Cortesia
de wikipedia e jdact
«(…) Por algum motivo, nunca
notei como era sistemática a nossa movimentação pela cidade e como minha mãe
parecia decidida a mapear as nossas rotas com antecedência e se ligar a elas,
mesmo quando o clima era desencorajador..., só no dia em que ela me segurou
pelo braço e, com a mesma voz de um cavaleiro cruzado que finalmente se depara
com o santo graal, exclamou: olhe ele ali!
E, de facto, ali estava ele, saindo da livraria Blackwell’s da Broad Street, equilibrando
uma pilha de livros e uma xícara de café. Se não fosse pela minha mãe, eu
jamais o teria reconhecido, mas não havia passado a última década acompanhando
o crescimento de nosso alvo com o auxílio de um binóculo e de revistas cor de
rosa. Para mim, James Moselane continuava sendo um príncipe adolescente numa
floresta encantada, mas a pessoa que tinha saído da livraria era um adulto de
proporções perfeitas, alto, atlético, porém inteiramente despreparado para a
cilada que o aguardava.
Que
coincidência!, falara minha mãe, que atravessara a Broad Street a passos largos
e o interceptara antes mesmo que ele a visse. Nem sabia que estudava em Oxford!
Não deve ter reconhecido Diana... Só então minha mãe reparara que eu não estava
do seu lado. Ela virou-se para mim com uma careta que já dizia tudo. Eu nunca
tinha sido uma pessoa covarde, mas o terror que senti ao entender de repente
que era aquilo, exactamente aquilo,
que tínhamos passado tanto tempo perseguindo quase me fez virar as costas e
sair correndo. Embora James não pudesse ver a expressão lívida de minha mãe,
com certeza percebera o seu aceno frenético e a minha consternação. Somente
alguém de raciocínio muito lento não teria interpretado aquela situação num
piscar de olhos, mas, verdade seja dita, James cumprimentara nós duas com uma cordialidade
perfeita.
Está gostando de Oxford?, perguntara,
ainda equilibrando o café em cima dos livros. Desculpe, como é mesmo o seu
nome? Diana Morgan, respondera a minha mãe. Igual à princesa Diana. Deixe-me anotar.
Ignorando meus cutucões e súplicas sussurradas, ela remexera dentro da bolsa e
tirara um pedaço de papel. E a faculdade em que ela estuda... Mãe! Foi preciso
toda a minha força de vontade para impedi-la de escrever também meu telefone, e
ela ficara muito zangada comigo por puxá-la para longe antes de ter exaurido
sua bajulação descarada. James não aparecera mais depois disso, o que não foi
nenhuma surpresa. Eu provavelmente nunca mais o encontraria não fosse por
Katherine Kent. No ano seguinte, pouco antes do Natal, ela me convidara para
uma recepção no museu Ashmolean, e acabei descobrindo que o evento era em
homenagem à recente doação de artefactos antigos da Colecção Moselane.
Venha
cá!, dissera ela, puxando-me de perto de uma linda estátua da deusa egípcia Ísis
e abrindo caminho pela multidão de gente importante. Quero apresentar você. Os
Moselanes são muito úteis. Katherine era uma mulher de pouca paciência e havia
aperfeiçoado a arte de se intrometer em conversas e roubar a presa que lhe
interessasse. James! Esta é Diana. Talentosíssima. Ela quer saber quem limpou a
sua Ísis. Depois de quase engasgar com o champanhe, James se virara para nós, tão
lindo de fato e gravata que as minhas fantasias de menina voltaram a galope num
segundo». In Anne Fortier, A Irmandade Perdida, 2014, Editora Arqueiro, 2015, ISBN
978-858-041-543-0.
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