«Almeida
ergue-se numa zona erosiva do maciço hespérico, qual planalto que, afastado do sistema
luso-castelhano vulgarmente conhecido por meseta central, logo inflecte para norte
em direcção a Trás-os-Montes. As origens da vila raiana remontam ao castro de Cattacobriga,
localizado na Lusitânia, no espaço designado por Enxido da Sarça, cuja comunidade
tribal possuía laços étnicos com os Vetões. Muito atarefados andariam os pastores
lusos: pelas invernias, nas idas para a Betica e para a região do Douro; pelas
calmas estivais, no regresso às grandes altitudes, para que tanta transumância facultasse
a ocupação da citânia pelos Romanos em 61 a.C.. Quanto ao direito de trânsito dos
gados, continuaria por mais alguns séculos a ser fonte de conflitos, pelo menos
até à batalha de Navas de Tolosa, em 1212, já no período final da Reconquista,
quando ficou garantido o pasto dos rebanhos cristãos na bacia do Guadiana. Ao tempo
da romanização, o local fazia parte do plano de comunicações do Imperio através
de um ramal, que entroncava na via Mérida a Astorga e constituía ponto de
passagem da estrada que unia Conimbriga a Salmantina. Como nenhuma conquista é definitiva,
também os súbditos de Roma se viram dali desalojados posteriormente pelos povos
bárbaros. Foi preciso aguardar a chegada dos mouros para que os habitantes abandonassem
a anterior localização, reposicionassem a comuna cerca dum quilómetro mais abaixo
na direcção do meio-dia, erguessem uma pequena fortaleza defensiva e rebaptizassem
a povoação, passando a tratá-la por Al Mêda, dizem uns; Atmeidan, referem
outros; Talmeyda, escreveu frei Bernardo Brito, que foi cronista-mor do reino e
natural da vila.
No início da Primavera de 1801, Almeida
vivia ao ritmo de qualquer outra vila do interior, com problemas com problemas,
uns específicos outros nem tanto, que se discutiam em reunião municipal. Na última
sessão de câmara, o escrivão de notas, que ali acumulava com o cargo do
judicial, deixou para a posteridade o respectivo relatório que leu em voz no
final: A Junta Geral ordinária foi convocada pelo excelentíssimo juiz-presidente
João Bernardino Moreira que presidiu ao acto, estando também presentes o procurador,
tesoureiro e os elementos do vereamento. Por ser pública, a sessão contou com a
assistência dos interessados. Os trabalhos iniciaram-se com a leitura dos pontos
propostos à discussão; 1) A administração
dos matos maninhos e baldios; 2) Análise
da situação financeira da câmara.
Foram ainda consideradas abertas as
inscrições para o período antes da ordem do dia, tendo-se os inscritos pronunciado
e apresentado as seguintes reclamações: as medidas e pesos que contestam por aquelas
serem frequentes vezes falsificadas para furar a tabelação dos géneros, insinuando
que tal seja patrocinado pelo poder concelhio; a câmara não fazer acatar a
reserva das terças da produção alimentar para o consumo do município, que assim
vê ser-lhe negado o direito ao pão barato; a taxação de preços apenas incidir sobre
a venda a retalho. Afirmam ser inaceitável que o pão cozido pelas padeiras esteja
tabelado sem que idêntico rigor se aplique aos cereais; verificou-se também um forte
protesto contra o recurso aos aldeões para serviços a prestar nas obras e arranjos
das vilas, suas ruas, calçadas, praças e equipamentos, por tal constituir uma violência
despropositada sobre as paróquias». In Eduardo Gomes, Terra Queimada, Edições
Saída de Emergência, 2017, ISBN 978-989-773-047-4.
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