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Paris
«(…) E quando esta massa está assim enegrecida é considerada
morta e privada da sua forma... Então manifesta-se a humidade na cor de azougue
negro e fedorento, que primeiro era seco, branco, agradavelmente perfumado,
ardente, depurado de enxofre pela primeira operação e que agora é purificado
por meio desta segunda operação. E deste modo é este corpo privado da sua alma,
que perdeu, e do seu resplendor e da maravilhosa lucidez que anteriormente
possuía e está agora negro e desfigurado... Esta massa assim negra ou enegrecida
é a chave, o começo e o sinal da descoberta perfeita da maneira de operar do segundo
regime da nossa pedra preciosa. Pelo que diz Hermes, ao verdes a negrura
acreditai que haveis ido por boa senda e seguido o bom caminho.
Batsdorff,
pressuposto autor de uma obra clássica que
outros atribuem a Gaston de Claves, ensina que a putrefação se declara quando a
negrura aparece e que é esse o sinal de um trabalho regular e conforme à
natureza. Acrescenta: os Filósofos
deram-lhe diversos nomes e chamaram-no Ocidente,
Trevas, Eclipse, Lepra, Cabeça de Corvo, Morte, Mortificação do Mercúrio...
Resulta pois que por essa putrefação se faz a separação do que é puro e do que é
impuro. Ora, os sinais de uma boa e verdadeira putrefação são uma negrura muito negra ou muito profunda,
um odor fétido, mau e infecto, chamado pelos Filósofos toxicum et venenum, ao qual o olfacto
não é sensível, mas apenas o
entendimento.
Voltemos
às figuras herméticas de Notre-Dame.
O segundo
baixo-relevo oferece-nos a efígie do Mercúrio filosófico: uma serpente enrolada
numa vara de ouro. Abraão, o Judeu, também conhecido pelo nome de Eleázar,
utilizou-o no livro que veio parar às mãos de Flamel, o que nada tem de
surpreendente, pois encontramos este símbolo durante todo o período medieval. A
serpente indica a natureza incisiva e dissolvente do Mercúrio que absorve avidamente
o enxofre metálico e retém-no tão fortemente que a sua coesão não pode posteriormente
ser vencida. É desse verme venenoso que tudo infecta com o seu veneno que fala
a Ancienne Guerre des Chevaliers.
Este réptil é o tipo do Mercúrio no
seu primeiro estado, e a vara
de ouro, o enxofre corporal que se lhe junta. A dissolução do enxofre ou,
noutros termos, a sua absorção pelo mercúrio, forneceu o pretexto para símbolos
muito diversos; mas o corpo resultante, homogéneo e perfeitamente preparado,
conserva o nome de Mercúrio filosófico
e a imagem do caduceu. É a matéria ou o composto da primeira ordem, o ovo vitriolado que necessita apenas
uma cozedura graduada para se transformar, primeiro em enxofre vermelho, seguidamente em Elixir, depois, no terceiro
período, em Medicina universal.
Na nossa Obra, afirmam os Filósofos, o
Mercúrio é suficiente. Segue-se uma mulher de longos cabelos ondulantes
como chamas. Personificando a Calcinação, aperta contra o peito o disco da Salamandra que vive no fogo e se alimenta do
fogo. O que este lagarto fabuloso designa é o sal central, incombustível e fixo, que conserva a sua natureza
até nas cinzas dos metais calcinados e que os Antigos chamaram Semente metálica. Na violência da acção
ígnea, as porções combustíveis do corpo são destruídas; só as partes puras,
inalteráveis, resistem e, embora muito fixas, podem extrair-se por lixiviação.
Tal é, pelo menos, a expressão espagírica da calcinação,
semelhança de que os autores se utilizam para servir de exemplo à ideia geral
que se deve ter acerca do trabalho hermético. No entanto, os nossos mestres na Arte têm o cuidado de chamar a atenção
do leitor para a diferença fundamental existente entre a calcinação vulgar, tal
como se realiza nos laboratórios químicos, e a que o Iniciado realiza no
gabinete dos filósofos. Esta não se efectua por meio de qualquer fogo vulgar, não
necessita do auxílio do revérbero mas requere a ajuda de um agente oculto, de
um fogo secreto, o qual, para dar
uma ideia da sua forma, se assemelha mais a uma chama. Este fogo ou água ardente é a centelha
vital comunicada pelo Criador à matéria inerte; é o espírito encerrado nas
coisas, o raio ígneo,
imorredouro, encerrado no fundo da substância obscura, informe, frígida». In Fulcanelli, 1926, Le
Mystère des Cathédrales, 1964, O Mistério das Catedrais, Interpretação
Esotérica dos símbolos herméticos, Edições 70, 1975, Lisboa, Colecção Esfinge.
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