domingo, 24 de agosto de 2014

A Bela Poesia. 1957 1971. Obra Poética. Salette Tavares. «Agora guardo! Não deixarei que tornem a matar cada ovo ao frio da noite… O que aqui estava não era o teu jeito de beijar, eram limões abertos nos meus lábios fechados em porta sobre o sono»

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Ao mar onde colhi o sal do meu tormento. In Salette

Soneto Pateta I
(…)
«Entorna,
deita,
verte
na minha orelha uma centelha vermelha.
Palavra,
vinho,
brasa,
procissão,
livre, secreta invasão
sob as nossas mãos em asa.

Agora guardo!
Não deixarei que tornem a matar
cada ovo ao frio da noite…
O que aqui estava não era
o teu jeito de beijar,
eram limões abertos nos meus lábios
fechados em porta sobre o sono,
eram laranjas olorosas passeadas
na branca união agreste de meus dentes.

Sabes porque perdeste
a mão?
Sabes porque guardaste
a luva?
Pássaro ausente,
coração.
Vê aqui a palavra
e o vazio
que lhe demos.
Não podemos.
Não fales,
olha,
bebe
o horizonte horizontal».
Poema de Salette Tavares, in ‘Espelho Cego

In Salette Tavares, Obra Poética, 1957-1971, Biblioteca de Autores Portugueses, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1992.

Cortesia de Aportugueses/JDACT