quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Indignai-vos! Stéphane Hessel. «A distância crescente entre ricos e pobres, o estado do planeta, o tratamento dispensado aos imigrantes ilegais, a corrida para ter cada vez mais, a competição, a ditadura dos mercados financeiros, e a ameaça às conquistas alcançadas pela aposentação e segurança social. Para ser eficaz, é preciso que a luta aconteça como acção conjunta»


Paulo Klee, Angelus Novus, 1920. Museu de Israel, Jerusalém.

(1917-2013)
 Berlim
Cortesia de wikipedia e jdact

«Neste texto, Stéphane Hessel refere-se à obra de Klee e ao comentário que sobre ela deixou o filósofo alemão Walter Benjamin, nas suas Teses sobre a filosofia da história, escritas em 1940 sob o choque do pacto germano-soviético. Walter Benjamin foi seu primeiro proprietário. Ele via na obra um anjo repelente, a tempestade que chamamos de progresso. Que sorte a nossa, poder alimentar-nos da experiência deste grande resistente, que sobreviveu aos campos de concentração de Buchenwald e de Dora, que participou da redacção da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, foi embaixador da França e agraciado com a Legião de Honra! Para Stéphane Hessel, o motivo básico da resistência foi a indignação. É verdade que, no mundo complexo de hoje, as razões para se indignar podem parecer menos claras e nítidas do que nos tempos do nazismo. Mas, procurem e encontrarão:
  • a distância crescente entre ricos e pobres, o estado do planeta, o tratamento dispensado aos imigrantes ilegais e aos ciganos, a corrida para ter cada vez mais, a competição, a ditadura dos mercados financeiros, a ameaça às conquistas alcançadas pela resistência, a aposentação, a segurança social. Para ser eficaz, é preciso que essa luta aconteça como no passado, em rede, como acção conjunta.
Por isso, podemos, sim, dar crédito a Stéphane Hessel e acompanhá-lo nessa caminhada, à qual ele conclama, de uma insurreição pacífica. Esperar, em vez de não ex-asperar, propõe o embaixador e escritor alemão Stéphane Hessel em Indignai-vos, breve, mas arrebatador ensaio a respeito do mundo contemporâneo. Esperar, em vez de exasperar-se, não sentado, ou indiferente, mas agarrado à potência transformadora da esperança. Olhem à sua volta e encontrarão os temas que justificam a sua indignação, Hessel sugere.
  • A exasperação inclui a fúria e a cólera; 
  • Ela resulta, hoje em dia, no terrorismo. Já a indignação conduz à luta persistente e ao trabalho; 
  • Ela cimenta a esperança, que lhe dá corpo.
Nascido em 1917, o diplomata e embaixador Stéphane Hessel, conserva e cultiva o espírito rebelde da juventude. Continua a ser um homem que aposta quase tudo na indignação, já que, segundo ele nos diz, só a indignação leva à esperança. A edição francesa de Indignai-vos já vendeu mais de 1,5 milhão de exemplares. O livro está traduzido em quase uma dúzia de países. Suas palavras se alastram, ecoam com força em nossos corações vazios. Hessel, que foi um dos redatores da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, mantém-se, ainda hoje, absolutamente fiel aos princípios do documento que ajudou a escrever. A indignação, diz, é um sentimento universal. Sentimento sem um objecto fixo ou uma posição política determinada. O importante é que cada um tenha o seu motivo de indignação, afirma. A proximidade inevitável da morte não o afasta do culto à militância, que considera o teatro por excelência da indignação. Rememora:
  • Quando alguma coisa nos indigna, como fiquei indignado com o nazismo, nos transformamos em militantes, fortes e engajados, nos unimos à corrente da história.
O inimigo principal de Hessel, hoje, como desde sempre, tem um nome: a indiferença. Nos anos 1940, na França, resistir à ocupação nazista era abandonar a indiferença para engajar-se na busca de uma nova atitude de uma diferença. É verdade:
  • o mundo tinha um inimigo enorme e monstruoso e era menos difícil perder o caminho. Resistir, era não aceitar a ocupação alemã, não aceitar a derrota. Era relativamente simples.
Quando era apenas um jovem normalista, Hessel deixou-se impregnar pelas leituras de A Náusea e O Muro, que considera os dois livros mais importantes do filósofo francês Jean-Paul Sartre. No mundo contemporâneo, turvo e complexo, os motivos para a indignação parecem cada vez menos palpáveis. Senão invisíveis. Muitas vezes, nós, por indiferença, os reduzimos a visões fantasmagóricas, delírios de perseguição, paranóias. Escreve Hessel:
  • É verdade, os motivos para se indignar actualmente podem parecer menos nítidos ou o mundo pode parecer complexo demais. Quem comanda? Quem decide? Nem sempre é fácil distinguir. Num mundo onde os inimigos se mascaram, a indignação toma, muitas vezes, a aparência de uma loucura juvenil. Um espernear sem motivo, um sentimento que nos transforma em Quixotes a enfrentar moinhos de ventos».  
In Stéphane Hessel, Indignai-vos!, tradução de Marly Peres, Mensanapress, Artesanato gráfico e editorial, 2011.

Cortesia de Mensanapress/JDACT