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O Tempo de Meu Pai
«(…) Visavam obter um efeito oposto ao que se pensava, e que
ele próprio confessava. No mesmo momento em que encarregou Germânico daquela inspecção geral do
Oriente, apressou-se a substituir o governador da Síria, que era parente de Germânico
por afinidade, por uma personagem arrogante, insolente, orgulhosa, casada com uma
mulher que, nesse campo, também nada lhe ficava a dever. Não seria tudo aquilo
calculado para se opor à acção de Germânico, estender-lhe armadilhas, ou pior ainda?
Naturalmente, eu ignorava tudo isso e devo dizer que Caio, com toda a sua
curiosidade e o seu talento inato para descobrir os segredos, não sabia mais do
que eu. A minha mãe estava preocupada e, quando o meu pai estava connosco, eu
reparava que se esforçava por afastar as preocupações que o ensombravam e por
se mostrar o mais alegre possível. Mas ele estava muitas vezes em viagem. Caio
sabia sempre o nome do país onde ele devia ir, mas esse nome não nos dizia
grande coisa, não mais a ele do que a mim. Foi assim que ouvi falar, pela
primeira vez, da ilha de Samotrácia, que não era muito longe de Lesbos, onde
nos encontrávamos. Pelo menos foi o que me disse Caio. Caio, que devia os
conhecimentos que tinha ao seu pedagogo, um Grego tão dado a palrear como a
esvaziar taças. Em grande segredo, Caio disse-me que havia em Samotrácia,
deuses cujo nome ninguém sabia ao certo, mas que tinham um grande poder. Eu
perguntei qual. O dos outros deuses, e algum mais. Mas o quê? São
capazes de andar não apenas sobre a terra, mas no céu e ir aos Infernos. Sabem
onde se encontram os tesouros e, se lhes orares como é devido, farão com que os
descubras. O que é um tesouro?, perguntei. Idiota, são pedras preciosas,
como as que a nossa mãe põe quando há um grande jantar; coisas que brilham, e
que são vermelhas, verdes ou límpidas como uma gota da água mais pura, mas que
ao mesmo tempo emitem raios de luz. Sabem também onde se encontra o ouro, para
fabricar colares e braceletes. Penso que o nosso pai foi vê-los para que lhe
digam tudo isso. Ele quer dar à nossa mãe o mais belo presente que houver. É a
razão por que ele partiu». In Pierre Grimal, Memórias de Agripina, Lyon
Edições, Romances Históricos, 2000, ISBN 972-8461-51-8.
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