Resumo
«A proposta do presente estudo
terá como tema a análise das representações
sexuais e eróticas no espaço quotidiano identificado nas fontes iconográficas e escritas encontradas em sítio arqueológico no Antigo Egipto. Para se
compreender o ideal de sexualidade que existia no Egipto
antigo é necessário o entendimento de aspectos culturais da sociedade egípcia
na antiguidade. Como a religião interferia directamente
no quotidiano desse povo, desde a realeza até
à vida difícil do simples camponês. Para este
estudo é preciso a análise e aplicação destes
conceitos como quotidiano, espaço, religião, representação e sexualidade
sobre as fontes».
«O acto sexual para os antigos
egípcios não era apenas um momento de prazer, mas sim a acção criadora, ou da
origem da vida. Semelhante a outras religiões antigas, na crença egípcia os
deuses faziam amor e sexo, sentiam o prazer sexual. Esse sentimento e o desejo
pelo sexo e fertilidade era um dos vários elos que ligavam estas divindades aos
homens que viviam na antiguidade egípcia. Ou seja, na cosmogonia egípcia alguns
deuses e os humanos foram criados através do acto sexual. De acordo com a
religião, logo após a morte o Ba, alma da múmia teria no além a mesma vivência da primeira vida,
desde que passasse pelo tribunal do Deus Osíris, por isso a tumba do
morto era decorada com objectos do quotidiano e passagens do Livro dos
Mortos, para que magicamente as acções representadas no seu túmulo
acontecessem. É para ter vida, ou nascer no além o morto teria que ter sua
fertilidade e os actos sexuais garantidos magicamente, como fez na sua tumba o
faraó Ramsés IX, em que a sua virilidade está representada pelos falos erectos
dos princípios masculinos, e a fertilidade representada pela mulher que é o
princípio feminino. A infertilidade no quotidiano egípcio era algo bastante
temido, tanto para os homens, quanto para as mulheres. Não ser fértil no Egipto
poderia levar a um divórcio ou anulação da união do casal. O homem não fértil
ou impotente era algo muito grave, pois este ao morrer dependeria de um filho
que perpetuasse sua memória, levando oferendas e fazendo ritos na sua tumba.
Com estes procedimentos o morto não teria seu nome esquecido, pois só assim ele
viveria no além, não teria o risco de passar por uma segunda morte, que era a
morte do esquecimento de sua memória. Percebemos que o sexo era fundamental
para os egípcios, indo muito mais que o prazer, era a acção causadora da
primeira via e asseguradora da segunda vida.
A prática sexual também fazia
parte das acções do panteão egípcio, foi uma das acções praticadas pelos
divinos para criar o mundo e os seres viventes. Na literatura faraónica
encontra-se um variado número de relatos, que tratam da cosmogonia egípcia
antiga, algumas delas estão carregadas de trechos eróticos.
Os deuses
As pesquisas revelam que houve durante todo o período faraónico, vários
centros religiosos, sendo que geralmente alguns predominavam sobre outros,
havendo até disputas e rivalidades entre essas regiões, pois a popularidade do
culto de determinado deus garantia o poder do sacerdote local. A consequência
da competição entre esses vários centros religiosos provocou uma variedade de
cosmogonias. Podemos destacar cinco principais interpretações para a origem do
mundo, dos deuses e da humanidade. Mas nos relatos que chegaram até nós, existe
um elo que os ligam, uma espécie de espinha
dorsal, em todas elas existiu um ser único causador da origem da vida.
Os deuses egípcios se utilizavam, como retratam as passagens de varias
compilações sagradas, do recurso do acto sexual para criarem outros seres, seja
ele pela masturbação ou pelo acto simples da cópula. Dentre todos os mitos que
tratavam do tema da origem do mundo, o que mais explicita o carácter da
sexualidade no meio da sociedade dos deuses, é a Enéade de Heliópolis.
Assim inicia o mito: Atum é o que veio
à existência, o que se masturbou em Heliópolis. O que empunhou o seu membro p’ra
criar o prazer. Com esse trecho, extraído dos textos das pirâmides,
podem ser feitas análises sobre vários aspectos da sexualidade dos deuses no
Antigo Egipto, a cosmogonia de Heliópolis é uma que nos fornece
informações sobre a origem dos deuses e do mundo. Sabemos que, segundo Engel,
para uma compreensão do quotidiano sexual de qualquer sociedade é importante
adquirir noções básicas de vários aspectos de sua cultura e religião. Em se
tratando da sociedade do Egipto Antigo, cultura e religião são completamente
ligadas. Pois, como observou Heródoto: … de todas as nações do mundo, os egípcios são os mais felizes, os
mais saudáveis e os mais religiosos». In Josiane Gomes Silva, Espaço das
representações sexuais e eróticas no Antigo Egipto, Revista de História
Espacialidades, volume 5, nº 4, 2012, ISSN 1984-817x.
Cortesia de R.Espacialidades/JDACT