Cortesia
de wikipedia e jdact
Sancho
II de Portugal. Um Conspecto Historiográfico
Com
a devida vénia ao Doutor José Varandas
As
Histórias Gerais
«(…) Todos os compêndios de história geral de Portugal apresentam
um capítulo, de dimensão variada, descritivo da figura e dos feitos de Sancho
II. Estes primeiros trabalhos desenvolvem essencialmente quadros de observação
influenciados pela tradição cronística e onde o tratamento de fontes
documentais é quase ignorado. São histórias que narram os sucessos militares,
civis, eclesiásticos, etc., e limitam-se a isso mesmo, a produzir narrativas
sobre acontecimentos de diversa índole. São obras que na maior parte das vezes
têm perante si objectivos de índole pedagógica e divulgativa. No fundo
particularizam uma escrita muito própria, virada para as massas que pretendem
educar, e onde os feitos, os acontecimentos, são narrados, muitas vezes de
forma romanceada, e sem recurso à utilização de métodos críticos ou de
verificação do que comentam. O tratamento dado aos acontecimentos do reinado de
Sancho II é, por isso superficial, e geralmente repetitivo de modelos
anteriores onde, as personagens, se apresentam sobre a forma de estereótipos,
sendo avaliados sempre da mesma maneira e com o sentido de produzir um sentimento
de continuidade histórica, pouco problematizada, e centrada apenas na evolução
da realidade interna. O modelo do rei incapaz, porque frágil, doente, pouco
enérgico, influenciável por um conjunto de personagens sinistras, que tantas
vezes é referido na cronística, vale como um desses modelos simplificados.
A
problemática das fontes é geralmente subalternizada, quando não esquecida, por
estes divulgadores, que deixam de fora outros aspectos da história, mais comum
a versões eruditas, como o estudo da genealogia, o processo de investigação, ou
a aplicação da hermenêutica. Neste sentido, estas histórias gerais, de fundo
divulgativo, são especializadas também em aprofundar os silêncios sobre
determinados factos, verdadeiros ou lendários, e sobre figuras cujo percurso
apresenta algumas dificuldades de apresentação. Não as acusando individualmente
todas esta obras padecem de um conjunto de omissões, claramente assumidas, em
função do período em que são produzidas e do público a que se destinam e, no
caso de Sancho II, colocam o leitor perante a imagem do anti-herói, do rei que
a nação não pode homenagear, mas que se apresenta de forma longínqua e cujo fim
é redentor da nação. As histórias gerais sobre Portugal conhecem outro período
de grande desenvolvimento com o Estado Novo, onde a importância da coesão
nacional dirigida para um propósito muito bem definido, produz modelos
patrióticos e heróicos, onde figuras como a de Sancho II encontram pouca
simpatia. Nem mesmo a vertente, assumida por historiadores como António Brandão
e Alexandre Herculano, de que este rei é responsável por um dos momentos de
maior expansão territorial no reino, é utilizada para valorizar a sua imagem. A
posição tradicional assumida por muitos destes historiadores, sobre a
participação militar deste rei, é a da sua desvalorização, já que a versão
oficial assenta a dinâmica da conquista nas campanhas dirigidas pelos mestres
das ordens militares.
Fr.
António Brandão (1632). Quarta
parte da Monarchia Lusitana que conthem a Historia do reyno de Portugal, desde
o tempo delRey D. Sancho I, até o reynado delRey D. Affonso III. Lisboa,
ed. por Pedro Crasbeek, 1632
Escrita há trezentos e setenta e um
anos a Quarta Parte da Monarquia Lusitana…,
marca o nascimento da historiografia portuguesa. Apesar de aparecer em
jeito de crónica caracteriza-se já por apresentar um notável espírito crítico
em relação às informações que reproduz. No caso particular do reinado que nos
interessa é comum produzir juízos de valor sobre a forma que as crónicas
antigas do reino trataram a memória daquele rei, apontando incoerências,
contradições, impossibilidades e mentiras, chegando mesmo a corrigir,
utilizando processos comparativos, ou verificando se são verdadeiros ou falsos,
documentos notariais, bulas papais e instrumentos particulares. E, neste
aspecto, está uma das novidades, a utilização crítica de fontes documentais ao
lado da interpretação rigorosa e desconfiada das informações que crónicas e
livros de linhagens fizeram chegar ao século XVII, altura em que o distinto
cisterciense escreveu. É comum ao referir-se a códices existentes na Torre do
Tombo reclamar da sua veracidade, apontando-os como cópias e indicando quais os
erros contidos». In José Varandas, Bonus Rex ou Rex Inutilis, As
Periferias e o Centro. Redes de poder no reinado de Sancho II (1223-1248), Ude
Lisboa, FdeLetras, DdeHistória, Tese de Doutoramento em História, História
Medieval, 2003, Wikipedia.
Cortesia de Ude Lisboa/
FdeLetras/ DdeHistória/JDACT