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«Luís
nasceu em Lisboa, no Paço das Necessidades, a 31 de Outubro de 1838. A infância
decorreu na família numerosa de sete irmãos, cujos laços eram muito fortes. O infante
Luís, Lipipi, como era tratado
no seio familiar, mostrou-se, desde cedo, completamente diferente de seu irmão Pedro.
Como não seria rei, a sua educação foi sendo um pouco menos severa que a do príncipe
herdeiro e os companheiros com quem foi crescendo também não eram a melhor escolha.
O próprio Fernando incentivava a procura de prazeres desordenados, nos quais
se incluía um grande apetite, que acompanhará Luís Iao longo da sua vida. O contraste
entre os irmãos foi-se acentuando cada vez mais e Pedro era extremamente duro nas
palavras que usava para referir-se a Lipipi:
indolente, com uma educação literária inadequada, arrogante, porque o puseram num
barco português em vez de ser subalterno num barco inglês.
O
tempo passado na Marinha influenciou o jovem infante. Os oficiais da Marinha eram
conhecidos como homens galantes que despertavam paixões em todos os portos onde
atracavam e que causavam, por vezes, problemas graves. Tal foi o caso, relatado
pelo marquês do Lavradio, passado na Madeira, onde o conde de Óbidos se enamorou
de uma noiva, que cancelou o casamento e que anos mais tarde, casada com um outro
homem e já depois da morte do conde de Óbidos, confessava ainda ter saudades dele.
O infante Luís seguia decerto a regra comportamental dos seus companheiros e a
entrada na Marinha correspondeu, ao que tudo indica, às suas primeiras experiências
sexuais. A liberdade que se vivia era demasiada, sobretudo para um infante que nos
primeiros anos de vida teve de viver na corte e comportar-se adequadamente. Não
restam dúvidas de que Luís gostava da vida que levava, em que eram indissociáveis
o vinho e as mulheres: mas todo o marinheiro deve saber duas coisas na
perfeição: comportar-se com as mulheres (quer dizer f...) e beber sem se embebedar.
Não sei porquê, mas está na natureza das coisas. Também na governação a diferença
entre os dois irmãos se vai notar. Segundo Vital Fonte, o infante Luís era muito
agradável e liberal. Ao contrário do irmão Pedro não remava contra a maré,
antes procurava o favor dos ventos, que para isso era um grande marinheiro. E soube
conduzir bem o barco da governação. Foi de completa bonança o seu reinado.
O casamento
Aclamado
rei aos 23 anos de idade, depois da tragédia que vitimou o seu irmão, era urgente
encontrar noiva e assegurar descendência. Recomeçam as danças matrimoniais: duas
princesas da casa de Saxe-Coburgo, uma de Hohenzollern, duas de Orleães e uma de
Sabóia. Luís I prefere uma das filhas da rainha Vitória, que já conhecera em viagem
a Londres; mas a rainha recusa pela diferença de religiões, e recomenda dona Teresa,
filha do arquiduque Alberto da Áustria. O rei português aceita a ideia e pede-a
em casamento, mas, mais uma vez, vê a proposta recusada: a pretendida ainda não
tem 18 anos, falta concluir a educação e é muito apegada à mãe e à família.
A 18
de Junho de 1862, o marquês de Sousa, amigo íntimo de Luís I, pede a Vítor Manuel
a mão da sua filha, dona Maria Pia, e o rei do Piemonte aceita. As críticas internacionais
e internas são muitas, sendo o factor mais criticado a idade da noiva, que contava
apenas 15 anos. Mas Luís I demonstra-se já verdadeiramente enamorado do retrato,
que diz ter sempre à sua frente, e as cartas para a noiva são repletas de ternura
e esperanças futuras. Tudo indicava que o objectivo era manter o ideal de família
em que fora criado: soube que amas muito a música e alegro-me sinceramente com isso.
Também eu amo muito a música e além disso pratico-a mesmo um pouco tocando violoncelo.
Estou certo que quando estivermos em Lisboa as nossas noites serão noites em
que a verdadeira felicidade em família se mostrará em toda a beleza da
intimidade. As cartas para a noiva sucedem-se a um ritmo vertiginoso,
acentuando-se em cada missiva as emoções de noivo perdidamente apaixonado, que já
não dorme por ficar a pensar na amada. No entanto, as cartas de Maria revelam ainda
alguma frieza e distância e não são tão frequentes quanto o amante, que jura amor
até à morte, desejaria... O casamento por procuração realizou-se em Turim, a 27
de Setembro de 1862, e a rainha chegou a Lisboa a 5 de Outubro do mesmo ano. As
festas multiplicaram-se: teatros, circo, touradas, iluminações, as ruas
repletas de gente que tinha vindo um pouco de todo o país. Depois da tempestade
das tragédias esperava-se a bonança de um casamento feliz e cheio de crianças. Os
primeiros anos de casamento são marcados por uma forte paixão entre Luís e Maria.
A cumplicidade em tudo, incluindo na intimidade, não fazia prever as nuvens
negras que viriam a ensombrar o futuro...» In Paula Lourenço (coord), Ana Cristina
Pereira, Joana Troni, Amantes dos Reis de Portugal, 2008, Esfera dos Livros,
Lisboa, 2011, ISBN 978-989-626-136-8.
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