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de wikipedia e jdact
«(…) A primeira dificuldade do
movimento árabe foi a de se saber onde os árabes se encontravam. Sendo povo
resultante de cruzamentos, seu nome havia mudado de sentido, lentamente, de ano
para ano. Em tempos remotos, designava um árabe. Existia um país chamado
Arábia; mas isto nada significava para o nosso caso. Conhecia-se uma língua
denominada árabe; e era nela que nos devíamos apoiar. Tratava-se do idioma
corrente da Síria, da Palestina, da Mesopotâmia e da grande península
denominada Arábia, nos mapas. Antes da conquista dos muçulmanos, estas regiões
foram habitadas por povos diferentes, falando idiomas da família árabe. Chamávamo-los
semíticos, mas incorretamente (dando-se o mesmo com termos mais científicos).
Contudo, os idiomas árabe, assírio, babilónio, fenício, hebraico, aramaico e siríaco
eram aparentados; os vestígios das influências recíprocas, no passado, e mesmo da
origem comum, reforçavam-se pelo nosso conhecimento, segundo o qual o aspecto e
os hábitos dos povos de língua árabe da actualidade, na Ásia, embora sendo
variados como campo de papoilas, ofereciam semelhanças permanentes e
essenciais. Podíamos, pois, com perfeita propriedade, denominá-los primos, e
primos certamente, embora tristemente, cônscios do seu próprio parentesco.
As regiões de língua árabe, na
Ásia, neste sentido, formavam um tosco paralelogramo. A linha norte corria de
Alexandria, no Mediterrâneo, através da Mesopotâmia, a caminho do oriente, até ao
Tigre. A linha sul era a margem do oceano Índico, desde Aden até Muscat. A oeste,
limitava-se pelo Mediterrâneo, pelo canal de Suez e pelo mar Vermelho, até
Aden. A leste, pelo Tigre e pelo golfo pérsico, até Muscat. Este quadrado de
terra, tão grande como a Índia, formava a pátria dos nossos semitas, onde
nenhuma raça estranha conseguiu manter-se por longo tempo, embora os egípcios,
os hititas, os filistinos, os persas, os gregos, os romanos, os turcos e os francos
o houvessem tentado, por maneiras várias. Todos, ao fim, se viram derrotados, e
os elementos dispersos foram absorvidos pelas fortes características da raça
semítica. Os semitas, por vezes, alastraram-se para fora dessa área, sendo
assimilados pelo mundo exterior. O Egipto, a Argélia, Marrocos, a ilha de
Malta, a Sicília, a Espanha, a Cilícia e a França absorveram e fizeram
desaparecer colónias semíticas. Somente em Trípoli, na África, e no perene
milagre da Judeia, os remotos semitas conservaram alguma coisa da sua
identidade e da sua força.
A origem destes povos foi motivo
para debates académicos; mas, para a compreensão da sua revolta, as actuais
diferenças sociais e políticas se revestiam de importância, e só podiam ser
assinaladas após o exame da sua geografia. O continente por eles habitado
continha certas grandes zonas, cujas profundas diversidades físicas impunham
costumes diversos aos seus nativos. A ocidente, o paralelogramo se emoldurava,
de Alexandria até Aden, numa cadeia de montanhas, chamada (ao norte) Síria, e,
progressivamente, em direcção ao sul, denominada Palestina, Média, Hedjaz, e, afinal,
Iémen. A cordilheira erguia-se à altura média de novecentos metros, com picos de
três a quatro mil metros. Voltava-se para oeste, era bem irrigada pelas chuvas
e pelas nuvens que vinham do mar, e, em geral, inteiramente povoada. Outro
renque de montanhas habitadas, de face para o oceano Índico, formava o lado sul
do paralelogramo. A fronteira oriental constituía-se, a princípio, de uma planície
aluvial, denominada Mesopotâmia, mas, ao sul de Basra, não passava de litoral ao
nível do mar, chamado Kuwait, e depois Hasa, até Gattar. A maior parte desta planície
era povoada. Tais planícies e montanhas habitadas emolduravam uma zona de deserto
sem água, em cujo coração se encontrava um arquipélago de oásis povoados e dotados
de água, chamados Kasim e Aridh. Neste grupo de oásis, ficava o verdadeiro centro
da Arábia, o repositório do seu espírito nativo, e a sua mais cônscia individualidade.
O deserto envolvia-o todo, mantendo-o livre de contactos.
O
deserto que desempenhou esta grande função em torno dos oásis, construindo, assim,
o carácter da Arábia, variava de natureza. Ao sul dos oásis, parecia ser um intransponível
mar de areia, estendendo-se até perto do populoso escarpamento da margem do
oceano Índico, separando-o, a leste, da história da Arábia, e evitando que exercesse
qualquer influência sobre a moral e a política árabe. Hadhramaut, como chamavam
a esta costa sul, fazia parte da história das Índias Holandesas; e o seu pensamento
se projectava para Java, mais do que na direcção da Arábia. A oeste dos oásis,
entre estes e as montanhas do Hedjaz, havia o deserto de Nejd, zona de cascalho
e de lava, contendo pouca areia. A leste, entre eles e Kuwait, estendia-se
outra zona semelhante, de cascalho, mas com algumas grandes faixas de areia
fofa, o que tornava difícil a travessia. Ao norte dos oásis, desdobrava-se uma
zona de areia, e, depois, uma imensa planície de cascalho e de lava, tomando
conta de tudo, entre a linha oriental da Síria e as margens do Eufrates, onde
começava a Mesopotâmia. A viabilidade deste deserto norte, para homens e para
automóveis, fez com que a revolta árabe obtivesse êxito imediato». In
T.E. Lawrence, Os Sete Pilares da Sabedoria, 1922, 1926, Publicações
Europa-América, 2004, ISBN 978-972-100-483-2.
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