Um dos bons da cidade
«(…) Apesar de a capital se encontrar, a partir desse momento,
totalmente dominada pelos revoltosos, o castelo era ainda controlado pelos
partidários da rainha, em particular pelo alcaide no lugar de João Afonso Telo,
Martim Afonso Valente que, perante este quadro, decidiu reforçar a defesa da
fortaleza mobilizando para isso, em primeiro lugar, os vassalos do Telo. Assim,
em finais de Dezembro de 1383,
Afonso Anes Nogueira transmite a Antão
Vasques, tal como o fizera já a Estêvão Vasques Filipe e a Afonso Furtado,
instruções para que se incorporasse de imediato na defesa do castelo. Porém,
tal como nos outros dois casos, Afonso Anes foi novamente confrontado com uma
clara recusa, pois como afirma Fernão Lopes, nesse momento Antão Vasques era já um dos discípulos
escondidos do Mestre, ou seja, tinha já abraçado a causa dos rebeldes. Mas
a rendição do castelo da cidade não significava o final dos problemas. De
facto, o maior de todos era o exército que acabara de atravessar a fronteira na
região da Guarda, que engrossava de dia para dia e cujo destino era a capital.
A liderá-lo encontrava-se o rei de Castela, Juan I, que vinha reclamar o cumprimento
do Tratado de Salvaterra, ou seja,
que o trono português fosse entregue a sua mulher D. Beatriz, filha do rei Fernando.
Porém, as ameaças vinham de mais lados, designadamente da fronteira alentejana,
junto da qual se concentravam cada vez mais efectivos prontos para invadir
Portugal. E foi para esta região que foi decidido nomear como fronteiro-mor o
jovem Nuno Álvares Pereira que, em Dezembro
de 1383, se juntara aos revoltosos.
Ao serviço de Nuno Álvares
Na sequência desta nomeação, Antão
Vasques será um dos que fará parte do exército atribuído ao fronteiro-mor,
juntamente com o seu irmão João Vasques, Pedro Anes Lobato, Rui Cravo,
Afonso Peres Charneca, Vasco Leitão, João Álvares, Manuel Pessanha, Álvaro Rego,
João Lobato, Estêvão Anes Borboleta, Lopo Afonso e Lourenço Afonso Água,
Lourenço Martins Pratas, Diogo Durães e Diogo Domingues, entre muitos outros,
num total de 40 escudeiros dos bons que havia na cidade e a que se
juntaram ainda outros combatentes oriundos de Évora e de Beja. Talvez o facto
de Antão Vasques ter sido escolhido
para essa missão possa ser entendido como um sinal de que teria já alguma
experiência militar, adquirida, muito provavelmente, durante as Guerras
Fernandinas, sendo igualmente possível que contasse mesmo com uma pequena
mesnada que o terá acompanhado nessa aventura ao serviço de Nuno Álvares. As forças do agora
fronteiro-mor na comarca do Entre-Tejo e Guadiana cruzam o Tejo em diversos
navios e desembarcam em Almada, de onde seguem até Coina, onde ouvem um último
discurso de despedida do Mestre de Avis, que os acompanhara até aí, cujo
objectivo era, não só o de motivar esses combatentes, mas também o de reforçar
a autoridade do jovem Nuno Álvares. As
fontes são silenciosas a respeito do papel desempenhado por Antão Vasques nos episódios militares
que se seguiram. Não temos, no entanto, dúvidas de que terá participado na Batalha
de Atoleiros, ferida nas imediações da vila alentejana de Fronteira, no dia 6 de Abril, a primeira
de muitas mais vitórias militares das forças lideradas por Nuno Álvares, que se estreou na utilização de uma táctica que
consistia numa formação de natureza defensiva composta exclusivamente por
forças apeadas. Entre os que lutaram dessa forma, tão pouco usual até aí nos teatros
de operações da Península Ibérica, encontrava-se, naturalmente, Antão Vasques. Com efeito, a
circunstância de só em Maio voltar a surgir nas fontes parece apontar para que
tenha permanecido no Alentejo ao serviço Nuno
Álvares, pelo menos, até, finais de Abril ou inícios de Maio de 1384. Nesse sentido, é possível que tenha
também participado na conquista de Arronches
e na ocupação de Alegrete, que
tiveram lugar nos dias que se seguiram àquela batalha, mas antes do final do
mês de Abril.
Foi precisamente então, na sequência destes bem-sucedidos episódios, que
Nuno Álvares desmobilizou o grosso
das suas forças, ocasião aproveitada por Antão
Vasques para regressar a Lisboa, muito provavelmente em busca de acção. De
facto, só mesmo a vontade de lutar para o impelir de novo para a capital do
reino, já que era para aí, não havia dúvidas a esse respeito, que confluíam
também os exércitos e a frota de Juan I de Castela». In Miguel Gomes Martins,
Guerreiros Medievais Portugueses, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2013, ISBN
978-989-626-486-4.
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