quarta-feira, 1 de outubro de 2014

A Mensagem dos Construtores de Catedrais. Christian Jacq. «… a religião dos faraós fornecia um número considerável de modelos e de arquétipos para os símbolos cristãos. Veremos que a ‘Imago mundi’, a ‘imagem do mundo’, dos Mestres de Obras é, ao mesmo tempo, fiel às tradições antigas e profundamente originais»

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Do Tempo das Pirâmides ao Tempo das Catedrais. Partir à Aventura
Das pirâmides às catedrais
«(…) Considerar que apenas uma civilização tenha tido o privilégio de possuir a Sabedoria conduziria a um dogmatismo esclerosante. A Sabedoria foi expressa sob diversas formas ao longo de diversos períodos civilizacionais e em diferentes locais. Pensemos, por exemplo, na China antiga, na Índia dos Vedas, nas civilizações dos índios da América do Norte. Segundo os ensinamentos da Antiguidade, a Luz está em todos os lugares e em todos os tempos. A dificuldade, para as comunidades humanas, está em fazê-la existir em manifestá-la. Para conseguirmos perceber melhor esta Luz que nos é, tão necessária como a do sol, é necessário que concentremos a nossa atenção em momentos em que ela brilha intensa e majestosamente, como durante a Idade Média das catedrais. Esta Idade Média não é um ponto isolado na tradição simbólica do Ocidente, encerrando em si a sua própria explicação. Vai buscar uma das componentes fundamentais da sua inspiração às culturas da bacia mediterrânica e, consequentemente, à civilização-mãe do pensamento simbólico ocidental, o Egipto faraónico.
De facto, cada vez mais há a percepção de que a Grécia e Roma, que ocupavam totalmente a cena das humanidades, tiveram uma influência bem menor do que se afirmava. O imenso Egipto, com os seus quatro milénios de existência, o seu papel de centro do mundo e as suas prodigiosas faculdades de criação, permitir-nos-ão compreender numerosos elementos da simbólica medieval. Quando Santo Agostinho escreve: …aquilo a que agora se chama religião cristã já existia e, entre os Antigos, jamais faltou desde as origens da raça humana, emite um julgamento de facto extraordinário. Agostinho, dignitário cristão muito respeitado, perfeitamente ao corrente das influências gnósticas e esotéricas que formavam o âmago do cristianismo primitivo traído por Roma, pretendia deste modo legitimar a nova forma religiosa que defendia. A forma mais simples de o fazer era englobar as outas religiões, e principalmente a egípcia, com as suas inúmeras ramificações, no cristianismo.
Mas Agostinho mostrava também que o carácter temporal da nova religião cristã não tinha grande importância. O essencial era o seu conteúdo. E, nesse aspecto, a religião dos faraós fornecia um número considerável de modelos e de arquétipos para os símbolos cristãos. Quando estudarmos o pano de fundo simbólico da época medieval e das suas origens, veremos que a Imago mundi, a imagem do mundo, dos Mestres de Obras é, ao mesmo tempo, fiel às tradições antigas e profundamente originais.

Luzes do Médio Oriente e outras Fontes de Inspiração
A Idade Média, toda a Idade Média, porque não se pode fazer neste domínio uma discriminação segundo séculos ou meios-séculos, é dominada pela fé cristã..., ora essa fé judaico-cristã surge, como uma herança da antiguidade, do Oriente. No entanto, embora não sendo indígena, não tendo nascido em solo europeu, não deixa de sofrer a sua influência. Esta análise de Gustave Cohen, no seu livro La Grande Clarté du Moyen Age, resume a opinião dos medievalistas que foram obrigados a reconhecer a origem oriental, ou, mais exactamente, médio-oriental, dos temas iconográficos e literários presentes na civilização medieval. Se os filósofos proferiram por acaso verdades úteis à nossa fé, não devemos temer essas verdades, devemos mesmo arrancá-las para nosso uso aos seus ilegítimos detentores: este pensamento militante é da autoria de Santo Agostinho. Os Padres da Igreja, conscientes das riquezas pertencentes às comunidades religiosas mais antigas que a cristandade, não têm qualquer intenção de as rejeitar. Mesmo fanáticos, como Tertuliano, não deixam de referir com assombro o quanto a sua crença deve aos Antigos: o diabo imita até os traços principais dos nossos divinos mistério, fez com que se aplicassem ao culto dos ídolos os próprios ritos que empregamos para adorar a Cristo. Afirmação que se reveste, de facto, de uma descarada má-fé! Mas que é também o reconhecimento inevitável de uma evidência: Cristo é um homem do Médio Oriente e os seus ensinamentos foram escutados em lugares em que se misturavam as influências dos grandes impérios da antiguidade não clássica. O Médio Oriente é fonte de luz, mesmo para os cristãos. Os artesãos da Idade Média ocidental nasceram no Médio Oriente». In Christian Jacq, Le Message des Constructeurs de Cathédrales, Éditions du Rocher, 1980, A Mensagens dos Construtores de Catedrais, Instituto Piaget, Romance e Memória, Lisboa, 1999, ISBN 972-771-129-4.

Cortesia  de IPiaget/JDACT