quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Portugal e a Ásia Oriental. João de Deus Ramos. «… entre 1246 e 1248, esteve envolvido como Legado no Oriente na contenda político-religiosa entre Roma e Bizâncio, função que desempenhou com o agrado e confiança de Inocêncio IV»


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«Uma semana depois, a 13 de Março, pela bula Cum non Solum seria designado Giovani da Pian di Carpine, que, como é bem sabido, seguiu viagem e cumpriu a sua missão. Nesta primeira fase de aproximação aos mongóis, Inocêncio IV escolheu Franciscanos e Dominicanos. Foi também a fase da Ásia Central.

NOTA: Entra na História, por assim dizer, a partir de 1245. Sobre os primeiros anos da sua vida há a indicação no Árbol Chronologico, de J. de Castro, tão só de que fôra Ministro Provincial da Província Franciscana de Santiago de Compostela. A sua figura surge nítida a partir da Bula Dei Patris Immensa de 1245 pela qual é designado Embaixador aos Tártaros, e a partir desse ano ou do seguinte, é Penitenciário Apostólico em S. João de Latrão. Em seguida, entre 1246 e 1248, esteve envolvido como Legado no Oriente na contenda político-religiosa entre Roma e Bizâncio, função que desempenhou com o agrado e confiança de Inocêncio IV. Terá regressado à Santa Sé em 1248 ou, 1249 para fazer o relato pessoal da sua missão no Oriente. O papa incumbiu-o depois de uma missão junto do Senado e do povo romano. Em 1256 pregava a cruzada em Espanha e finalmente em 1266 foi nomeado bispo residente em Ceuta. Para esta resenha biográfica servi-me das Bulas Pontifícias respeitantes a frei Lourenço, de que encontrei onze, todas do pontificado do Inocêncio IV e com datas que vão de 1245 a 1252.

Mais tarde, com a consolidação do poder mongol no Cataio, a grande figura franciscana que foi João de Montecorvino, primeiro bispo de Pequim, então Khambalik, simbolizaria a transferência de ênfase das missões políticas para as missionárias.

NOTA: O nome dinástico Yuan foi adoptado por Kubilai Khan em 1271 e foi Imperador da China em 1280. Os autores não concordam quanto à data de início da dinastia, mas sim quanto ao seu termo, em 1368.

Foi a Pax Mongolica, alargada ao Cataio, apoiada num papa esclarecido e com visão, numa ordem de religiosos dispostos à dádiva total, que permitiu esse notável florescimento do cristianismo na China de finais do século XIII até à segunda metade do seguinte. Lourenço de Portugal aparece como figura de destaque neste quadro em que o Mundo mudava, nas ideias e nos conceitos de estratégia global. A circunstância de não ter partido para a missão à Ásia Central a que o papa o destinara retirou-lhe a luz da ribalta que de outro modo certamente teria tido.
Pela mesma razão, os orientalistas passaram-lhe ao lado. Mas sem dúvida merecia uma biografia que lançasse luz sobre a sua participação destacada nos acontecimentos mais importantes dos tempos em que viveu. Como escreve Pisanu,
  • (...) I'imporranza e il numero delle missioni affìdategli sono suffìcienti a considerarlo tra gli elementi piú in vista fra i confratelli del suo tempo e nessuno forse tra i Francescani ebbe maggiori poteri di lui, sicché e facile capire la stima che poteva godere fra i membri della Curia Papale.
Em época de vultos de tão grande dimensão, frei Lourenço de Portugal terá sido um dos maiores.

Resumo
Pode considerar-se a Bula Dei Panis Immensa, de 1245, enviando frei Lourenço de Portugal aos Tártaros, como o impulso inicial que marcou o começo do século, Franciscano na Ásia; e a queda da dinastia Yuan, em 1368, como o seu termo. Neste período de 123 anos há essencialmente duas linhas de força: uma primeira, político-religiosa, que decorre ao longo de umas duas décadas e geograficamente se confina à Ásia Central Mongol. E uma segunda, marcadamente missionária, que surge a partir da dominação da China pelos Mongóis e da instauração da dinastia Yuan com Kubilai Khan, em c. 1277, e que permite a criação, pela primeira vez, da Sé Metropolitana em Khanbalik, e Sufragana em Zaiton.

No primeiro ciclo, as figuras determinantes e de maior relevo foram o papa Inocêncio IV, São Luís, Rei de França, Lourenço de Portugal, Carpine e Rubruck; no segundo, destacou-se a figura excepcional de Montecorvino, primeiro arcebispo de Pequim. Aos franciscanos se ficou a dever a heroicidade espiritual e física que tornou esse longínquo século um exemplo até aos dias de hoje. O termo abrupto desse esforço na China deveu-se sem dúvida à queda dos Yuan e ao desaparecimento do espírito de tolerância que os caracterizou. Mas também à circunstância de não terem os franciscanos conseguido inserir-se na população chinesa, criando nela raízes.
A queda dos senhores Mongóis arrastou consigo o desaparecimento total, durante mais de dois séculos, do cristianismo na China. Desse esforço apenas ficou a memória e a admiração». In João de Deus Ramos, Portugal e a Ásia Oriental, Fundação do Oriente, 2012, ISBN 978-972-785-102-7, Comunicação apresentada no 3º Seminário sobre o Franciscanismo em Portugal, Abril de 1995, ISBN 978-972-785-202-7.

Cortesia da F. Oriente/JDACT