Alquimia e Magia e Hermetismo
«(…) Penso, de facto, euo a dimensão mágica em Pessoa
assenta, mais estruturadamente, em reflexões baseadas no esquema iniciático da Golden Dawn, em nossa opinião, na
versão ocrowleyana do A. A., Argenteum
Astrum e atinge a sua máxima dimensão nesse Livro que não o é, O
Caminho da S. (Serpente), (Yvette Centeno, Fernando Pessoa e a Filosofia
Hermética). Durante a sua vinda a Portugal, em Setembro de 1930, Crowley e a sua companheira
chegaram a Portugal a 2 desse mês, para além de dois almoços a 7 e a 8, com a Besta
666 e a sua Mulher Escarlate, Pessoa teria tido, segundo as suas
declarações à Polícia, encontros mais frequentes com Crowley a partir de l7 de
Setembro, data em que Hanni Jaeger terá fugido para a Alemanha. Sobretudo, participou,
juntamente com o seu companheiro iniciático Ferreira Gomes, que aliás tem
palavras muito elogiosas para Crowley na notícia que sai em 5 de Outubro do mesmo
ano [é um erudito e um gentlemen,
poeta, místico, caçador de feras, prático de rituais mágicos, químico e jogador
de xadrez; alpinista..., coisas que não são bem características de um
degenerado. (...) viveu como yogi numa aldeia da Índia, como castelão na
Escócia, como boémio em Londres, Paris e Nova York..., fundou em (...) Itália, Cefalu,
Sicília, uma fraternidade mística], embora também tenha palavras de
reserva, ao que tudo indica para com Crowley [é fora de dúvida que Cagliostro era um charlatão; mas não é menos fora
de dúvida que era também, e paralelamente, um alto iniciado; é fora de dúvida
que madame Blavatsky era um espírito confuso e fraudoso; mas também é fora de
dúvida que recebera uma mensagem e uma missão de superiores incógnitos;
nos nossos dias há um exemplo estrondoso da mesma mistura], na simulação do
suicídio de Crowley em relação ao qual é interessante referir, para além dos
detalhes da história já bem conhecida, o que Crowley escreveu no seu diário: Sept 21. I decide to do a
suicide stunt to annoy Hanni. Arrange details with Pessoa (21 de
Setembro. Decidi fazer um suicídio acrobático para aborrecer a Hanni. Arranjar detalhes
com Pessoa). E o seu biógrafo John Symonds comenta, a propósito: Fernando Pessoa did his part of the job well
(Fernando Pessoa fez bem a sua parte do trabalho). Tratou-se, na verdade
de uma cumplicidade solidária que se expressa no triângulo Crowley-Pessoa-Gomes.
É importante referir que Pessoa tinha na sua biblioteca três
livros de Crowley, não só o The
Confessions of Aleister Crowley (As Confissões de Aleister Crowley),
como quase todos os pessoanos indicam e que já por si só revelaria um interesse
pela vida e pela obra do mago Crowley, mas também outros dois, que ninguém pôs
em evidência, os quais vêm, no entanto, mencionados na mesma lista de livros
pertencentes à biblioteca pessoal de Fernando Pessoa e que são: Magick in theory and practice, being part
III of Book 4 (Magia em Teoria e em Prática, sendo a parte III do
Livro 4), de Master Therion, um pseudónimo iniciático de A. Crowley, numa
edição de Paris (Lecram) que só pode ter sido ou a de 1929 ou a de 1930,
referido com a cota 1-151 e incluído na rubrica Filosofia; 777, Vel
Prolegomena symbolica ad systemam sceptico-mysticae viae explicandae, fundamentum
hieroglyphicum sanctissimorum scientiae summae, London: The Walter
Scoff Publishing Co., 1910, referido com a cota 2-1 e incluído na rubrica Religião, Teologia.
Trata-se de dois livros importantes da doutrina e da prática
telemita de Crowley, revelando um
interesse ainda mais profundo, da parte de Pessoa, quanto mais não fosse
para se informar mais detalhadamente sobre o tema em questão, pois o primeiro
aborda os aspectos práticos da Magia do novo
aeon, incluindo a sexual, vermelha,
no seu capítulo XX, On the Eucharist,
on the Art of Alchemy (Sobre o Eucaristia, sobre o Arte da Alquimia),
e o segundo é uma exposição da doutrina cabalística de Crowley, adaptada a partir
da que ele aprendeu na Golden Dawn, e onde estão referidas, sob a forma de um dicionário mágico e filosófico as
diversas correspondências simbólicas (entre as quais as sefiróticas) e iniciáticas
dos graus desta organização rosacruciana, que Crowley transpôs para a sua
Ordem, criada em 1907, a A:.A:
(Argenteum Astrum, Estrela de Prata,
em inglês, Silver Star, S.S).
Até que ponto Pessoa aderiu a estas doutrinas e a
estas práticas do mago Therion é a pergunta que se impõe fazer. Que havia
interesse, não há dúvida, primeiro porque adquiriu três livros de Crowley (um
dos quais, pelo menos, antes de o conhecer, o Confessions), em segundo lugar porque resolveu corrigir o
seu horóscopo dando-lhe conta do facto (através da Mandrake Press,
editora de Confessions) e
depois porque começou a corresponder-se com ele, they had been corresponding for a year (eles corresponderam-se
durante um ano, escreve J. Symonds), a partir do momento em que Crowley lhe
respondeu a agradecer-lhe». In José Manuel Anes, Fernando Pessoa e os Mundos
Esotéricos, Ésquilo 2008, ISBN 978-989-8092-27-4.
Cortesia de Ésquilo/JDACT