sexta-feira, 10 de abril de 2015

Infantas de Portugal. Rainhas em Espanha. Marsilio Cassotti. «Entre 1165 e 1816, onze infantas de Portugal foram rainhas em Espanha. A primeira, a infanta dona Urraca, fila de Afonso Henriques que com o seu casamento contribuiu para a independência de Portugal…»

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Nos reinos da Península Ibérica, durante a Idade Média, na linguagem das chancelarias utilizava-se a palavra infante ou infanta, (infans) para designar os filhos ou filhas legítimos do rei. É neste sentido que se deve entender o título dado a onze das doze mulheres portuguesas que, entre 1165 e 1816, casaram com outros tantos príncipes herdeiros ou reis de outros reinos peninsulares, convertendo-se assim em rainhas de Leão, Castela, Aragão e finalmente de Espanha. Durante esses quase setecentos anos desenrolaram-se em Portugal vários acontecimentos que tiveram uma relação estreita com essas infantas por intermédio dos seus matrimónios, entre eles a fundação dos mosteiros de Lorvão e Arouca, em meados do século XIII, a demarcação da fronteira com Castela, a mais antiga da Europa, fixada pelo Tratado de Alcanises, de 1297, o triunfo na Batalha do Salado, em 1340, a crise que desembocou na invasão castelhana durante a regência de dona Leonor Teles, em finais de 1383, e que conduziu à vitória na Batalha de Aljubarrota, a guerra com Castela empreendida por Afonso V para defender os direitos da sua sobrinha, a Excelente Senhora, no último quartel do século XV, e as tentativas de união com Portugal desejadas por Isabel, a Católica e Filipe II de Espanha, pois as mães de ambos procediam da estirpe real lusitana. Contudo, apesar de esses episódios serem bem conhecidos, não sucede o mesmo com as infantas que em grande medida os originaram.
Foi dar a conhecer esses episódios que nos propusemos com esta obra, traçar perfis históricos dessas mulheres que nos permitam dar-lhes o devido valor na medida que neles participaram, começando pelas suas origens e assinalando os actos mais importantes da sua vida como rainhas consortes. Na sua maioria esses aspectos são pouco valorizados, apesar da grande importância que tiveram em cada momento, quer como presentes de paz quer como possíveis defensoras dos interesses portugueses nos seus reinos de adopção. Em primeiro lugar, haveria que destacar a sua importância como mães do futuro herdeiro, a mais importante função de qualquer infanta que se tornasse soberana, pois só a partir do nascimento de um descendente, melhor ainda se fosse varão, se tornava efectiva a aliança assinada, no caso que nos ocupa, entre o rei de Portugal e o marido da sua filha (sempre e quando o papa não declarasse ilegítimo o matrimónio, como sucedeu nos três primeiros casos). Daí resultava que o primeiro desafio que se apresentava a uma infanta, mal casasse, era demonstrar que era fértil. Ao longo de sete séculos, os motivos de uniões dinásticas entre infantas de Portugal e príncipes ou reis peninsulares iriam variando, mas a sua capacidade de gerarem filhos seria uma conditio sine qua non. Num primeiro período, que inclui os matrimónios das três primeiras infantas, tentava-se consolidar o reino de Portugal, ainda jovem, através dessas alianças, de um modo geral como corolário de um acordo de paz com um reino mais antigo e poderoso, Leão nos dois primeiros casos. Posteriormente tentar-se-ia, com o casamento das infantas, favorecer o alargamento do território, em detrimento dos seus vizinhos e por meio da fixação de fronteiras com Castela. O matrimónio de uma delas com um rei aragonês, verdadeira excepção à regra teria exclusivamente um carácter estratégico defensivo a respeito do reino de Castela.
Uma vez atingidos os objectivos acima mencionados, surgiram novas finalidades para o casamento das infantas de Portugal com reis castelhanos, entre outros, favorecer a unidade das coroas, assunto que as capitulações matrimoniais cuidavam sempre de apresentar de forma ambígua, para não ferir as susceptibilidades dos súbditos de ambos os reinos. Durante o período que coincide com a consolidação da conquista e colonização dos seus respectivos impérios na América, não se realizou nenhuma aliança dinástica. Até então, o último matrimónio de uma infanta portuguesa com um rei espanhol realizara-se em 1525, e que acabou por comprometer a independência de Portugal, com a chegada dos Áustria espanhóis ao trono lusitano. Houve que esperar até 1725 para que se aquietassem os receios mútuos, e que uma infanta portuguesa, pertencente já à dinastia de Bragança, aspirasse tornar-se, por meio de casamento, rainha de Espanha. Depois deste casamento, houve outro, o último, que teve lugar em 1816. Em ambos os casos, entre as principais motivações contava-se fazer face às ameaças que pesavam sobre os respectivos impérios na América». In Marsilio Cassotti, Infantas de Portugal, Rainhas de Espanha, tradução de Francisco Boléo, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2012, ISBN 978-989-626-396-6.

Cortesia ELivros/JDACT