Do
Tempo das Pirâmides ao Tempo das Catedrais. Partir
à Aventura
«Neste
mundo que julgamos conhecer, há ainda grandes viagens por fazer. Principalmente
na Europa das catedrais e das igrejas da Idade Média. Durante vários anos,
partimos à descoberta da linguagem destes edifícios. Uma linguagem em forma de
esculturas, de capitéis, de modilhões, de gárgulas, de misericórdias de
estalas, de talha em madeira: em suma, uma linguagem simbólica que anima a partir
do interior a matéria trabalhada por artesãos conhecedores. Ninguém contesta a
poderosa originalidade da arte medieval e das suas criações. Ninguém a não ser
o próprio espírito da Idade Média, que estava mais interessado em transmitir
sabedoria do que originalidade. Se esta arte nos fala hoje de uma forma mágica,
é, porque é, a tradução de um pensamento simbólico. Um pensamento de que
perdemos a chave ou, pelo menos, julgamos tê-la perdido ,mas do qual
pressentimos a importância vital, apesar dos períodos de obscurantismo que
sucederam ao fim dos grandes estaleiros de obras das catedrais.
Existe
uma Idade Média desconhecida ou, antes, uma Idade Média do desconhecido. É esta
que vale a pena ser olhada mais de perto, porque este desconhecido está em nós
próprios, é a chave da nossa serenidade e do nosso equilíbrio. As esculturas
medievais têm um significado e apresentam um sentido. Oferecem-se à vista sem
contar, sem calcular. E, sobretudo, a sua mensagem não é do passado, nem jamais
será do passado, porque a Idade Média do símbolo não é a idade média do tempo.
A Idade
Média não existe
Se
existe um termo inoportuno na história da cultura europeia, só pode ser o de idade média. Média, no meio de dois
dos mais sombrios períodos da história: a decadência do Império Romano e o
período tão pouco apropriadamente classificado como Renascença. Estas duas idades é, que deveriam ser chamadas médias. Aquilo a que temos de continuar
a chamar Idade Média, para nos
conseguirmos compreender suscita nos nossos dias um vasto caudal de investigações.
Numerosos eruditos cortaram a Idade Média em fatias, umas para lhe examinar a
história, outras as instituições, outras os fenómenos sociais, etc. Conhecem-se
muitos detalhes da história das igrejas, das formas arquitecturais, do estilo
das esculturas. As escolas de interpretação digladiam-se para saber que oficina
provincial predominou em determinada época, investiga-se a influência exacta da
igreja, etc.
Tudo
isto contribui para que se reconstitua uma Idade Média à nossa imagem, com um
grande predomínio da política e da economia, as duas únicas virtudes teologais
de hoje em dia mas que para a Idade Média não eram valores primordiais. E é
óbvio que este tipo de reconstituição evita abordar as questões que, na nossa
opinião, são as fundamentais: o que
pretendiam transmitir os homens que criaram a civilização das catedrais e qual
a razão porque o fizeram?
A Idade
Média hoje em dia
As
catedrais continuam presentes sobre a terra do Ocidente. Presentes porque
tornam verdadeiramente actual a vida espiritual dos homens que as construíram.
Presentes porque entramos nelas para dialogar com o seu ser simbólico, com qualquer coisa que é, mais do que nós
próprios e que, no entanto, está no interior de nós mesmos. Olhos para ver,
ouvidos para ouvir: estes são os instrumentos
necessários para não sermos meros visitantes de edifícios mudos, mas antes homens da catedral, questionadores
infatigáveis, sedentos de Conhecimento. A Idade Média das catedrais é
actual, porque é, real. De facto, o que será mais real que esta vontade de
viver o espírito, soberbamente
incarnado na pedra? Esta constatação justifica, só por si, que se
procure a mensagem esculpida na pedra ou na madeira». In Christian Jacq, Le Message des
Constructeurs de Cathédrales, Éditions du Rocher, 1980, A Mensagens dos
Construtores de Catedrais, Instituto Piaget, Romance e Memória, Lisboa, 1999, ISBN
972-771-129-4.
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