domingo, 9 de junho de 2019

O Segredo do Anel. Kathleen McGowan. «Maureen piscou várias vezes. Fechou os olhos com força, por alguns segundos. Sacudiu a cabeça vigorosamente, para clarear a visão, sem saber a princípio onde se encontrava»

Cortesia de wikipedia e jdact

Jerusalém
«(…) Uma ilha solitária e serena no meio do caos, era uma das poucas mulheres na multidão..., mas não era isso que a tornava tão diferente. Era o seu comportamento, uma atitude imponente, que a distinguia como uma rainha, apesar da camada de poeira que lhe cobria as mãos e os pés. Estava um pouco desgrenhada, os cabelos castanho-avermelhados lustrosos presos parcialmente por baixo de um véu escarlate, que cobria a metade do rosto. Maureen compreendeu, num impulso instintivo, que precisava alcançar essa mulher, precisava ligar-lhe a ela, tocá-la, falar com ela. Mas a multidão agitada a impedia, e ela se deslocava nos movimentos em câmera-lenta de um sonho. Enquanto continuava a avançar com dificuldade na direcção da mulher, Maureen ficou impressionada com a beleza angustiada do seu rosto. Tinha feições delicadas e refinadas. Mas foram os olhos que continuaram a assediar Maureen muito depois que a visão acabou. Eram olhos enormes e brilhantes, com lágrimas não derramadas, em algum ponto no espectro de cores entre o âmbar e o verde, com uma luminosidade castanho-clara extraordinária que reflectia uma infinita sabedoria e uma tristeza insuportável, numa mistura comovente. Os olhos da mulher, profundos e envolventes, encontraram-se com os de Maureen por um momento breve e interminável..., e aqueles olhos surpreendentes transmitiram uma súplica de total e absoluto desespero.
V. tem de me ajudar.
Maureen sabia que a súplica lhe era dirigida. Ficou em transe, paralisada, enquanto a mulher a fitava. O momento foi rompido quando a mulher baixou os olhos para uma menina que a puxava pela mão, com urgência. A criança também a fitou, com aqueles enormes olhos claros que herdara da mãe. Por trás dela havia um menino, mais velho e com olhos mais escuros que a menina, mas obviamente filho daquela mulher. Maureen compreendeu, naquele momento inexplicável, que era a única pessoa que podia ajudar a estranha majestosa e sofredora e seus filhos. Um fluxo de intensa confusão, acompanhado por alguma coisa muito parecida com pesar, sucedeu-se a essa compreensão. Depois, a multidão tornou a arremeter, engolfando Maureen num mar de suor e desespero.

Maureen piscou várias vezes. Fechou os olhos com força, por alguns segundos. Sacudiu a cabeça vigorosamente, para clarear a visão, sem saber a princípio onde se encontrava. Um olhar para o jeans, a mochila de microfibra e o ténis Nike proporcionou-lhe a garantia de que se encontrava à beira do século XXI. Ao seu redor, a agitação da Cidade Velha também era intensa, mas as pessoas vestiam roupas contemporâneas e os sons agora eram diferentes. A rádio Jordão transmitia uma canção americana, seria Losing My Religion, do REM?, de uma loja no outro lado da rua. Um adolescente palestino tamborilava o ritmo no balcão. Sorriu para ela, sem perder a marcação. Maureen levantou-se e tentou livrar-se da visão..., se é que fora mesmo isso. Não tinha certeza do que fora nem podia permitir pensar a respeito. A sua estada em Jerusalém era curta e tinha dois mil anos de cenários para visitar. Accionou a disciplina de jornalista e a experiência da vida inteira de controle das suas emoções. Tratou de arquivar a visão em assuntos a serem pesquisados, para análise posterior, e recomeçou a andar». In Kathleen McGowan, O Segredo do Anel, Editora Rocco, 2006, ISBN 853-252-096-0.

Cortesia de ERocco/JDACT