terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Raiz de Orvalho. Mia Couto. «A actividade de comprar conclui em decidir-se por um objecto; mas é também antes uma eleição. E a eleição começa por perceber as possibilidades que oferece ao eleitor/mercado. De onde resulta que a vida, no seu modo “comprar”, consiste primeiramente em viver as possibilidades de “ganhar” como tais»



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Desencontro
Não ter morada,
habitar
como um beijo
entre os lábios,
fingir-se ausente
e suspirar
(o meu corpo
não se reconhece na espera)
percorrer com um só gesto
o teu corpo
e beber toda a ternura
para refazer
o rosto em que desapareces
o abraço em que desobedeces.
Outubro 1979

Desencontro
No avesso das palavras
na contrária face
da minha solidão
eu te amei
e acariciei
o teu imperceptível crescer
como carne da lua
nos nocturnos lábios entreabertos.

E amei-te sem saberes,
amei-te sem o saber,
amando de te procurar,
amando de te inventar.

No contorno do fogo
desenhei o teu rosto
e para te reconhecer
mudei de corpo,
troquei de noites,
juntei crepúsculo e alvorada.

Para me acostumar
à tua intermitente ausência,
ensinei às timbilas
a espera do silêncio
Julho 1981

Poemas de Mia Couto, in ‘Raiz de Orvalho e Outros Poemas
 
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