Cortesia
de wikopedia e jdact
Quando eu não te tinha
«(…)
Todos os dias agora acordo com alegria e pena.
Antigamente acordava sem sensação
nenhuma; acordava.
Tenho alegria e pena porque perco
o que sonho
E posso estar na realidade onde
está o que sonho.
Não sei o que hei-de fazer das
minhas sensações,
Não sei o que hei-de ser comigo.
Quero que ela me diga qualquer
coisa para eu acordar de novo.
Quem ama é diferente de quem é.
É
a mesma pessoa sem ninguém.
O amor é uma companhia.
Já não sei andar só pelos
caminhos,
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me
andar mais depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo
gostar bem de ir vendo tudo.
Mesmo a ausência dela é uma coisa
que está comigo.
E eu gosto tanto dela que não sei
como a desejar.
Se a não vejo, imagino-a e sou
forte como as árvores altas.
Mas se a vejo tremo, não sei o
que é feito do que sinto na ausência dela.
Todo eu sou qualquer força que me
abandona.
Toda
a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio.
Passei toda a noite, sem saber
dormir, vendo sem espaço a figura dela
E vendo-a sempre de maneiras
diferentes do que a encontro a ela.
Faço pensamentos com a recordação
do que ela é quando me fala,
E em cada pensamento ela varia de
acordo com a sua semelhança.
Amar é pensar.
E eu quase que me esqueço de
sentir só de pensar nela.
Não sei bem o que quero, mesmo
dela, e eu não penso senão nela.
Tenho uma grande distracção
animada.
Quando desejo encontrá-la,
Quase que prefiro não a
encontrar,
Para não ter que a deixar depois.
E prefiro pensar dela, porque
dela como é tenho qualquer medo.
Não sei bem o que quero, nem
quero saber o que quero.
Quero só pensar ela.
Não
peço nada a ninguém, nem a ela, senão pensar».
[…]
In
Alberto Caeiro, O Pastor Amoroso, digitalizado por Eduardo Lopes O. Silva, Rio
de Janeiro, 2006, Wikipedia.
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