«Muito se discute ainda sobre o real papel de Fernando Pérez de Trava,
não havendo margem para grandes conclusões. Pode muito bem tratar-se de um
entendimento táctico, à luz das ambições leonesas e galegas de D. Teresa... De qualquer modo, o erro
da Infanta--Rainha tem menos a ver com as suas evidentes ambições políticas na
Galiza, e tem mais a ver com o facto de não
ter sabido ganhar o consenso dos
barões para que a apoiassem num a acção de tão grande alcance estratégico.
E, a partir daqui, os mal-entendidos tornam-se inexoráveis e compreensíveis,
ainda que se projectem no agravamento dos conflitos e na ruptura entre a
vontade autonomista dos barões portucalenses e as ambições pessoais e políticas
de D. Teresa. O conde Fernando Pérez
aparece, assim como o homem forte de que a Rainha precisa para afirmar a
sua autoridade e para poder levar por diante os seus objectivos... Quanto ao
mais, são especulativas as ilações amorosas a propósito do início das relações entre
ambos. Mas, para os barões, que ganhavam influência crescente junto do jovem Afonso Henriques, o que importava era o
peso cada vez maior da nobreza, galega nos negócios de Estado do condado, que já ambicionava transformar-se em reino. A
verdade, porém, é que, com o andar dos tempos, a proximidade de Teresa com o
conde Fernando acentuou-se, independentemente das considerações muito negativas
sobre o pretenso adultério, definidas na História Compostelana, cuja posição
é desfavorável à Infanta-Rainha e de apoio a Gelmírez. No entanto, D. Teresa comete alguns erros, como o
de mandar encarcerar o arcebispo de Braga, Paio Mendes, quando este regressa
à arquidiocese, vindo de Zamora (1122).
É à luz destes factos que temos de considerar a importância da batalha
de S. Mamede (1128), onde os barões
portucalenses decidem pôr termo a um equívoco, o da fragilidade da autonomia
aliada à instabilidade existente na Galiza. A vitória marca a chegada de Afonso Henriques à ribalta política,
evidenciando-se como um estratego fino e inteligente. E aqui entra o cenário
lendário, que atribui, talvez abusivamente, ao jovem Rei a ingratidão filial,
falando-se mesmo do requinte da violência. A verdade é que possuímos documentos
que apontam para que D. Teresa não
tenha sido vítima de perseguição e castigo, finando-se em 1 de Novembro de 1130, segundo o livro de óbitos de
Santa Cruz de Coimbra, tendo ainda Afonso
Henriques reatado relações pessoais com Fernando Pérez de Trava...
Em suma, nas páginas que se seguem, encontramos uma biografia que nos
permite encontrar a personalidade forte, multifacetada e contraditória da
Infanta-Rainha D. Teresa, cuja
vontade e determinação contribuíram também a seu modo para a independência de Portugal,
muito mais do que pode parecer à primeira vista. Eis por que razão a leitura se
revela útil e necessária». In Guilherme
Oliveira Martins, In Marsilio Cassotti, D. Teresa, A Primeira
Rainha de Portugal, Prefácio de G. Oliveira Martins, Attilio Locatelli, A
Esfera dos Livros, 2008, ISBN 978-989-626-119-1.
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