Cortesia
de wikipedia e jdact
A
Casa Azul na rua Londres
«(…) Ele
chegou à Cidade do México quase sem dinheiro. Por meio de contactos com outros imigrantes
alemães, arranjou emprego como caixeiro na Cristalería Loeb, loja de artigos de cristal. Depois,
foi vendedor numa livraria. Por fim, trabalhou numa joalharia chamada La Perla,
de propriedade de conterrâneos seus, alemães com quem ele tinha viajado para o México.
Em 1894, Guillermo casou-se com uma mexicana que morreu quatro anos depois, ao
dar à luz a segunda filha do casal. Depois apaixonou-se por Matilde Calderón,
colega de trabalho na joalharia La Perla. A própria Frida contou assim a história:
na noite em que a sua mulher morreu, meu pai chamou minha avó Isabel, que
chegou trazendo minha mãe. Minha mãe e meu pai trabalhavam juntos. Ele se
apaixonou profundamente por ela, e depois os dois acabaram casando. Não é difícil
imaginar porque Guillermo amava Matilde Calderón. Fotografias dela na época do
casamento mostram uma mulher impressionantemente bonita, com enormes olhos pretos,
lábios carnudos e queixo resoluto. Ela parecia um sininho de Oaxaca,
definiu Frida certa vez. Quando ia ao mercado, ela apertava bem a cinta,
marcando graciosamente a cintura, e carregava a cesta com ar coquete. Nascida
em Oaxaca, Matilde Calderón y González era a mais velha de doze filhos de
Isabel González y González, criada em convento e filha de um general espanhol,
e Antonio Calderón, fotógrafo de ascendência indígena nascido na cidade mexicana
de Morelia. De acordo com Frida, a sua mãe era inteligente, embora analfabeta:
o que lhe faltava em educação formal ela compensava em devoção religiosa.
É um pouco mais difícil
imaginar por que a devota Matilde Calderón se encantou por Guillermo. O imigrante
de 26 anos era judeu de nascimento, ateu por convicção, e sofria de epilepsia.
Por outro lado, a pele clara e a educação europeia devem ter tido certo apelo, numa
época em que qualquer coisa que vinha da Europa era considerada superior a tudo
que fosse mexicano. Além disso, ele era inteligente, trabalhador e bastante
bonito, apesar das enormes e proeminentes orelhas. Tinha cabelos castanhos
crespos, uma boca formosa e delicada, um bigodinho de pontas finas viradas para
cima e um corpo esbelto e ágil, ele era muito interessante e,
quando caminhava, movia o corpo de maneira elegante, disse Frida. Se o seu
olhar era um pouco intenso demais, e com o passar dos anos os seus enormes olhos
castanhos ficariam cada vez mais inquietos, era também um olhar romântico.
Aos 24 anos, Matilde,
que havia muito já passara da idade usual do casamento, talvez estivesse
particularmente susceptível depois de um caso amoroso anterior, de desfecho trágico.
Frida se lembrava de que, quando tinha onze anos de idade, a mãe mostrou-lhe um
caderno de capa em couro russo em que ela guardava as cartas do seu
primeiro namorado. Na última página, o caderno dizia que o remetente das
cartas, um jovem alemão, se suicidara na presença dela. Esse homem continuava
vivo na lembrança dela. É natural que a jovem mulher se sentisse atraída por
outro alemão, e, se não amava Guillermo, Frida dizia que não, Matilde pelo
menos achava que encontrara um bom partido. Foi Matilde Calderón de Kahlo quem
convenceu o marido a seguir a carreira de fotógrafo, profissão do pai dela.
Frida disse que o avô emprestou uma câmara a Guillermo e
que a primeira coisa que os dois fizeram foi viajar pelo país. Eles produziram
uma colecção de fotos da arquitectura indígena e colonial e voltaram para abrir
a sua primeira loja, na avenida 16 de Septiembre.
As fotografias foram encomendadas por José Ives Limantour, secretário
do Tesouro do ditador Porfirio Díaz, e ilustrariam uma série de publicações de
luxo, em formato grande, para a celebração do centenário da independência
mexicana. A empreitada levou quatro anos para ser concluída. De 1904 a 1908,
usando excelentes câmaras alemãs e mais de novecentas placas de vidro que ele
mesmo preparava, Guillermo registou a herança cultural do México e fez por merecer
o elogioso epíteto de o primeiro fotógrafo oficial do património cultural do México».
In
Hayden Herrera, Frida, A Biografia, 1983, tradução de Renato Marques, Editora
Globo, 2011, ISBN 978-852-505-353-4.
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