sábado, 12 de janeiro de 2013

O Império Asiático Português, 1500-1700. Uma história política e económica. Sanjay Subrahmanyam. «O fundador desta dinastia, João I, chegou ao trono como “Mestre de Avis”; o seu filho, o infante Henrique, era “Mestre da Ordem de Cristo”, o seu irmão, o infante João, era “Mestre de Avis”, e o irmão mais novo, Fernando, de “Santiago”»


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«A assembleia, reunida em 1253 em Leiria, foi repetida em 1258 pelo rei Dinis, desta vez em Lisboa. Entre 1300 e 1500, Portugal assistiu então a uma luta complexa entre as tendências centralistas inerentes à monarquia e a resistência dos grupos privilegiados:
  • a Igreja, as Ordens Militares e a nobreza.
Quanto à primeira, a Coroa e a Igreja tinham-se já envolvido numa amarga disputa no século xXII. Tinham já ocorrido fortes desavenças entre aIgreja e o Estado durante o reinado de Afonso II, e Sancho II (r. 1223-46) foi deposto pelo papa, alegadamente devido à sua incapacidade e fraqueza. O seu irmão e sucessor Afonso III também entrou em conflitos com os arcebispos e outros elementos do alto clero, e tal prosseguiu durante o reinado de Dinis I. Mas o poder moral da Igreja e do clero, quer sobre as gentes citadinas, quer sobre o povo rural era considerável; e mesmo que detivessem propriedades consideráveis, estas bases económicas do seu poder não podiam ser atacadas frontalmente. O verdadeiro impulso do avanço da monarquia para a centralização era assim não dirigido para a Igreja mas para a nobreza terra-tenente. Em parte, a Coroa tentava estabilizar, limitar e definir este grupo: uma lei de Dinis I concedia ao rei o direito de, por exemplo, admitir novos membros na nobreza ao fazê-los cavaleiros.
Só após uma longa disputa é que se constituiu no século XV uma hierarquia definida de títulos. Em parte, isto parece ter sido uma imitação do que aconteceu em Inglaterra, e resultou provavelmente da influência da rainha D. Filipa de Lencastre, de origem inglesa, da Casa de Lencaster. Por ordem decrescente, a grande nobreza foi classificada nas categorias de duque, marquês, conde, visconde e barão. Estes homens, autorizados a usar o título de Dom (do latim dominus) formavam talvez um décimo do total da nobreza. Descendiam dos antigos ricos-homens, mesmo nem sempre sendo seus descendentes directos, pois também existiram no grupo alguns arrivistas, nos séculos XIV e XV. Simultaneamente, foi criada durante o reinado de Afonso V uma segunda hierarquia de nobres, que detinham posições que não eram necessariamente hereditárias. O objectivo de tal medida era evidentemente o de fortalecer o papel da Coroa, pois este último grupo era muito mais dependente da Coroa do que o primeiro.
Uma outra divisão paralela tomou igualmente forma ao longo do século XV, entre uma nobreza territorial terra-tenente e a chamada nobreza de corte ou nobreza de serviços. A palavra fidalgo, equivalente ao castelhano hidalgo e em voga desde os finais do século XIII, foi inicialmente utilizada para designar uma classe alargada de pessoas, muitas vezes não mais do que pela aristocracia rural em ascensão, mas no século XV era utilizada conjuntamente com outros títulos: cavaleiros-fidalgos, escudeiros-fidalgos, etc. É na nobreza de serviços, abrangendo quer os nobres que frequentavam de facto a corte, quer os que representavam localmente o rei, que iremos encontrar mais tarde o gume da expansão portuguesa na Ásia.
Quanto às Ordens Militares, a Coroa utilizou um conjunto de tácticas mais complexo. O Cisma do Papado, onde Portugal seguiu o papa de Roma, e Castela o de Avinhão, permitiu aos ramos portugueses das Ordens separarem-se dos respectivos centros castelhanos de origem. No caso da Ordem de Cristo, por já ser exclusivamente portuguesa, isto não teve qualquer significado. Porém, as Ordens de Avis e Santiago tornaram-se cada vez mais nacionais; os Mestrados destas Ordens foram entregues a membros da família real, como uma forma de os fazer reverter a favor da Coroa. Esta estratégia foi primeiramente levada a cabo pela Casa de Avis, que reinou de 1385 a 1580. O fundador desta dinastia, João I, chegou ao trono como Mestre de Avis; o seu filho, o infante Henrique, era Mestre da Ordem de Cristo, o seu irmão, o infante João, era Mestre de Avis, e o irmão mais novo, Fernando, de Santiago. Mais tarde, o rei Manuel I conseguiu que o papa o nomeasse Mestre destas três Ordens, o que se manteve durante o reinado do seu filho João III.
Para além do clero e da nobreza, a massa dos portugueses dos séculos XIV e XV era designada simplesmente pelo nome de povo. Os mais notáveis de entre estes, os cidadãos ou homens-bons, eram também por vezes apelidados de cavaleiros-vilãos,
embora isto não os incluísse na nobreza. Eram membros das classes serviçais, mesteres e mercadores, homens que na sua maior parte apoiaram João I aquando da sua luta pelo trono em 1383-1385». In Sanjay Subrahmanyam, O Império Asiático Português, 1500-1700, Uma História Política e Económica, Difel, Memória e Sociedade, 1995, Fundação Oriente, ISBN 972-29-0328-4.

Cortesia da Difel/JDACT