domingo, 5 de janeiro de 2014

Infante Afonso Sanches. Senhor de Portalegre. «É em 1271, quando atinge os oito anos de idade, que o jovem Afonso recebe de seu pai um importante senhorio fronteiriço situado na região de Portalegre e que, para além desta vila, incluía ainda as praças-fortes de Arronches e de Marvão…»

Cortesia de wikipedia

A Herança d’O Bolonhês
«Afonso III, o quinto rei de Portugal, foi pai de uma numerosa prole. Dos filhos ilegítimos, cujas datas de nascimento se desconhecem, as fontes atestam os nomes de Afonso Dinis, Gil Afonso, Leonor, Martim Afonso Chichorro, Rodrigo e Urraca, enquanto dos legítimos, resultantes do casamento com D. Beatriz de Castela, são conhecidos os nomes de Branca (1259), Dinis (1261), Afonso (1263), Sancha (1264), Maria (1264-1265), Vicente (1268) e Fernando (a. 1269);ou seja, um total de 13 filhas e filhos. Contudo, de entre todos eles e para além do seu sucessor no trono, nenhum outro alcançou tanto poder, projecção e notoriedade, ainda que nem sempre pelos melhores motivos, como o célebre Infante Afonso, senhor das praças-fortes de Castelo de Vide, Arronches, Marvão e Portalegre. O terceiro filho d'O Bolonhês e de D. Beatriz terá nascido a 6 de Fevereiro de 1263, começando a ser referido na documentação régia logo no mês seguinte. Porém, ao contrário do que seria de esperar e daquilo que era habitual, o infante não terá sido criado por um nobre ligado ao monarca, mas sim por um clérigo do rei, Martim Peres. Claro que isso não invalida que a sua preparação não tenha também privilegiado uma importante componente guerreira, no âmbito da qual terá aprendido a montar e a manusear a espada e a lança, pois era isso que se esperava de um nobre, de um futuro comandante de tropas e, acima de tudo, de um infante filho de rei que, em última análise, poderia mesmo vir a ascender ao trono.
É em 1271, quando atinge os oito anos de idade, que o jovem Afonso recebe de seu pai um importante senhorio fronteiriço situado na região de Portalegre e que, para além desta vila, incluía ainda as praças-fortes de Arronches e de Marvão, a que se acrescentou dois anos depois, alegadamente a pedido do próprio infante, a localidade de Castelo de Vide e, talvez, o castelo e vila de Alegrete. E à boa maneira dos apanágios franceses, que Afonso III bem conhecia e em cujo modelo certamente se inspirou, como sugere Bernardo Sá Nogueira, este vasto senhorio poderia ser legado pelo detentor ao seu filho primogénito e legítimo ou, na ausência de um varão, à mais velha das suas filhas legítimas. Contudo, se porventura nenhum destes requisitos fosse cumprido, ou seja, caso não existisse qualquer descendência legítima, todo esse património deveria regressar à posse da Coroa.


Apesar de não conhecermos os motivos que levaram Afonso III a abrir mão de uma tão vasta parcela de território, é muito possível que pretendesse com isso, eventualmente por pressão da rainha D. Beatriz, - assegurar alguma autonomia financeira ao infante, de modo a que este, futuramente, não ficasse exclusivamente dependente da generosidade do irmão primogénito, Dinis e, ao mesmo tempo, porque isso lhe poderia vir a abrir as portas para um bom casamento político, aliás como foi sublinhado por Leontina Ventura. E não deixa também de ser possível que todas essas questões tenham surgido de forma mais acutilante precisamente nesse ano de 1271, altura em que o monarca parece ter sido acometido por uma grave doença ao ponto de decidir também lavrar o seu testamento. Para além de pretender, legitimamente, assegurar o futuro do seu filho e seus descendentes, é admissível que nos objectivos d'O Bolonhês estivesse também uma clara preocupação com a dinamização, o povoamento e a organização militar e defensiva dessa região, algo que adquiria uma importância estratégica acrescida, porquanto se tratava de territórios, por um lado, cuja conquista e domínio, levada a cabo no reinado de Sancho II, era ainda, para todos os efeitos, relativamente recente e, por outro, porque confinavam com a raia castelhano-leonesa.
Mas por o infante não ter ainda idade suficiente para assumir, de facto, a posse do seu senhorio, aquelas praças-fortes foram entregues a Rui Garcia Pavia, atestado como alcaide de Lisboa em 1270 e conselheiro régio entre 1263 e 1274, cargos que revelam tratar-se de um homem da inteira confiança de Afonso III, o que explica inteiramente a escolha do monarca. Rui Garcia ter-se-á mantido ao comando dessas fortalezas, supomos, pelo menos até à sua morte, em 1276, altura em que o infante passou então a assumir, de facto, o controlo de todo o seu senhorio, já que estaria prestes a atingir a idade de róbora, ou seja, os 14 anos de idade. O já de si vasto senhorio de Afonso seria ainda ampliado pouco tempo depois, em Janeiro de 1278, com a doação da vila e do castelo da Lourinhã e, em Julho desse ano, da povoação vizinha de Vila Pouca, junto de Torres Vedras, a que se acrescentaria ainda a localidade de São Vicente da Beira, em altura que não é possível descortinar, o que convertia o infante no mais poderoso senhor laico do reino». In Miguel Gomes Martins, Guerreiros Medievais Portugueses, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2013, ISBN 978-989-626-486-4.

Cortesia Esfera dos Livros/JDACT