«Este artigo aborda o
livro Nadja, de André Breton,
um ícone do surrealismo, onde a personagem que lhe deu o título é interpretada
como sendo a personificação da anima do seu autor. A anima, segundo a
psicologia analítica, é o arquétipo do feminino no inconsciente do homem, e
está relacionada aos aspectos irracionais e instintivos da psique, como a
intuição e a emoção, sendo também a via de acesso para a sua interioridade. O
encontro com ela permite o contacto com o inconsciente, algo de fundamental
importância para o surrealismo, que o concebeu com um campo de inspiração a ser
descoberto e explorado de forma profunda e irrestrita, como aconteceu em Nadja, personagem que encarnou não
só o espírito do movimento surrealista, mas também a anima de André Breton. Nadja, livro de André Breton publicado em 1928, é considerado uma
das principais obras do surrealismo, movimento de vanguarda que visava, através
da exploração do inconsciente, dissolver as barreiras entre arte e vida,
e assim promover a emancipação e liberdade do homem.
Considerado como um
autêntico meio de conhecimento, o surrealismo foi um modo de pensar e viver
voltado aos continentes até então inexplorados, como o sonho, a loucura, e tudo
aquilo que fosse contrário ao cenário lógico. O livro, que atende às principais
reivindicações do movimento, apresenta alguns recursos antiliterários inovadores, como o uso de ilustrações e fotografias,
uma forma de privilegiar a subjectividade do olhar em detrimento da descrição
meramente narrativa dos factos. As fotos, em sua maioria retratos de pessoas e
lugares, conferem veracidade à história, conciliando assim fantasia e
realidade, pois uma das propostas do surrealismo
era justamente acabar com tais dicotomias, eliminando, por exemplo, as
fronteiras entre realidade interior e exterior. Nesse sentido, Breton, em 2001,
dizia acreditar na possibilidade de reunir estados aparentemente
contraditórios, como sonho e realidade, em uma espécie de realidade absoluta,
ou supra-realidade, que se manifestaria
através do insólito e do maravilhoso.
Outra característica a
ser destaca no livro foi a técnica chamada pelo autor de observação
neuropsiquiátrica, onde tudo o que acontecia deveria ser detalhadamente relatado,
sem preocupações com o estilo. Isso mostra que a sua escrita foi também uma
experiência surrealista, ou seja, não se trata de um livro sobre o surrealismo,
mas de um livro verdadeiramente surreal. Nele o autor relata seu breve
romance com uma mulher misteriosa, chamada Nadja,
que ele conheceu por acaso, caminhando pelas ruas de Paris. Esse ser errante e misterioso,
dotado do mais elevado grau de liberdade, representa o espírito do surrealismo,
cujo movimento ganhou forma nesta que é uma das mais inquietantes e enigmáticas
personagens da literatura. Embora Nadja
se apresente como a encarnação dos ideais surrealistas, principalmente em seus
anseios de amor poesia e liberdade, ela também pode ser vista como a
personificação da anima de André Breton.
A anima representa as
tendências psicológicas femininas no homem. Está relacionada aos seus
sentimentos e sensibilidade, conectando-o ao irracional, instintivo e
intuitivo, tendo, portanto, a função de relação e conexão com o inconsciente. É
através dela que o homem entra em contacto com sua interioridade, penetrando
nos liames mais profundos da psique. O eros, considerado um princípio de
ligação de natureza afectiva, é também um atributo da anima, que além de ligar
o indivíduo ao mundo interior, tem a função de conectá-lo com as demais
pessoas, formando laços afectivos de amor, amizade e fraternidade. Enquanto
elemento feminino ela está relacionada à terra e à natureza, ao corpo e à
matéria. Pode se manifestar de forma encantadora, como a deusa Afrodite, ou terrificante,
como Lilith, a lua negra. Santa e meretriz, amável e perigosa, são termos
comumente atribuídos à anima, que em suas mil faces é tanto a soror
mystica dos alquimistas, quanto a bela dos contos de fadas. Incontáveis
são os seus atributos, porém, assim como a alma, ela não pode ser definida,
pois não se prende a nenhum conceito. O único meio de sabê-la, é vivê-la, estar
em contacto e relacionar-se com ela, sentindo-a em todo seu encanto e
fascinação.
Antes de descrever o seu
encontro propriamente dito com Nadja,
e os acontecimentos subsequentes, o autor adverte-nos de que irá narrar
episódios marcantes de sua vida, factos sobre os quais não teve controlo algum,
sentindo-se diante dos mesmos como uma testemunha
assustada, à mercê daquilo que ele chamou de mundo proibido das aproximações repentinas e petrificantes coincidências». In Fabio
Massao Yabushita, Brasil, Wikipédia, 2012.
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