terça-feira, 28 de agosto de 2012

Conferências nos Encontros de História Luso-Chinesa. Portugal e a China. João Paulo Costa. «A missão do Japão era constituída por um grupo numeroso de religiosos a quem Roma estimulava a formulação de opiniões pessoais. Além disso, viviam longe das sedes dos poderes político e eclesiástico do Oriente português, sem a protecção de forças militares europeias»


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«Foi nesta conjuntura que Alexandre Valignano, então visitador da colónia da Índia, iniciou a sua segunda visita ao Japão em Agosto de 1590. Aquando da sua primeira passagem pelo arquipélago (1579-1582), o napolitano sancionara as experiências realizadas pelos primeiros missionários.
Estes, sob a chefia do superior Cosme Torres (1551-1570) e a inspiração, entre outros, de Gaspar Vilela, Luís Fróis, Luís Almeida e Organtino Gnecchi-Soldo, haviam desenvolvido várias práticas inovadoras, nomeadamente a admissão de clero nativo, o recurso ao comércio para financiar a missão e a acomodação a normas de conduta características da civilização nipónica. Depois, na sua correspondência para a Europa, Valignano tinha acentuado o carácter ‘diferentíssimo’ do Japão relativamente aos demais povos asiáticos, o que justificava a sua aceitação do modelo da inculturação.
Em 1590, Valignano enfrentava um novo desafio, procurar assegurar a sobrevivência e o desenvolvimento da cristandade nipónica. Urgia, por isso, tentar aplacar a ira de Hideyoshi, ao mesmo tempo que era necessário pacificar internamente a missão. O número de religiosos crescera sem que houvesse unanimidade em torno do modelo evangelizador adoptado anteriormente pelo visitador; sucediam-se as desavenças entre os missionários, que tinham opiniões díspares sobre o modo como deviam reagir à política anti-cristã de Hideyoshi, assim como sobre a eficácia de se terem admitido dezenas de irmãos japoneses. Finalmente, adivinhava-se já nova matéria polémica devido à evidente ambição dos frades de Manila em desrespeitarem o monopólio jesuítico no Japão. Também neste caso havia várias opiniões, pois alguns religiosos, sobretudo espanhóis, não criticavam veementemente os desejos dos clérigos do Patronato.
Estamos em crer que estas divergências eram inevitáveis: a missão do Japão era constituída por um grupo numeroso de religiosos a quem Roma estimulava a formulação de opiniões pessoais; além disso, viviam longe das sedes dos poderes político e eclesiástico do Oriente português, sem a protecção de forças militares europeias, recorriam a modelos de missionação que fugiam, nalguns aspectos, à norma tradicional e trabalhavam numa das raras zonas do mundo em que os interesses dos impérios ibéricos colidiam.
Apresentando-se como embaixador do vice-rei da Índia, Valignano pôde ser recebido cordialmente por Hideyoshi, tendo então conseguido aliviar a pressão a que as comunidades cristãs estavam sujeitas. Reuniu, além disso, a Congregação da vice-província do Japão, em que foram analisados os problemas que dividiam os missionários. O Visitador tomou então decisões importantes, embora fosse incapaz de recolher a unanimidade em torno das suas opções. Ainda assim, decidiu criar no Extremo Oriente um novo colégio vocacionado para a preparação de futuros sacerdotes e igualmente habilitado a proporcionar formação em Teologia aos religiosos mais aptos.
A conjuntura política nipónica e a necessidade de dar aos futuros presbíteros japoneses uma maior familiaridade com a cultura ocidental fez recair a localização do colégio em Macau, onde, aliás, os jesuítas já desenvolviam actividades de ensino». In Portugal e a China, Conferências nos Encontros de História Luso-Chinesa, João Paulo O. Costa, Fundação Oriente, Convento da Arrábida, 2000, ISBN 972-785-033-2.


Cortesia de F. Oriente/JDACT