Cortesia
de wikipedia e jdact
«(…) Na confusão, os três homens
passaram quase despercebidos e aqueles que os viram escapar estavam ocupados
demais em salvar as próprias vidas para tomar alguma providência. Em silêncio,
Jaime e seus companheiros embarcaram na traseira do furgão, que logo partiu
acelerado, dispersando os pedestres desesperados pelas ruas apinhadas. A Guarda
Civil, a polícia rural paramilitar, em uniforme verde e quepe preto de couro
envernizado, tentava em vão controlar a multidão histérica. A Polícia Armada,
guarnecendo as capitais das províncias, também eram impotentes diante da
confusão generalizada. As pessoas procuravam fugir em todas as direcções, na
tentativa desesperada de escapar dos touros enfurecidos. Os touros
representavam menos perigo do que as próprias pessoas, que se esmagavam na
ânsia da fuga. Jaime olhou consternado para o espectáculo atordoante de velhos
e mulheres sendo derrubados sob os pés da multidão. Não foi planeado para
acontecer assim! O furgão deveria estar à espera nas barricadas para controlar
os touros! Olhava desolado para a carnificina, mas não podia fazer coisa alguma
para detê-la. Fechou os olhos para não ver. O furgão chegou aos arredores de
Pamplona e seguiu para o sul, deixando para trás o clamor e a confusão da
multidão em pânico. Para onde estamos indo, Jaime?, perguntou Ricardo Mellado. Há
uma casa segura perto da Torre. Ficaremos lá até escurecer e depois seguiremos
em frente. Felix Carpio estremecia de dor. Jaime Miró observou-o, com uma expressão
compadecida.
Chegaremos num instante, amigo,
murmurou, gentilmente. Ele não conseguia tirar da cabeça a cena terrível de
Pamplona. Meia hora depois, eles se aproximaram da pequena aldeia de Torre e contornaram-na,
seguindo para uma casa isolada nas montanhas. Jaime ajudou os dois homens a
saltarem da traseira do furgão. Vocês serão apanhados à meia-noite, informou o
motorista. Avise-os para trazerem um médico, disse Jaime. E livre-se desse furgão.
Os três entraram na casa. Era uma casa de fazenda, simples e confortável, com
uma lareira na sala de estar e viga no tecto. Havia um bilhete na mesa. Jaime
Miró leu-o e sorriu para a frase de recepção: Mi casa es su casa. Encontrou garrafas de vinho no bar e
serviu bebida para os três. Não há palavras para lhe agradecer, amigo. A você,
brindou Ricardo Mellado. Jaime levantou o copo. À liberdade.
Um canário cantou de repente numa
gaiola. Jaime foi até lá e observou a sua agitação por um momento. Depois,
abriu a gaiola, tirou o passarinho gentilmente e levou-o para uma janela
aberta. Voe para longe, pajarito,
murmurou. Todas as criaturas vivas devem ser livres.
Madrid
O primeiro-ministro Leopoldo
Martínez estava possesso. Era um homem pequeno, de óculos, todo o corpo tremia
enquanto falava. Jaime Miró deve ser detido!, gritou, a voz alta estridente.
Estão-me entendendo? Olhou furioso para a meia dúzia de homens reunidos na
sala. Estamos à procura de um único terrorista, e todo o exército e a polícia
são incapazes de encontrá-lo. A reunião estava ocorrendo no Palácio Moncloa,
residência e local de trabalho do primeiro-ministro, a cinco quilómetros do
centro de Madrid, na Carretera da
Galicia, uma estrada sem placas de identificação. O prédio era de alvenaria,
verde, com sacada de ferro batido, janelas verdes e guaritas em cada canto. Era
um dia quente e seco, e através das janelas, até onde a vista podia alcançar,
colunas de ondas de calor elevavam-se como batalhões de soldados fantasmas.
Ontem Miró converteu Pamplona num
campo de batalha. Martínez bateu o punho na mesa. Assassinou dois guardas e
tirou dois dos seus assassinos da prisão. Muitos inocentes foram mortos pelos
touros que ele soltou nas ruas. Por um instante, ninguém disse nada. Ao assumir
o cargo, o primeiro-ministro declarou, presunçoso: o meu primeiro acto será
acabar com esse grupo separatista. Madrid é a grande unificadora. Transforma
andaluzes, bascos, catalães e galegos em espanhóis. Fora excessivamente optimista.
Os bascos, fervorosos na sua independência, tinham outras ideias, e a onda de
atentados a bomba, assaltos a bancos e manifestações de terroristas da
organização ETA (Euzkadi Ta Azkatasuna)
continuara sem cessar. O homem à direita de Martínez na reunião disse
calmamente: eu o encontrarei. Era o coronel Ramón Acoca, o chefe do GOE, Grupo de Operaciones Especiales,
criado para perseguir os terroristas bascos. Acoca era um gigante, de sessenta
e poucos anos, rosto marcado por cicatrizes, olhos frios e implacáveis. Fora um
jovem oficial sob o comando de Francisco Franco durante a Guerra Civil e ainda
era fanaticamente devotado à filosofia de Franco: somos responsáveis apenas
perante Deus e a história. Acoca era um oficial brilhante e fora um dos
assessores em que Franco mais confiara. O coronel sentia saudade da disciplina
de punho de ferro, a punição rápida (maldito) daqueles que questionavam ou
desobedeciam à lei». ». In Sidney Sheldon, As Areias do Tempo, 1989,
Publicações Europa-América, 2003,
ISBN 978-972-105-176-8.
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