Monte Giordano
«(…) Adriana, da casa de Mila,
era uma mulher muito ambiciosa. O pai, um dos sobrinhos de Calisto III, tinha
ido para a Itália quando o tio se tornara papa, porque parecia que sob aquela
benigna e poderosa influência poderia haver um grande futuro para ele. Adriana,
portanto, era parenta de Roderigo Bórgia, que a tinha em grande estima, porque
era uma mulher não apenas bonita, mas inteligente. Fora devido a essas
qualidades que ela se casara com Ludovico, da nobre casa de Orsini, e os Orsini
eram uma das mais poderosas famílias da Itália. Adriana tinha um filho que
recebera o nome de Orsino; este menino era doente e, por ser vesgo, muito pouco
atraente, mas devido à sua posição, herdeiro de uma grande fortuna, Adriana
esperava conseguir um brilhante casamento para ele. Os Orsini tinham muitos palácios
em Roma, mas Adriana e sua família moravam no que ficava no Monte Giordano,
perto da ponte de Santo Angelo. E foi para esse palácio que Lucrécia e César
foram enviados depois de se despedirem dos irmãos e da mãe. Ali, a vida era
muito diferente do que na casa que dava para a Piazza Pizzo di Merlo. Com
Vannozza tinha havido uma alegria despreocupada, e as crianças desfrutavam de
uma grande liberdade. Podiam andar pelos vinhedos, ou fazer viagens no rio;
visitavam com frequência o Campo di Fiori, onde o misturar-se com todos os
tipos de pessoas lhes dera um grande prazer. César e Lucrécia perceberam que a
vida realmente mudara.
Adriana inspirava um medo
respeitoso. Era uma mulher bonita, mas estava sempre vestida de um preto
protocolar, insistindo constantemente que não se devia esquecer que aquela era
uma casa espanhola, muito embora estivesse situada no coração da Itália. Com
suas imponentes torres e fortificações em ameias dominando o Tibre, o palácio
era sombrio; suas grossas paredes impediam a entrada da luz do sol e da alegria
da Roma que as crianças tinham conhecido e amado. Adriana nunca ria como
Vannozza, e nela nada havia de calor e amor. Ela tinha muitos padres morando no
palácio; havia orações constantes, e, por conseguinte, Lucrécia acreditava,
naqueles primeiros anos no palácio dos Orsini, que sua mãe de criação era uma
mulher muito virtuosa. César se irritava contra a disciplina, mas nem ele podia
fazer qualquer coisa contra ela, até ele estava intimidado pelo sombrio palácio,
pelas muitas orações e pelo sentimento de que o palácio era uma prisão na qual
ele e Lucrécia tinham sido encarcerados, enquanto Giovanni pudera ir com pompa
e esplendor para a Espanha e a glória.
César remoía em silêncio. Não
tinha acessos de raiva como acontecia em casa de sua mãe; ficava mal humorado e
às vezes sua raiva dominada deixava Lucrécia com medo. Então, ela se agarrava a
ele e lhe pedia que não ficasse triste; cobria-o de beijos e bradava que era
dele que ela mais gostava..., mais do que de qualquer outra pessoa no mundo, que
iria amá-lo aquele dia, no dia seguinte e para sempre. Nem mesmo essa declaração
conseguia acalmá-lo, e ele continuava sorumbático e infeliz, mas às vezes
voltava-se para ela e a agarrava num daqueles abraços ferozes que a machucavam
e a excitavam. Então, ele dizia: nós estamos juntos, irmãzinha. Sempre vamos
amar um ao outro..., mais do que tudo no mundo..., mais do que tudo no mundo
inteiro. Jure. E ela jurava. Às vezes, os dois ficavam deitados juntos na cama
dela ou na dele. Ela ia até lá para consola-lo, e ele ia procura-la em busca de
consolo. Então, ele falava sobre Giovanni e no quanto a vida era injusta. Porque
o pai deles adorava Giovanni?, perguntava César. Porque César não tinha sido o
escolhido para ir para a Espanha? César nunca entraria para a Igreja. Ele
odiava a Igreja, odiava..., odiava.
Sua veemência a
assustava. Ela se benzia e lembrava-o de que dava azar falar assim contra a
Igreja. Os santos ou, talvez, o Espírito Santo poderiam ficar zangados e vir castiga-lo.
Ela dizia que estava com medo; mas dizia aquilo para dar a ele a oportunidade
de consola-la, de lembrá-la de que ele era o grande César, que não tinha medo
de ninguém, e ela era a pequena Lucrécia, que devia ser protegida. Às vezes ela
o fazia esquecer da raiva contra Giovanni. Às vezes, eles riam juntos e
lembravam-se de como tinham se divertido nas idas ao Campo di Fiori. E então
juravam que, acontecesse o que acontecesse, iriam sempre amar um ao outro mais
do que a qualquer outra pessoa no mundo. Mas, durante aqueles primeiros meses,
as crianças sentiam que eram prisioneiras. Roderigo ia visitá-los em Monte
Giordano. No princípio, César pedia que os deixassem ir para casa, mas
Roderigo, apesar de pai extremoso, sabia ser duro quando achava estar agindo
para o bem dos filhos. Meus queridos, dizia ele, na casa de sua mãe, vocês
faziam suas travessuras. Mas fazer travessuras é coisa de criancinha, não de
crianças crescidas. Não é apropriado que vocês passem o tempo naquela casa
humilde. Um grande futuro aguarda vocês dois. Confiem em mim, que vou julgar aquilo
que é melhor para vocês». In Jean
Plaidy, Lucrécia Borgia, Edição Record, 1996, ISBN
978-850-104-410-5.
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Jean Plaidy, Itália, Literatura,