sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

A Rainha Adúltera. Joana de Portugal. O Enigma da Excelente Senhora. Marsilio Cassotti. «Documentos posteriores mencionam outra ama de leite portuguesa da Rainha Católica, Maria Lopes, que receberia um pagamento “porque a dita Maria Lopes deu à Alteza o seu leite”»

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Lições de matrimónio imperial
«(…) Antes do final do mês de Março de 1451, chegou a Lisboa um procurador do conde de Benavente com o fim de propôr ao rei Afonso V, da parte do príncipe das Astúrias, uma aliança; muito provavelmente relacionada com o seu casamento com a infanta Joana, para que pudesse iniciar os trâmites do divórcio da sua primeira mulher, uma vez que faltava à rainha consorte de Castela menos de um mês para dar à luz. Inicialmente, o rei Afonso respondeu que entre ele e o primo não havia necessidade de assinar tais pactos dado o grande amor que os unia. No entanto, poucos dias depois registou a sua resposta num memorando em que explicava que uma nova aliança não lhe parecia necessária, mas que se o príncipe o considerava conveniente lhe transmitiria então a sua proposta. A provável pressa do príncipe das Astúrias em casar-se, ante a possibilidade de a sua madrasta dar à luz um varão, diminuiria de qualquer modo depois de se saber que, a 22 de Abril de 1451, eram vinte para as cinco da tarde, na vila de Madrigal, a rainha Isabel de Portugal deu à luz uma menina. Em Castela, as mulheres podiam herdar a coroa, na falta de varão, mas o facto de esse nascimento não ter sido considerado um risco para a sucessão de Enrique é evidente na ausência de toda a informação acerca do baptismo dessa infanta, a mulher que no futuro receberia de um papa o título de Rainha Católica.
No entanto, sabemos por documentos posteriores que, desde os primeiros meses, a infanta Isabel esteve rodeada por um gineceu de portuguesas, começando pela avó, Isabel de Barcelos, vinda de Portugal para assistir ao parto da filha. Assim como as já citadas Inês Alfonso Alvarnaiz (sic), mulher do alcaide de Arévalo, e a sua filha, Clara de Alvarnaiz, que algumas fontes consideram irmã de leite da rainha católica dona Isabel, uma vez que foi filha de uma das mulheres que criaram Isabel em Arévalo. Documentos posteriores mencionam outra ama de leite portuguesa da Rainha Católica, Maria Lopes, que receberia um pagamento porque a dita Maria Lopes deu à Alteza o seu leite.
Há notícias de que o parto da infanta Isabel afectou muito a sua mãe. Segundo Palencia; como a Fortuna jamais concede aos mortais um gozo sem o misturar com algum pesar, a jovem contraiu após o parto uma doença pouco habitual. Não faltavam suspeitas de que fosse um ardil de Álvaro, o qual via com desagrado o grande carinho do rei em relação à rainha e que não tinha a menor dúvida de que aquele parto contribuía para o aumentar. Portanto, supõe-se que o propósito de Álvaro era o de impedir que no futuro a rainha fosse capaz de amar, e que ficasse louca.
A verdade sobre a doença mental da mãe de Isabel, a Católica, nunca seria completamente esclarecida, em parte devido à discrição com a qual esta sempre lidava com as questões pessoais dos membros próximos da sua família, inclusivamente da própria rainha dona Joana. A crónica de Palencia defende que o mal mental de Isabel de Portugal começou devido à sua desilusão por ter trazido ao mundo uma menina, quando o seu marido necessitava de um varão. Mas talvez tenha simplesmente sido afectada no momento da concepção pelo seu pai, uma vez que se sabe que o infante João, duque de Beja, padecia de um grave caso de malária. Segundo o citado cronista, a rainha sofria de violentos arrebatamentos quando não havia causa de tristeza e, contra o que todos esperavam depois do parto felicíssimo, concebeu um desdém constante a toda a alegria, que só o trato suave do seu marido conseguia mitigar. É provável que o nascimento da primeira filha desta rainha consorte de Castela de origem portuguesa também não tivesse sido um acontecimento muito comentado nos palácios lisboetas próximos do castelo. Especialmente porque, na mesma altura, no de São Bartolomeu todos esperavam a chegada dos embaixadores alemães que compareceriam para concluir o matrimónio da infanta Leonor com Frederico III». In A Rainha Adúltera, Joana de Portugal e o Enigma da Excelente Senhora, Crónica de uma difamação anunciada, Marsilio Cassotti, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2012, ISBN 978-989-626-405-5.

Cortesia da EdosLivros/JDACT