Cortesia
de wikipedia e jdact
Jerusalém
«(…)
Uma ilha solitária e serena no meio do caos, era uma das poucas mulheres na
multidão..., mas não era isso que a tornava tão diferente. Era o seu comportamento,
uma atitude imponente, que a distinguia como uma rainha, apesar da camada de
poeira que lhe cobria as mãos e os pés. Estava um pouco desgrenhada, os cabelos
castanho-avermelhados lustrosos presos parcialmente por baixo de um véu
escarlate, que cobria a metade do rosto. Maureen compreendeu, num impulso
instintivo, que precisava alcançar essa mulher, precisava ligar-lhe a ela,
tocá-la, falar com ela. Mas a multidão agitada a impedia, e ela se deslocava
nos movimentos em câmera-lenta de um sonho. Enquanto continuava a avançar com
dificuldade na direcção da mulher, Maureen ficou impressionada com a beleza
angustiada do seu rosto. Tinha feições delicadas e refinadas. Mas foram os
olhos que continuaram a assediar Maureen muito depois que a visão acabou. Eram
olhos enormes e brilhantes, com lágrimas não derramadas, em algum ponto no
espectro de cores entre o âmbar e o verde, com uma luminosidade castanho-clara
extraordinária que reflectia uma infinita sabedoria e uma tristeza insuportável,
numa mistura comovente. Os olhos da mulher, profundos e envolventes,
encontraram-se com os de Maureen por um momento breve e interminável..., e
aqueles olhos surpreendentes transmitiram uma súplica de total e absoluto
desespero.
V. tem de me ajudar.
Maureen sabia que a súplica lhe
era dirigida. Ficou em transe, paralisada, enquanto a mulher a fitava. O
momento foi rompido quando a mulher baixou os olhos para uma menina que a
puxava pela mão, com urgência. A criança também a fitou, com aqueles enormes olhos
claros que herdara da mãe. Por trás dela havia um menino, mais velho e com
olhos mais escuros que a menina, mas obviamente filho daquela mulher. Maureen
compreendeu, naquele momento inexplicável, que era a única pessoa que podia
ajudar a estranha majestosa e sofredora e seus filhos. Um fluxo de intensa
confusão, acompanhado por alguma coisa muito parecida com pesar, sucedeu-se a
essa compreensão. Depois, a multidão tornou a arremeter, engolfando Maureen num
mar de suor e desespero.
Maureen
piscou várias vezes. Fechou os olhos com força, por alguns segundos. Sacudiu a
cabeça vigorosamente, para clarear a visão, sem saber a princípio onde se
encontrava. Um olhar para o jeans, a mochila de microfibra e o ténis Nike
proporcionou-lhe a garantia de que se encontrava à beira do século XXI. Ao seu
redor, a agitação da Cidade Velha também era intensa, mas as pessoas vestiam
roupas contemporâneas e os sons agora eram diferentes. A rádio Jordão transmitia
uma canção americana, seria Losing My Religion, do REM?, de uma loja no outro
lado da rua. Um adolescente palestino tamborilava o ritmo no balcão. Sorriu
para ela, sem perder a marcação. Maureen levantou-se e tentou livrar-se da
visão..., se é que fora mesmo isso. Não tinha certeza do que fora nem podia
permitir pensar a respeito. A sua estada em Jerusalém era curta e tinha dois
mil anos de cenários para visitar. Accionou a disciplina de jornalista e a
experiência da vida inteira de controle das suas emoções. Tratou de arquivar a
visão em assuntos a serem pesquisados, para análise posterior, e recomeçou a andar».
In
Kathleen McGowan, O Segredo do Anel, Editora Rocco, 2006, ISBN 853-252-096-0.
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de ERocco/JDACT