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Os
sacrifícios que fazemos
Lanie
«Tens
a certeza de que queres fazer isto?, perguntou-me a minha melhor amiga ninfomaníaca
pela milésima vez desde que eu tinha atravessado as portas do clube nocturno
onde ela trabalhava..., e actuava..., como acompanhante. Dez era o meu refúgio.
Ela amparava-me quando a vida se tornava demasiado séria, e neste momento
estava muito para lá de séria. Dez era o diminutivo de Desdemona, que, numa
tradução livre, significava do diabo. Ela tinha mudado o nome no dia em que fizera
18 anos porque os pais se tinham recusado a autorizar a mudança antes. A sério,
quando ela nascera os pais tinham-lhe chamado Princesa, mas se outra pessoa que
não eles tentasse chamar-lhe aquilo seguia-se uma verdadeira luta de bar. Dez
era linda de morrer, o tipo de miúda com seios generosos que é retratada em
todos os romances: cabelos compridos pretos e sedosos figura de ampulheta,
pernas que nunca mais acabavam e o rosto de uma deusa. O único problema é que
se comportava como uma motard. E também gostava de fazer a rodagem a
todos os modelos. Como eu disse uma ninfomaníaca. Mas eu amava-a como se ela
fosse sangue do meu sangue. E, tendo em conta o que eu estava disposta a fazer
pelo sangue do meu sangue, era dizer muito. Não, não tenho a certeza, Dez, mas
tem de ser. Por isso, para de me perguntar antes que me faças mudar de ideia e
eu saia daqui a correr como a gata assustada que ambas sabemos que sou,
disse-lhe eu bruscamente.
Dez nunca dava muita importância
ao meu drama, pois divertia-se o mais que podia. Céus, como se divertia. E não
sentia um pingo de vergonha por isso. E estás mesmo disposta a entregar a tua
virgindade a um perfeito desconhecido? Sem romance? Sem copos, sem jantar, sem
6…? As suas perguntas incessantes estavam a enervar-me, mas eu sabia que ela
estava a fazer aquilo porque me amava e queria ter a certeza de que eu tinha
ponderado tudo. Nós tínhamos analisado minuciosamente todos os prós e contras e
eu estava convencida de que não nos tinha escapado nada. Porém, o que mais me
preocupava era o facto de estar a mergulhar de cabeça numa situação
completamente desconhecida. Em troca da vida da minha mãe? Sem pestanejar,
respondi enquanto a seguia pelo corredor escuro que levava à cave do Foreplay,
o clube nocturno onde ela trabalhava. Foreplay: o sítio onde a minha vida mudaria.
O ponto de não retorno. Faye, a minha mãe, tinha uma doença terminal. Ela
sempre tivera um coração fraco, mas o seu estado fora piorando progressivamente
com o passar dos anos. Ela quase morrera durante o meu parto, mas conseguira
recuperar disso e de inúmeras outras operações e tratamentos. Agora, não havia
como recuperar. A sua luz estava a apagar-se depressa de mais.
Nesta
fase o seu estado era tão fraco e frágil que ela estava acamada, mas não antes de
ter estado internada em hospitais tantas vezes que o meu pai, Mack, tinha
perdido o emprego. Ele recusara-se a deixá-la sozinha para ajudar uma estúpida
fábrica a cumprir as suas metas de produção. Eu nunca o culpei por isso. Ela
era a sua mulher, e ele levava muito a sério o seu dever de marido. Ele tinha
de cuidar dela, como ela teria cuidado dele se os papéis estivessem invertidos.
Mas o facto de ele ficar sem trabalho significou o fim do seguro de saúde. Também
significou que fomos obrigados a mexer na pequena conta poupança que o meu pai
tinha conseguido amealhar para a velhice. Logo, um seguro de saúde era um luxo
que os meus pais não podiam pagar. Uma situação fantástica, não vos parece? E
as coisas tinham piorado ainda mais. A doença de Faye tinha avançado até ao
ponto em que ela precisaria de um transplante de coração para continuar a
viver. Aquela notícia tinha-nos afectado a todos, mas foi Mack quem mais
sofreu.
Eu observava o meu pai todos os
dias. Como a sua principal preocupação era a mulher, ele não cuidava de si
mesmo e estava a emagrecer. E as olheiras escuras e olhos vermelhos mostravam
claramente que também não dormia tanto quanto deveria. Seja como for, ele fazia
sempre boa cara quando estava com a minha mãe. Ela tinha aceitado a sua morte
iminente, mas o meu pai..., ainda tinha esperança. O problema é que a esperança
estava a diminuir. A sua alma estava a definhar ao ver a mulher morrer um pouco
mais a cada dia que passava. Acho que um pedaço dele ia com cada pedaço dela. Uma
noite, entrei no quarto depois de a minha mãe ter adormecido profundamente. Ele
estava afundado na sua cadeira reclinável com a cabeça nas mãos e os seus
ombros estremeciam enquanto soluçava desesperadamente. Ele não queria que ninguém
o visse assim. Mas eu vi.
Nunca
o tinha visto tão abatido e não consegui deixar de pensar que quando a minha mãe
morresse ele não duraria muito tempo. Eu não tinha qualquer dúvida de que o meu
pai ia morrer, literalmente, de desgosto. Eu tinha de fazer alguma coisa.
Estava desesperada para melhorar a nossa situação. Para os pôr melhor. Dez era
a minha melhor amiga. A melhor de todas. Desde sempre que eu partilhara tudo
com ela, por isso ela estava a par de toda a situação. Tempos desesperados
pediam medidas desesperadas, e ao ver como eu estava transtornada ela acabara
por me falar sobre o negócio mais escandaloso que era feito em segredo no
Foreplay». In CL Parker, Um Milhão de Prazeres Proibidos, Editora Lua de Papel,
2014, ISBN 978-989-232-806-5.
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de ELuadePapel/JDACT