Cortesia
de wikipedia e jdact
«(…) Os
estrangeiros que entrassem na cidade sem licença estavam sujeitos a coima,
vinte cruzados se entrarem sem fato e cinquenta se entrarem com fato, o que
denota a ligação estabelecida à época entre a roupa contaminada e o risco de
contágio:
quanto
as pessoas que entrarem se fora com fato sem licença de qualquer calidade que
sejam ou sem fato pagaram os que trouxerem fato cincoenta cruzados e o fato
queimado e os guardas mores lhe não poderam moderar esta pena salvo em câmara
com parecer dos vereadores e os que entrarem sem fato pagaram vinte cruzados
sem apelaçam nem agravo.
As portas da cidade
que se decretou continuarem abertas encerravam no entanto à noite, depois das
trindades e abriam de novo apenas às sete da manhã (e que tivessem
cuidado mandasem aos guardas das portas soba a ditta pena que não abram as
dittas portas pella manham senão as sete oras da manham e a noute ate a
trindade e fora destas senão posam abrir as dittas portas salvo com licença do
guarda mor e mandaram que este acordo se apregoasse na ditta praça e nos mais
lugares como de feito se apregoou). Em relação às
restantes três foi determinado pela câmara que as demais portas e postigo desta
cidade se tapasem todos de pedra e cal e por elas se não sirva ninguém. A
muralha surge assim, como recurso perfeitamente operacional, gerido pela Câmara
com o concurso da demais população, que permite defender a cidade de uma ameaça
externa, invisível e quase imaterial neste caso, mas concretizada em todos os
que fossem estranhos à urbe e a cuja presença convinha a todo o custo furtá-la.
Em 1646, quando João IV consagra o reino à Imaculada Conceição, o
monarca mandou acoplar às principais portas da cidade (três destas portas
coincidem com aquelas que haviam permanecido abertas em 1637, excepção feita à
porta de S. Miguel que na altura havia sido encerrada, mantendo-se aberta a de
Santa Cristina), a saber S. Miguel, Arco, Soar e Cimo
de Vila a seguinte legenda ainda visível, nas duas remanescentes:
À
Eterna Sagrada Immaculadissima Conceição de Maria prometeo publicamente d. João
IIII Rey de Portugal juntamente com as Cortes gerais, seria tributário
annualmente com os seos Reynos, e juntamente affirmou com juramento defenderia
perpetuamente a mesma Mây de Deos ser perservada da culpa original, eleita
perpetuamente Padroeira; e para que a piedade lusitana se conservasse nesta sua
heróica resolução mandou lavrar nesta viva pedra este memorial perpetuo no anno
Chrito de 1646 de seo Reynado sexto.
No
século XVIII as muralhas encontravam-se ainda completas e todas as suas portas
operacionais segundo referência do padre Leonardo Sousa nas suas Memórias Históricas e Chronológias dos Bispos de Viseu (sette portas
dão patente entrada aos que a Vizeu concorrem e sendo todas formadas de gosto
mourisco, mostram como tão bem os muros, sua grande antiguidade. Sobre cada
huma das mais principaes que são a de S. Miguel, arco, Soar e Simo de Villa se
lê no idioma latino gravado em grandes padrões a régia determinação que nas
Cortes de Lisboa se assentou no anno de 1646 para tomar a Maria Santíssima Padroeira
do Reino) e mantinham claramente a sua utilidade para
a cidade. A sua importância é atestada pela postura camarária de 22 de Abril de
1739 em que se ordena que seja reconstruída a Porta de S. Sebastião, que se
encontrava derrubada, ordenando que seja levantada quatro palmos para facilitar
a circulação de veículos (nesta foi requerido pello Procurador da Camera
que a porta do muro de S. Sebastiam se acha rubada e que requeria se puzese no
estado antigo levantando se mais alto quatro palmos em termos que pudesem pasar
as conduçoens e que fose notificado o almotase para mandar fazer a dita obra).
As Portas
(segundo Bluteau porque pelas portas se traz, e se leva fora o que se quer.
Porta he abertura na parede, ou muro de qualquer lugar fechado, e serve para
entrar e sahir. As primeiras portas forão as das cidades, villas, e povoações
assim para guardar os moradores delias, como para introduzir os mantimentos) da
muralha simbolizavam não só os pontos de acesso à cidade, o espaço breve onde a
linha de separação entre o espaço urbano e o não urbano podia ser quebrada, mas
igualmente a charneira na cobrança de alguns impostos municipais. Nesse
sentido, e de acordo com Bonet Corrêa, numa cidade as muralhas pertenciam à
jurisdição militar e as portas à civil, o que justificou a permanência das
segundas, mais do que das primeiras, aquando da perda do seu carácter funcional».
In
Liliana Castilho, A cidade de Viseu nos
Séculos XVII e XVIII, Arquitectura e Urbanismo, Tese de Doutoramento em
História da Arte apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto,
Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2012.
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FLUdoPorto/JDACT