sábado, 13 de agosto de 2011

O Papado e Portugal no primeiro século da História Portuguesa: Carl Erdmann. «Só agora se pode apreciar devidamente o papel extraordinário desempenhado por um homem, cuja acção não foi ainda julgada devidamente. Refiro-me ao arcebispo João Peculiar de Braga, que suportou sobre os seus ombros, durante quatro decénios, quase todas as negociações com Roma»



Cortesia de rosebudcine7 e quebranotas

Introdução.
«O alargamento da esfera de influência papal no oeste da península ibérica data do período entre o fim do século XI e o fim do século XII. Se anteriormente a Gregório VII não existiam relações entro Roma e o clero galaico-lusitano, depois de Alexandre III a sujeição de Portugal ao organismo da igreja católica romana, é um facto. Em 1095 o condado de Portugal é separado da Galiza e entregue ao conde Henrique de Borgonha, conservando-se, no entanto, dentro do reino de Leão.
Noventa anos mais tarde seu filho Afonso I deixa Portugal como reino independente, independência que se manteve até hoje através das vicissitudes dos tempos.

Nota: O presente trabalho é a tradução de «Das Papsttum und Portugal im ersten Jahrhundert der portugiesischen Geschichte» por Carl Erdmann, Jahrgand 1928, Berlim.

Admitindo mesmo que a coincidência destes acontecimentos seja puramente casual, a verdade é que teve como resultado um enlace significativo dos factos o forças criadoras. Sabe-se que o primeiro rei português tornou o seu país tributário da Santa Sé. O motivo desta oblação conhece-se também:
  • Assegurar a independência portuguesa em face da vizinha Castela.
Das relações entre Portugal e a cúria nesta época, este foi o único facto que até agora atraiu a atenção, o que, naturalmente levou a concluir que a Santa Sé teve um interesse particular e consequentemente uma parte activa na formação da independência portuguesa.


Cortesia de vinteestrelasalempnep e aconteceunahistoriaconquistas

Um estudo mais profundo desmente, porém, esta opinião. Ao contrário, a cúria, tendo sempre em vista na Península Ibérica o objectivo supremo da concentração de todas as forças para a luta com os infiéis, opôs-se, por isso mesmo, durante muito tempo, à criação dum Portugal independente. Isto foi, para Portugal, um facto de grande transcendência. A autoridade dos papas, mesmo quando eles se abstinham de intervir directamente nos negócios dos estados seculares, era tao grande que o reconhecimento ou não reconhecimento dos pequenos estados formados na Península era para estes duma importância capital. Outro aspecto de maior significado era ainda o seguinte:
  • Os soberanos portugueses não podiam, como sucedeu também com os monarcas alemães, dispensar a colaboração dos órgãos eclesiásticos, especialmente do episcopado.
É natural que a separação política de Portugal e dos reinos vizinhos se tornasse dificílima, visto o clero português estar sujeito ao domínio dos príncipes da igreja castelhana. E como a organização eclesiástica dependia do papado, todos os esforços deviam tender ao reconhecimento da independência política e da autonomia eclesiástica pela Santa Sé.


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Considerados assim os acontecimentos daquela época, os planos e êxitos do fundador da dinastia portuguesa, o conde Henrique de Borgonha, e de seu filho Afonso, primeiro rei de Portugal, aparecem-nos a uma nova luz. Só agora se pode apreciar devidamente o papel extraordinário desempenhado por um homem, cuja acção não foi ainda julgada devidamente. Refiro-me ao arcebispo João Peculiar de Braga, que suportou sobre os seus ombros, durante quatro decénios, quase todas as negociações com Roma. Se Portugal conseguiu por fim, graças ao reconhecimento por parte da cúria, assegurar a sua, independência política e autonomia eclesiástica em relação aos estados vizinhos, isso pode considerar-se obra sua. Na história do papado estas questões podem parecer-nos duma importância secundária. Mas a maneira como a cúria se apodera daquele pequeno e remoto país, fazendo-o entrar na sua esfera de influência, não obstante opor-se algumas vezes às suas aspirações territoriais, isso ó extraordinariamente característico e significativo para o conhecimento da política papal». In Carl Erdmann, O Papado e Portugal no primeiro século da História Portuguesa, Universidade de Coimbra, Instituto Alemão da Universidade de Coimbra, Coimbra Editora, 1935.

(Continua)
Cortesia de Separata do Boletim nº V do Instituto Alemão/JDACT