terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Cartas de Soror Mariana Alcoforado. Das Lettres Portugaises. Leonel Borrela. «… edições bilingues e de origem portuguesa, prova de que, aos investigadores franceses, a nossa crítica, mesmo que significativa, não é para levar a sério. Se fosse traduzida para a língua francesa uma obra como a de António Belard da Fonseca, seria suficiente para clarificar melhor a autenticidade feminina e portuguesa das Cartas»

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Análise quantitativa
Numa primeira análise pode dizer-se que a internacionalização das Cartas Portuguesas ajudou a consolidá-las e a criar-lhes uma imagem literária de singularidade reconhecida por leitores de todo o mundo. A primeira obra impressa das cinco Cartas é traduzida para a língua francesa e editada no ano de 1669, o mesmo acontecendo a todas as edições, reedições e contrafacções, dos séculos XVII e XVIII, as quais virão gradualmente misturando as cinco cartas com as sete de uma dama secular, mais as respostas dos amantes. O idioma francês domina este período das Luzes como se pode observar pela análise dos resultados estatísticos, embora nem todas as edições sejam de origem francesa, encontram-se assim distribuídas:
  • sete edições no século XVII, em Paris 1, Lyon 2, Amesterdão 2 e Haia 2; 
  • quatro edições no século XVIII, em Haia 3 e Paris 1.
No século XIX saem do prelo 23 edições em vários idiomas:
  • francês 4, 
  • castelhano 1, 
  • inglês 3, 
  • dinamarquês 1, 
  • holandês 1, 
  • português 11, 
  • bilingues luso-gálica 1 e franco-britanica 1.
É o século da nota Boissonade (1810), do desvendar do nome de Mariana Alcoforado, a provocar uma reviravolta no centro das atenções literárias europeias; e também uma benesse para Portugal, tão necessitado de valores que revitalizem a nação cada vez mais depauperada, e para as investigações de Luciano Cordeiro (1888; 1891). As edições em língua portuguesa, mais a bilingue, representam já 50% do total deste século, sobem a primeiro plano e vão influenciar, através da actuação de um diplomata e investigador inglês, Edgar Prestage, que traduz para a sua língua e torna conhecida, em Londres e Portland-Maine, parte do estudo de Soror Marianna de Cordeiro, ao mesmo tempo que motiva as edições de Copenhaga e de Amesterdão.
Do século XX aos nossos dias o aumento das publicações é significativo (93% do total da colecção). O conjunto dos séculos XVII, XVIII e XIX, com 34 exemplarcs (7% da colecção), é ainda maioritariamente francês (44%), logo seguido do português (32%), contudo a partir do século XX, aumenta consideravelmente o número de traduções, além das já mencionadas, para alemão, italiano, norueguês, grego, galego, catalão, japonês, checo, polaco e chinês. A posição da língua portuguesa cresce para 354 exemplares (73% do total da colecção), a francesa para 56 (11,5%), seguidas das inglesa (3,3%) e castelhana (3%) com respectivamente 16 e 15 exemplares cada uma e, para as línguas italiana (1,6%) e alemã (1,5%) com respectivamente 8 e 7 exemplares cada uma. Na língua japonesa editam-se 3 exemplares, na checa 2, reduzindo-se as restantes a 1 exemplar cada; salientam-se as 12 edições bilingues luso-gálicas (2,5%), sinal da partilha e troca de ideias, aliadas a uma certa competição, entre editoras e autores de ambos os países. Porém, a maioria dessas edições bilingues e de origem portuguesa, prova de que, aos investigadores franceses, a nossa crítica, mesmo que significativa, não é para levar a sério. Se fosse traduzida para a língua francesa uma obra como a de António Belard da Fonseca, seria suficiente para clarificar melhor a autenticidade feminina e portuguesa das Cartas.
Além do exponencial aumento das edições em língua portuguesa interessa conhecer, dadas as mudanças políticas operadas no país nos últimos quase duzentos anos, o comportamento de algumas das variáveis mais importantes. Por exemplo, enquanto para o Período Liberal se contabilizam 13 exemplares, para a I República alcançam-se 48, para o Estado Novo os 85, e a partir de Abril de 1974 atingem-se os 188, mais 20 sem data, perfazem 354 exemplares. Nem todas as publicações são livros, também há periódicos, assim 352 são livros e 132 são periódicos (a maioria publicados depois de Abril de 1974), mais 1 álbum de fotografias afecto ao livro de Luciano Cordeiro (1891). Portanto, para o Período Liberal, justificam-se os 13 exemplares, por um lado, pela emergente mas ainda fraca divulgação das Cartas, pelo analfabetismo reinante (atingia os 70% em 1910) e, quiçá, pela raridade e dificuldade de laboração nas principais cidades das oficinas tipográficas, pois a crise económica e financeira é grave, descontrolada, e afecta todos os sectores da sociedade; à medida que esses factores se invertem, aumenta o número de publicações de todo o género e, nos escassos dezasseis anos da I Republica, com uma Grande Guerra de permeio, chegam a 48 as edições, enquanto nos quarenta e oito anos do Estado Novo somente se editam 85 obras, proporcionalmente menos do que seria de esperar, pois a tipografia clássica da zincogravura e dos tipos dará gradualmente lugar ao moderno offset e a censura (palermas) política, num caso isolado, o das Três Marias e das suas Novas Cartas Portuguesas (1972-1974), não hostiliza as Lettres, nem Mariana, que aliás lhe interessa para engrandecer a fachada dos heróis nacionais; porém, com o 25 de Abril, a abolição da censura, a restauração das liberdades fundamentais a todos os cidadãos e a expansão de uma livre economia de mercado, crescem as empresas gráficas, as editoras e dá-se a mediatização rápida dos meios de informação, só assim se compreendendo os 188 exemplares publicados neste período com vantagem para os periódicos». In Leonel Borrela, Cartas de Soror Mariana Alcoforado, Edição 100Luz, 2007, ISBN 978-972-99886-7-7.

Cortesia de 100Luz/JDACT