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Somerset
rural. Inglaterra 1813
«Não
a posso ajudar lady Eleanor. Anne Paxton Smythe olhou para a elegante senhora da
nobreza sentada diante de si, na esperança de parecer cortês mas firme. Tentou um
sorriso sereno, mas mal conseguia manter-se sossegada. Era loucura recusar o pedido
de uma aristocrata e não se impediu de perguntar a si mesma se não estaria a colocar-se
em perigo, se tudo o que conseguira fosse destruído simplesmente porque marcara
posição. Anne sentira-se tomada pela preocupação assim que a carruagem puxada
por quatro cavalos da exaltada senhora subira ruidosamente o caminho que conduzia
à sua porta. Percebera que nada de bom resultaria daquela visita e, depois de ouvir
o ultrajante pedido da sua visitante, teve a certeza de que a sua intuição estava
certa. Estava fora de questão ajudá-la. Ao menos, oiça o que tenho para lhe dizer,
insistiu lady Eleanor em tom adulador. Não me fará mudar de ideias. A brisa
quente de Junho fazia balançar as cortinas e por uma janela aberta entrou a frescura
de risos femininos. As vozes eram alegres e descontraídas, conjurando imagens de
noites estivais, de amantes, intriga e romance. Anne mexeu-se no seu lugar, inquieta,
desejosa de que a sua visita não tivesse ouvido, mas era diffci1 ignorar os sons
vindos do exterior. Com o passar dos anos, tinha-se acostumado a verbalizações inusitadas
e ouvira tantas expressões estranhas que já não ligava a uma ocasional explosão
de prazer. No entanto, isso poderia parecer peculiar e desconcertante a outras pessoas.
Verdadeiramente lúbrico.
Corou.
Como estava a dizer... Os risinhos fizeram-se ouvir novamente, muito perto, o que
a fez levantar o olhar para ver uma mulher nua correr no passeio exterior em bicos
de pés. Tinha os cabelos caídos, como uma ninfa da floresta, e os seios voluptuosos
expostos ao sol da tarde. Uma segunda mulher, tão nua como a primeira, correu atrás
dela. Extremamente preocupada, Anne olhou de relance para lady Eleanor, mas a cadeira
desta estava numa posição que não lhe teria permitido ver nada. Deus fosse louvado!
Não teria como explicar aquele espectáculo e a última coisa de que precisava era
de provocar um desmaio da sua empertigada visita. Levantou-se, um autêntico
modelo de calma. Dá-me licença? Mas, acabei de chegar, e... Não demoro, cortou
Anne, dirigindo-se para a porta antes que lady Eleanor pudesse ordenar-lhe que ficasse.
Plácida e graciosa, saiu da sala, correndo para a porta das traseiras assim que
se viu no corredor. A sua amiga e ajudante, Kate Turner, estava a aparar flores
no jardim, alheia à brincadeira menos própria. Depois de Anne apontar várias
vezes de modo frenético, Kate assentiu com a cabeça e desceu o caminho ladeado de
arbustos para confrontar o indisciplinado duo.
Não eram
permitidos divertimentos nus no jardim! Verifica o cesto de piquenique delas, sussurrou
Anne. Se encontrares vinho, já chega. Confisca-o! Também não eram permitidas bebidas
inebriantes. Apesar de as suas patronas afirmarem que as bebidas alcoólicas
ajudavam à diversão, Anne não podia permitir o seu consumo. Muitas deixavam-se
levar pelo revigorar que experimentavam quando se banhavam na gruta das nascentes
de água quente, o que a obrigava a manter rédea curta em todo o tipo de comportamentos,
não fosse a diversão descontrolar-se. Os rumores sobre a qualidade das águas já
eram exagerados, que eram misteriosas e mágicas, e não precisava de encorajar mais
ofuscação ou distorção. Voltou para dentro, perguntando-se se Kate teria a presença
de espírito para apreender a bebida. Kate era eficiente, pragmática e dotada para
muitas tarefas, mas não era perita em lidar com as clientes abastadas de Anne. Kate
afastava-se de snobes e figuras da sociedade, enquanto Anne era obrigada a recebê-los
e a conviver com todas, se queria ter comida na mesa». In Cheryl Holt, Mais do que
Sedução, 2004, tradução de Paulo Moreira, Quinta Essência, 2015, ISBN
978-989-1-319-3.
Cortesia
de QEssência/JDACT