais tarde, a populaça se alevantou,
enraivecida, dando origem à insurreição. No calor dos confrontos, Maria
conheceu José Maria Si1va, um bandido amigo dos pobres, conhecido como O
Covêlo, e com ele se envolveu». In Maria João Fialho Gouveia, Maria da
Fonte, Topseller, 20/20 Editora, 2017, ISBN 978-989-886-955-5.
Cortesia de Topseller/20/20
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