sábado, 31 de março de 2018

Religião no 31. A Mulher do Vaso de Alabastro. Margaret Starbird. «Vamos partir agora, disse ele, suavemente. Deixei os jumentos amarrados no portão. Falei com Lázaro e Marta. Vamos mandar buscá-los quando o perigo cessar»

jdact

«(…) Shalom, Miriam. Sou eu, Yosef. A figura esguia à frente de Yosef relaxou visivelmente ao ouvir aquela voz familiar. Oh, Yosef, a sua voz ficou embargada. Ele a olhou intensamente, com enorme compaixão. Ela estava pálida e emocionada, mergulhada em imensa dor. Ele ergueu a mão, um gesto involuntário para transpor a escuridão perfumada que os separava naquele jardim à luz da lua. Yosef, sussurrou ela, não sei se vou conseguir suportar. Ele tentou prevenir-me, e eu pensei que havia entendido. Ela tremia. O seu corpo estremecia na escuridão. Yosef tomou-a pelos ombros e segurou-a com firmeza. Ele não havia percebido a profundidade da sua própria dor até aquele momento. O cabelo longo e escuro da moça reflectia a luz da lua, as lágrimas faziam os seus olhos brilharem. Miriam, disse ele, suavemente. Mas parou de falar, hesitante. Será que ela já não estaria angustiada demais? Mas ele prometera ao amigo que a protegeria. E só havia uma maneira de fazê-lo: precisavam sair dali imediatamente, aproveitando a escuridão da noite. Ninguém poderia prever quando as autoridades apareceriam para buscá-la. Miriam, eu recebi um aviso. Temos que sair de Jerusalém esta noite. Não é seguro continuar aqui. Pilatos e Herodes Antipas podem estar à sua procura. Ela virou-se de costas para Yosef, os olhos perdidos na escuridão. Lentamente, voltou-se de novo para ele.
Acha mesmo que preciso fugir?, a sua voz era quase inaudível. Ele hesitou. Precisa, sim, Miriam. É a única maneira. Prometi a Yoshua que a protegeria com a minha vida. Não há outra escolha. Ela fez um gesto, demonstrando compreender. Está certo, Yosef. Eu sei. Ele leu para mim as palavras de Miquéias, o profeta. Eu compreendo. É por causa da promessa. Vou fazer como me pediu. Mas o que faremos com Marta e Lázaro? Yosef balançou a cabeça. Eu não lhes contei para onde iremos. Disse apenas que vou escondê-la na cidade. Até que o perigo acabe, ninguém deve saber que vamos partir. Por enquanto, Marta e Lázaro ficarão aqui. Eles dirão que está doente, para que não sintam a sua falta. Mais tarde, mandaremos buscá-los. Yosef havia planeado tudo: viajariam como pai e filha, evitando ao máximo atrair a atenção. Ninguém deveria saber qual era a identidade da jovem que o acompanhava. As autoridades pensavam que eles tentariam fugir pelo mar, por isso os portos seriam os locais mais perigosos. Em vez disso, preferiu seguir com ela por terra, atravessando o deserto. Ele havia separado alguns artigos de primeira necessidade para a jornada, mas dependeriam de amigos para ajudá-los até que chegassem ao destino planeado. Fugiriam para o Egipto, para Alexandria.
Ele sorriu, um sorriso abatido. A juventude e a beleza de Miriam eram tão cativantes... A Magdal-eder, a fortaleza da filha de Sião, a torre do rebanho. Ela precisava partir, aventurar-se pelos campos, viver no exílio. Exactamente como o profeta Miquéias prenunciara. Mas, por meio dela; a soberania seria devolvida a Sião. Mais uma vez, ele se sentiu maravilhado ao se lembrar do amigo que lhes mostrou os versículos da profecia de Miquéias, falando do exílio, do retorno e do restabelecimento da casa real de David. Ele, Yosef de Arimateia, recebera a responsabilidade de zelar pela segurança de Miriam. E não decepcionaria o amigo.
Vamos partir agora, disse ele, suavemente. Deixei os jumentos amarrados no portão. Falei com Lázaro e Marta. Vamos mandar buscá-los quando o perigo cessar. Prometo. Ela sabia que o amigo estava certo. Ficara o dia inteiro pensando que seria preciso fugir do ódio e da inveja de Herodes Antipas, tão inseguro do próprio trono ao ponto de não tolerar nenhum rival. E dos romanos também. Eles temiam uma insurreição da nação judaica. O ódio dos judeus pelas forças romanas de ocupação era intenso. E seu amor e entusiasmo pelo Filho de David, que fora tão brutalmente executado, poderia iniciar uma revolução a qualquer momento. Era melhor que fugisse, para que os rumores sobre o desaparecimento do corpo não gerassem um confronto suicida do povo contra o poder das legiões romanas. Mesmo sendo ainda tão jovem, ela sabia disso. O seu marido lhe havia explicado tudo, segurando-a gentilmente enquanto ela derramava lágrimas no aconchego dos seus ombros. Ele tentou confortá-la; e, pelo bem do homem a quem amava, ela tentara ser corajosa. Mas não conseguiu e pôde ver nos olhos dele toda a angústia que sentia pelo destino da mulher. Estou pronta, Yosef. Vamos partir». In Margaret Starbird, Maria Madalena e o Santo Graal, Mulher do Vaso de Alabastro, Quetzal Editores, colecção Referências, ISBN 978-972-564-624-3.

Cortesia deSextante/QuetzalE/JDACT