«É nossa intenção, no presente
artigo, elaborar um levantamento das publicações portuguesas de índole
filosófica, na convicção de que um estudo desta natureza se reveste da maior
importância para a actividade dos nossos investigadores e estudiosos. Na
realidade, o panorama intelectual português conheceu, desde o inicio do século
XVIII, um numeroso conjunto de iniciativas neste domínio, expressão de uma
vitalidade muitas vezes ignorada e que se pretende, deste modo, pôr a
descoberto. Muitos dos títulos aqui incluídos, possivelmente devido à sua
efémera duração, são quase desconhecidos dos investigadores e, no entanto,
neles colaboraram os mais relevantes nomes da inteligência filosófica
portuguesa, como não será difícil verificar pela leitura das páginas que se
seguem. Aqui se incluem títulos de publicações estritamente filosóficas a par
de outros que se revestem de um carácter mais amplo no domínio da cultura, mas
nos quais a produção filosófica está também presente, indicando-se, sempre que
possível, o nome dos respectivos colaboradores. Trata-se, por isso, de um
trabalho de âmbito essencialmente bibliográfico, mas que adquire a dimensão de
um suporte que nos parece de utilidade para a investigação no campo da
filosofia em Portugal.
Pode considerar-se que uma das
primeiras revistas filosóficas em Portugal, com carácter periódico, foi o Jornal Enciclopédico, editado
na segunda metade do século XVIII, em plena vigência das Luzes. Dando expressão ao conceito iluminista de filosofia,
entendida como meio omnicompreensivo, e ao pendor enciclopédico da cultura da
época, foi uma importante tribuna de divulgação das conquistas culturais dos Modernos em todos os domínios do
saber, embora com maior incidência nos problemas de carácter científico e
económico, sem contudo desprezar as áreas do Direito e da Filosofia Moral. Este
mesmo afã de divulgação das conquistas do progresso civilizacional, no âmbito
da cultura e do saber, marcou algumas das mais importantes publicações
periódicas da centúria seguinte, como é o caso do Panorama, Jornal
Literário e Instructivo da Sociedade
Propagadora dos Conhecimentos Úteis, editado semanalmente em Lisboa, a
partir de 1837. A referida sociedade
era presidida por Anselmo José Bramcaamp, sendo o jornal dirigido por M.A.
Viana Pedra, João Baptista Massa e Félix da Costa Pinto. Perseguiu um ideal de
divulgação e, sobretudo, de instrução e pedagogismo social, que animou parte
considerável das mentes cultas do nosso século XIX, visando a ascensão do
indivíduo ao estado de cidadania.
O ano de 1852 ficou assinalado pelo início da publicação de dois títulos, um
de efémera existência e outro ainda em publicação. Referimo-nos, no primeiro
caso, à revista A Península,
editada no Porto entre 1852 e 1853, onde encontramos textos
de interesse filosófico da autoria de Amorim Viana, Ribeiro da Costa e Almeida
e de Custódio José Vieira. No segundo caso encontra-se a revista O Instituto, editada em
Coimbra de 1852 aos nossos dias,
contando com a colaboração filosófica, entre outros de Amorim Viana, Antero de
Quental, Faria e Maia, Manuel Emídio Garcia, Joaquim de Carvalho, Vieira de
Almeida, Sílvio Lima, Agostinho da Silva e Alexandre Fradique Morujão. Na
continuidade do periódico O Panorama
situou-se, embora em plano de bem maior profundidade e importância a
revista A Renascença, órgão dos
trabalhos da geração moderna (1878-79), editada na
cidade do Porto e dirigida por Joaquim de Araújo, na qual viriam a colaborar os
mais destacados membros da Geração de 70, como Teófilo Braga,
F. Adolfo Coelho, Ramalho Ortigão, Antero de Quental, Eça de Queirós, contando
ainda com nomes como os de Amorim Viana e Alexandre Herculano. O objectivo
declarado da Renascença era,
escreve-se no manifesto de apresentação, dinamizar
o movimento de renovação iniciado com a carta Bom senso e bom gosto, à luz do que se considerava ser
o espírito filosófico moderno, submetendo-lhe os domínios da poesia, da história,
da crítica literária, da antropologia e da linguística.
Se o objectivo do Panorama era, como aí se lê, o o
copioso derramamento de conhecimentos úteis, a Renascença vai mais longe
- quer representar a época que vamos atravessando, com todas as suas tendências
e com todas as suas aspirações".
Não esteve distante deste o
objectivo a revista O Ocidente
(1878-1914),
que soube aliar os propósitos da divulgação científica aos da discussão filosófica
e cultural, nela colaborando, desde o seu início, Antero de Quental, Oliveira
Martins, Guilherme de Azevedo e outros vultos da Geração de 70.
Atendendo, por seu turno, ao domínio do positivismo no ensino
universitário e à sua receptividade em sectores importantes da nossa Inteligência,
não será de estranhar a edição de algumas revistas destinadas a difundir a
filosofia positivista. Importa destacar, entre as mais importantes, O Pantheon, revista
quinzenal de ciências e letras aparecida na cidade do Porto em 1880. Foi dirigida por J. Leite de
Vasconcellos e Montalverne de Sequeira, e da lista dos colaboradores
permanentes constam, entre outros, Teófilo Braga, Teixeira Bastos, Guerra
Junqueiro, F. Adolfo Coelho e Martins Sarmento. Fundada no seio da classe
académica portuense, foi seu propósito acompanhar
o movimento intelectual moderno à luz do que se considerava ser o ideal
de positividade. Na sequência do Pantheon surgirá, em 1882, a revista O Positivismo, dirigida por Teófilo Braga e Júlio de
Matos, contando entre os seus colaboradores com Teixeira Bastos, Consiglieri
Pedroso e Horácio Ferrari». In Pedro Calafate, Estado da Questão, Revistas
Filosóficas em Portugal, Philosophia 2, Lisboa, 1993.