Os Bastardos do Bolonhês
«(…) Por esse tempo, já Afonso III tinha três filhos do seu segundo
casamento: D. Branca, senhora de Montemor-o-Velho e Campo Maior, que será
abadessa de Lorvão
(e terá um filho da relação havida, segundo alguns genealogistas,
com Pedro Esteves Carpinteiro); Dinis, que sucederá ao trono; e Afonso,
que será senhor de Portalegre. Um quarto filho, Fernando, nascido em 1260, havia entretanto falecido. Depois
destes, nascerão mais três: D. Sancha (1264 -c. 13021; D. Maria (1264-1304); e
Vicente (n. 1268). Mas, além destes filhos legítimos, Afonso III tinha também
um rancho de bastardos, havidos dos seus amores, sucessivos ou mesmo
simultâneos, com diversas barregãs
régias. Foram elas muito numerosas, e nem todas deram filhos ao monarca, como
sucedeu com Teresa Mendes Seabra, freira no Mosteiro de Lorvão, ou com Sancha
Fernandes Delgadilha, que o Livro Velho designa por mula d’el rei.
Outra das amantes de Afonso III que não o presenteou com um descendente
foi Urraca Abril Lumiares, neta de D. Urraca Afonso, bastarda de Afonso Henriques
e, portanto, prima do Bolonhês. Mas,
se não lhe deu um filho, deu-lhe um genro: Pedro Anes Gago, com quem
Afonso III casou uma das suas filhas bastardas, também chamada Urraca Afonso. E
isto prova, como José Mattoso escreveu, que a vida sexual da corte se
caracterizava então por uma efectiva promiscuidade...
Vale a pena acrescentar que muitas destas barregãs
foram regiamente presenteadas pelo monarca, sendo as doações feitas por documentos
públicos e solenes, confirmados pelos
membros da cúria régia e pelos bispos do reino, numa clara demonstração de
que toda a corte se regozijava com a
virilidade do rei!
Dessa exuberante virilidade foram fruto nove bastardos. De mães
desconhecidas nasceram, pelo menos:
- Fernando Afonso, cavaleiro da Ordem do Templo;
- Gil Afonso, cavaleiro da mesma Ordem, que foi balio da Igreja de São Brás, em Lisboa;
- Rodrigo Afonso, prior de Santarém, nascido antes de 1258 e falecido antes de 12 de Maio de 1272;
- Urraca Afonso, primeira do nome, falecida a 4 de Novembro de 1281, no Mosteiro de Lorvão, onde permaneceu até à morte no estado de donzela. Ou, como diz o seu epitáfio, no claustro daquele mosteiro: Innocens puella & sina macula.
Outra virtuosa bastarda de Afonso III foi D. Leonor Afonso, primeira do
nome, havida em Elvira Esteves. Freira da Ordem Seráfica, no Mosteiro de Santa
Clara de Santarém, tomou em religião o nome de Helena de Santo António.
Nunca quis ser abadessa, preferindo ser enfermeira. E, de acordo com frei
Manuel Esperança autor da História Seráfica da Ordem dos Frades
Menores de S. Francisco na Província
de Portugal, terá vivido até
cerca de 1302, em grande santidade. Uma segunda filha ilegítima do Bolonhês recebeu o mesmo nome desta.
Morreu sem geração, mas casou duas vezes: primeiro com Estêvão Anes Sousa,
senhor de Pedrógão e tenente de Chaves, e depois com o conde, Gonçalo Garcia Sousa, senhor de Neiva e alferes-mor de
Afonso III, que era tio do primeiro marido de D. Leonor Afonso. E isto
demonstra, como José Mattoso sublinha, que as
regras canónicas dos impedimentos matrimoniais não preocupavam excessivamente
os membros da corte de Afonso III. Esta D. Leonor Afonso, que deixou os
seus bens ao Hospital de São João, em Lisboa, terá falecido a 26 de Fevereiro
de 1291.
O Bolonhês teve também um filho chamado Afonso Dinis, que, em muitos
nobiliários, aparece como filho do primeiro casamento do monarca. Mas, sabemos
hoje, por uma doação feita por Afonso III em 1278, que o bastardo nasceu de Maria (ou Marinha) Peres Enxara. Marina Petri Enxara, diz o documento. Afonso
Dinis, que terá sido criado por Martim Pedro, clérigo, casou com D. Maria Peres
Ribeira, bisneta da famosa Ribeirinha, que fora amante de Sancho I.
Sobre aquela veio a recair, por morte de todos os seus irmãos, a representação,
mas só a representação, da ilustre Casa de Sousa». In Isabel Lencastre, Bastardos
Reais, Os Filhos Ilegítimos dos Reis de Portugal, Oficina do Livro, 2012, ISBN
978-989-555-845-2.
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